quinta-feira, 3 de agosto de 2023

O Caminho da Beleza 37 - Transfiguração do Senhor

Peguei da mão do anjo o livrinho e comi-o. Na boca era doce como mel, mas, quando o engoli, meu estômago tornou-se amargo (Ap 10, 10).

Transfiguração do Senhor                          

Dn 7, 9-10.13-14                2 Pd 1, 16-19                     Mt 17, 1-9

 

ESCUTAR

“Seu poder é um poder eterno que não lhe será tirado, e seu reino, um reino que não se dissolverá" (Dn 7, 14).

“Este é o meu Filho bem-amado, no qual ponho o meu bem querer" (2 Pd 1, 17).

“Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz” (Mt 17, 1-2).

 

MEDITAR

Todos nós seríamos transformados se tivéssemos a coragem de ser o que somos”.

(Marguerite Yourcenar)


ORAR

    A Transfiguração, que se celebra no dia 6 de agosto, nos coloca diante de um paradoxo perturbador. Exatamente nessa data, há 78 anos, a bomba atômica de Hiroshima fez sua trágica aparição no horizonte da humanidade, como uma luz de morte e de devastação. Nessa época, também, o calendário judaico faz a memória da Shoah (a tragédia do assassinato de mais de 6 milhões de judeus na segunda grande guerra). Desse modo, a luz da vida da Transfiguração, que provém de Deus e anuncia o futuro do mundo em Cristo, contrasta com a luz da morte produzida pelo homem, que ameaça o presente do mundo, comprometendo seu futuro. A Transfiguração lembra a beleza para a qual a humanidade e o universo inteiro estão destinados; Hiroshima e a Shoah testemunham o embrutecimento de que o homem é capaz. A Transfiguração evoca, concentrando-se sobre o Cristo, a glória à qual estão destinados o corpo humano e o próprio cosmos; Hiroshima e a Shoah revelam a capacidade do homem de desfigurar a carne humana, de deteriorar o corpo e o espírito, de devastar o cosmos. Para um cristão, celebrar a Transfiguração representa assim um apelo à responsabilidade e uma exortação à compaixão, à dilatação do coração em consideração ao homem que sofre. Não é um acaso se, para os evangelhos, o Cristo que conhece a transfiguração é aquele que vem anunciar pela primeira vez o destino da paixão e morte que o espera, a desfiguração que sofrerá por parte dos homens (ver Mt 16, 21-23): face ao mal, Jesus escolheu ser vítima de preferência a ser um rei todo poderoso. A Transfiguração torna-se desse modo o “sim” de Deus ao Filho que aceita a via da solidariedade radical com os oprimidos e as vítimas da história. O Cristo é aquele que reúne em seu corpo de homem e em sua carne de judeu as dores da humanidade inteira. Diante das tragédias do assassinato da Cruz, da Shoah e de Hiroshima (e, hoje, da destruição e morte nas guerras da Síria e Ucrânia), a Transfiguração torna-se esperança universal, para todos aqueles que sofrem e mesmo para a criação inteira que geme pela espera da redenção. A luz do Ressuscitado brota do mais fundo do sofrimento, de um amor vivido até o fim. Ao extremo da morte corresponde o extremo do amor. Também em nossa obscuridade, habita esta luz interior e trinitária com a qual transfiguraremos em vida toda a força de devastação e morte: a misericórdia do Pai, a entrega amorosa do Filho e a liberdade do Espírito.

(Manos da Terna Solidão/ Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)


CONTEMPLAR

Jesus transfigurado, 1967, Salvador Dalí (1904-1989), litografia colorida em papel, Coleção Bíblia Sacra, Espanha.





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