segunda-feira, 27 de outubro de 2014

O Caminho da Beleza 50 - Celebração de Finados

O Caminho da Beleza 50
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



Celebração de Finados                        02.11.2014
Jó 19, 1.23-27                    Rm 5, 5-11              Jo 6, 37-40


ESCUTAR

“Eu sei que o meu redentor está vivo e que, por último, se levantará sobre o pó, e depois que tiverem destruído esta minha pele, na minha carne verei a Deus” (Jó 19, 25-26).

“A esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5).

“E esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum daqueles que ele me deu, mas os ressuscite no último dia” (Jo 6, 39).


MEDITAR

“As pessoas não morrem: tornam a ficar encantadas”(João Guimarães Rosa).

“Eu sempre acreditei que o instante da morte é a norma e o fim da vida. Eu penso que para os que vivem como se faz necessário este é o instante em que, por uma fração infinitesimal de tempo, a verdade nua e crua, pura, certa e eterna entra na alma” (Simone Weil).


ORAR

A morte fica sempre como uma obscura passagem, uma luta, uma agonia e um mistério. A morte não é o estuário trágico, mas o ingresso na comunhão plena com Deus já experimentada no fragmento da existência terrestre, neste instante emprestado a que chamamos vida. Novembro é tempo de primavera para nós, do grão caído na terra que é fecundo, floresce e renasce. Os celtas elegeram este período do ano para celebrar a memória dos mortos, uma memória que as igrejas cristianizaram para torná-la uma das festas mais vividas ainda que a cultura dominante reprima a morte e a finitude. A morte não é mais a realidade última para os homens e sim a Ressurreição para a Vida Eterna. O cristão prepara a sua ancestralidade a cada dia ainda que sua vida sofra as contradições das quedas. Jesus nunca rejeita ninguém, ao contrário, abraça-nos com seu grande amor e nos concede a remissão dos pecados, a ressurreição da carne, conduzindo-nos, definitivamente, à vida eterna. Paulo nos garante: “Se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus da morte habita em vós, aquele que ressuscitou Jesus Cristo da morte dará vida a vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que habita em vós” (Rm 8, 11). A comunhão com Cristo na fé e na eucaristia nos resgata da morte, do nada e nos insere na existência de Deus: “Quem comer minha carne e beber o meu sangue terá a vida eterna e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6, 54). É preciso purificar a morte cristã de toda “pornografia mortuária” (Karl Rahner) que procura, com uma retórica consumista e mágica, cancelar e apagar esta dramática realidade humana. Dignidade, doação, sinceridade e realismo são virtudes humanas, mas o cristão deve também conhecer a confiança, a esperança e a alegria pascal. A oração pelos mortos é um ato de autêntica intercessão, de amor e de caridade pelos que vivem em Deus. É um ato de solidariedade que nunca pode ser interrompido, mas deve ser vivido como uma communio sanctorum, uma comunhão dos santos que foram perdoados por Deus.


CONTEMPLAR

Ressurreição, 1973, Jean-Marie Pirot (Arcabas) (1926-), técnica mista, acetato de polivinil, areia de silício, pigmentos, ouro fino não queimado, 22 ql., Igreja de Saint-Hugues-de-Chartreuse, Isère, França.






segunda-feira, 20 de outubro de 2014

O Caminho da Beleza 49 - XXX Domingo do Tempo Comum


O Caminho da Beleza 49
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).


XXX Domingo do Tempo Comum              26.10.2014
Ex 22, 20-26                      1 Ts 1, 5-10                         Mt 22, 34-40


ESCUTAR

“Não oprimas nem maltrates o estrangeiro, pois vós fostes estrangeiros na terra do Egito” (Ex 22, 20).

“E vós vos tornastes imitadores nossos e do Senhor, acolhendo a Palavra com a alegria do Espírito Santo, apesar de tantas tribulações” (1 Ts 1, 6).

“Mestre, qual é o maior mandamento da lei?” (Mt 22, 36).


MEDITAR

“Quando o mundo, ao contemplar a Igreja de Cristo, exclamar como nos primórdios da cristandade: ‘Vejam o quanto se amam!’, os cristãos olharão única e fixamente para aquele ao qual pertencem e, desconhecedores do bem que fazem, pedirão perdão por seus pecados” (Dietrich Bonhoeffer).

“A coisa mais importante do mundo é a possibilidade de ser-com-o-outro, na calma, cálida e intensa mutualidade do amor. O Outro é o que importa, antes e acima de tudo. Por mediação dele, na medida em que recebo sua graça, conquisto para mim a graça de existir. É esta a fonte da verdadeira generosidade e do autêntico entusiasmo – Deus comigo. O amor ao Outro me leva à intuição do todo e me compele à luta pela justiça e pela transformação do mundo” (Hélio Pellegrino).


ORAR

Jesus tinha um método estranho para fazer as operações: quando tinha que multiplicar, dividia (como fez com os pães); para obter maior resultado propunha o abandonar, cortar, perder. O judaísmo tinha 613 preceitos dos quais 365 começavam com “não” e 248 com um imperativo “deves”. Jesus não se perde neste emaranhado selvagem de prescrições e casuísmos. Ao ser provocado pelo doutor da Lei, resume tudo em dois mandamentos que têm um só fundamento: o Amor. Temos um certo descaso pelo que é essencial até porque preferimos a complexidade, as complicações e a quantidade de preceitos, pois nos ajudam a nos evadir do necessário. Temos medo deste recorte feito por Jesus que nos permite descobrir dois rostos: o do irmão e o do Pai. Jesus está impaciente porque deseja que sejamos capazes de ver alguma coisa e descobrir alguém. Jesus revela que todas as práticas, observâncias e tributos religiosos sem o mandamento principal do amor estão privados de sentido e valor. O mandamento do amor é o primeiro, não porque está no topo da lista, mas porque está no centro, no coração, pois é no coração que todos devem se referenciar e se medir. O amor é a medida da fé. Temos a pretensão de separar o amor de Deus do amor ao próximo. Reduzimos o nosso agir à frequência dos sacramentos e esquecemos de que ele deve ser calcado na luta pela justiça e contra a discriminação e a intolerância de todos os tipos. Jesus arranca os códigos morais religiosos de nossas mãos e nos obriga a descobrir um rosto, vários rostos. O essencial não está escrito nas páginas de um livro, pois o essencial sempre tem um rosto. Jesus nos faz saber que não existe nenhum espaço sagrado em que possamos nos encontrar somente com Deus e ficar de costas para os outros. Um amor a Deus que esquece seus filhos e filhas é uma grande mentira.


CONTEMPLAR

O coração pleno do amor, 2010, Patrice Delaby (1953-), óleo sobre tela, Pas-de-Calais, França.




           
           




segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O Caminho da Beleza 48 - XXIX Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 48
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XXIX Domingo do Tempo Comum             19.10.2014
Is 45, 1.4-6              1 Ts 1, 1-5                Mt 22, 15-21


ESCUTAR

“Eu sou o Senhor, não existe outro: fora de mim não há Deus” (Is 45, 5).

“Damos graças a Deus por todos vós, lembrando-vos sempre em nossas orações” (1 Ts 1, 2).

“Dize-nos, pois, o que pensas: é lícito ou não pagar imposto a Cesar?” (Mt 22, 17).


MEDITAR

“A Igreja não existe para si mesma, não é o ponto de chegada, mas deve apontar para além de si, para o alto, acima de nós. A Igreja é verdadeiramente o que deve ser, na medida em que deixa transparecer o Outro – com o ‘O’ grande – do qual provém e para o qual conduz. A Igreja é o lugar onde Deus ‘chega’ a nós e donde nós ‘partimos’ para Ele” (Bento XVI).

“Ao se aproximar da sua morte e da sua ressurreição, Jesus se despojou de muitas coisas. Não fez mais nenhum milagre, não estava mais no centro da multidão, uma figura cercada por apoiadores e admiradores. Ele se privou dos seus discípulos que o renegaram e fugiram. Finalmente, ele se despojou das suas vestes e subiu nu na cruz. Tudo isso abriu o caminho para o dom inimaginável da Ressurreição” (Timothy Radcliffe).


ORAR

O Senhor confere o título de cristo – ungido – a Ciro, rei da Pérsia que nem sequer O conhecia. Um não–crente, sem etiquetas religiosas é chamado para realizar as obras de Deus. Os judeus haviam buscado a segurança ao estreitar alianças, ao pactuar com os poderosos da vez e esquecer que a segurança somente está assegurada pela fidelidade ao Senhor. Os pactos não impediram a ruína, ao contrário, causaram-na. Durante o exílio da Babilônia, a esperança enfraqueceu, mas graças ao edito de Ciro, em 598 AC, os judeus puderam voltar à sua terra. O edito de Ciro é mais convincente do que o de Constantino, recém-convertido, que aprisionou a Igreja ao poder temporal, tornando-a um império religioso. Jesus escapa da armadilha de seus interlocutores, deixando-os numa situação embaraçosa, pois não delimita de uma maneira inequívoca o território espiritual e o temporal. Cristo não dá uma resposta/receita válida para todo o sempre, mas reafirma a riqueza de uma luz que existe no nosso interior: a consciência. O seguimento de Jesus não nos fornece um passaporte eterno e milagroso que resolve, automaticamente, para sempre, todos os conflitos. Paulo nos exorta a acreditar que a maturidade da fé vem do enfrentamento dos desafios, sem nada escamotear, apenas contando com a abundante força do Espírito. No nosso agir, devemos assumir nossa posição com a atuação da fé, o esforço do amor e a firmeza da esperança em Cristo. Jesus pede uma moeda, pois vivia como itinerante, sem trabalho e sem morada fixa. Ele não tinha sequer uma moeda e sua túnica não tinha bolsos. Jesus não afirma que uma metade da vida, a material e a econômica, pertence à esfera de Cesar e a outra metade, a espiritual e religiosa, à esfera de Deus. Sua mensagem é clara: se entrarmos no Reino não podemos consentir que nenhum Cesar imponha sacrifícios ao que somente a Deus pertence: os famintos do mundo, os proscritos da sociedade, os vitimados por guerras. Jesus é enfático na sua escolha e o seu Evangelho já a fez por nós: que nenhum Cesar conte conosco, pois nunca nenhum Cesar contará com Ele.


CONTEMPLAR


Jesus e o imposto da moeda, c. 1620-30, Giovanni Serodine (c.1594-1630), óleo sobre tela, 146 cm x 227 cm, Galeria do Museu Nacional da Escócia, Edimburgo, Escócia.






segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O Caminho da Beleza 47 - Nossa Senhora Aparecida

O Caminho da Beleza 47
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



Nossa Senhora Aparecida                  12.10.2014
Est 5, 1b-2; 7, 2b-3                   Ap 12, 1-5                Jo 2, 1-11


ESCUTAR

“Concede-me a vida, eis o meu pedido, e a vida do meu povo, eis o meu desejo!” (Est 7, 3).

“Apareceu no céu um grande sinal” (Ap 12, 1).

“Eles não têm mais vinho” (Jo 2, 3).


MEDITAR

“A mesa em comum com o hóspede é o espaço em que o alimento é compartilhado, e o comer se torna ‘convívio’, ocasião de comunhão vital: é à mesa, à mesa compartilhada, que o ser humano tem a oportunidade, todas as vezes renovada, de se libertar do seu ser ‘devorador’ – do alimento e do outro – e de se tornar mais uma vez, a cada dia, uma pessoa de comunhão” (Enzo Bianchi).

“Soou a hora da história do mundo em que o amor do irmão homem, como problema e como realidade, une os cristãos e os não-cristãos. Eis porque também chegou a hora em que é necessário ver que o amor cristão, naquilo que tem de mais íntimo, ultrapassa o cristianismo: ultrapassa, derramando-se na extensão total do mundo. Mais do que isto, é necessário compreender que este movimento de superação constitui a essência do cristianismo” (Hans Urs von Balthasar).


ORAR

   O tema das Bodas é marcante em toda a nossa tradição judaico-cristã. Ele realça a dimensão amorosa e terna da Aliança do Senhor com a abundância proclamada pelo profeta Joel: “Acontecerá naquele dia que as serras estarão suando vinho novo, os morros escorrendo leite (Jl 4, 18). O evangelista revela que todo rito legalista é estéril. A água só se converte em vinho depois de retirada das talhas, pois antes era apenas uma água que lavava o exterior das pessoas que cumpriam a norma rígida da Lei. Jesus nos faz saber que não podemos jamais nos fechar num ritualismo legalista que endurece os corações e entristece os espíritos. Agora a água, transformada em vinho, é oferecida aos borbotões para todos na festa nupcial. Este vinho representa o cumprimento da promessa de abundância: “Vinde comer meus manjares e beber o vinho que misturei” (Pr 9, 4-5) e “Vinde a mim vós que me amais, e saciai-vos de meus frutos; recordar-me é mais doce do que o mel, possuir-me é melhor que os favos” (Eclo 24, 20-21). O vinho é a alegria do homem reconciliado consigo mesmo, com seu próximo e com seu Deus. A festa de Caná é o momento de um novo parto tanto para Jesus como para Maria que auxilia o rito de passagem de seu Filho que sai do silêncio para o início da vida pública. Confiante que o Filho, embriagado pelo Espírito, estava cumprindo a vontade do Pai, Maria ordena sem hesitar: “Fazei tudo o que ele vos disser”. Como escreve a psicanalista Françoise Dolto: “Talvez, tenha sido nesse momento, nas bodas de Caná, que Maria se tornou a Mãe de Deus!”. A água convertida em vinho é, simbolicamente, o novo parto em que a Mãe – água e sangue – gera o Filho para o mundo e para a vida em abundância – pão e vinho – sendo Ele mesmo a Vinha da qual somos os ramos. A essência deste milagre está na revelação de que Jesus tem compaixão pela necessidade dos outros e que o amor fraterno é sempre estar pronto a responder a estas necessidades, sejam quais forem. Com Maria se antecipa o milagre da fé pascal e se antecipa para nós, seus filhos e filhas, a mesma fé para que ninguém duvide de que Jesus seja capaz de renascer e expandir a alegria das Bodas do Cordeiro para toda a humanidade convidada, agora e sempre, para o Seu banquete nupcial. O gesto de entrega de Jesus será glorificado na Cruz como uma exaltação embriagada de amor e de amar que foi iniciada em Caná.


CONTEMPLAR

Bodas em Caná, 2014, Katie Hoffman, óleo sobre tela, 18” x 18”, Denver, Colorado, Estados Unidos.