segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

O Caminho da Beleza 06 - Santa Mãe de Deus, Maria

O Caminho da Beleza 06
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).




Solenidade da Santa Mãe de Deus, Maria                      01.01.2012
Nm 6, 22-27                       Gl 4, 4-7                   Lc 2, 16-21


ESCUTAR

“O Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz!” (Nm 6, 26).

“Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher” (Gl 4, 4)

“Quanto a Maria, guardava todos esses fatos e meditava sobre eles em seu coração” (Lc 2, 19).


MEDITAR

“A vida é mais forte do que a morte. A imagem da Mãe de Deus nos dá esperança e confiança na vida. Ela nos mostra a dimensão maternal de Deus. O que reencontramos no coração do mundo, não é nem o desespero, nem o absurdo, mas um Deus maternal” (Anselm Grün).

“O corpo humano é um corpo que se faz, um corpo que se transforma, um corpo que se espiritualiza, um corpo que se imortaliza e um corpo que respira Deus e que O revela” (Maurice Zundel).


ORAR

O ano civil se abre com a festa da Mãe de Deus. Maria, com seu consentimento ilimitado, revela uma fecundidade aberta ao Infinito e a resposta de Deus é uma maternidade cuja expansão é imprevisível. Cada afirmação dada ao Senhor é sempre restituída com o imprevisível do seu dom. Hoje comemoramos a jornada mundial da Paz e devemos estar lúcidos de que a paz só poderá ser construída quando os homens disserem um Sim, uns aos outros, como uma acolhida recíproca de cada um como irmão. O Evangelho chama de bem aventurados os construtores da paz, uma paz que nunca será construída pelos poderosos da terra, que lucram com as guerras e que se imobilizam reciprocamente por meio dos arsenais atômicos e dos mísseis que desfilam diante das crianças nas festas da Pátria. Desfilam para adestrá-las a sentirem orgulho do poder bélico, sem saber que são poucos os que lucram com a fábrica de mortes que se sucede de geração em geração. Que se vingue a profecia de D. Hélder Câmara: “que se acabe, mas que se acabe mesmo, a maldita fabricação de armas. O mundo precisa fabricar é a paz!”. O campo de guerra dos cristãos é um campo aberto cujas armas são o perdão, a tolerância, a compreensão, o respeito e a confiança. É necessário ensinar as crianças, por meio dos seus video games, que há sempre um irmão para amar e não um inimigo a ser eliminado. Agindo desta forma, seremos merecedores do bendizer de Deus sobre nós para que sejamos transformados pela sua Palavra. Pedir a bênção de Deus é nos oferecermos, incondicionalmente, a Ele para que exerça em nós a Sua ação transformadora e nos vire do avesso. A bênção maior é o dom do Seu Filho por meio do qual volta para nós o Seu rosto e faz brilhar sobre nós a Sua face. Tudo é expressão de humildade: os pastores eram pessoas pouco recomendadas e o seu trabalho os impedia de frequentar as sinagogas e respeitar o sábado; tudo se passa em Belém, a casa do pão, e o Menino está deitado numa manjedoura que se torna uma bela imagem para Aquele que vem para ser alimento da humanidade. A Igreja de Jesus não deve procurar a companhia dos grandes, mas compadecer-se na amizade dos que são, falsamente, chamados de pobre gente. Meditemos as palavras do Cardeal Gianfranco Ravasi: “A Igreja, como Maria, deve viver a sua santidade e a sua fidelidade na existência ordinária dos homens sem procurar se distinguir ou se fazer notar e separar-se deles. A Igreja deve viver no meio deles nas circunstâncias ordinárias da vida”.


CONTEMPLAR

Virgem amamentando, ou Galactotrophousa, Girgis Al-Musawwir, último quarto do século XVIII, têmpera sobre madeira, 32,4 x 26 cm, Arcebispado Grego-Católico de Alep, Síria.



quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

MADRE BELÉM - "TRANSITUS"






MARIA JOSEPHINA MONTEIRO FRANCO (1909-2011)


                                                                          MADRE BELÉM



Fundadora do convento das contemplativas de Nossa Senhora de Sion de Curitiba, em 1958, Madre Belém marcou gerações com a sua sabedoria e a sua profunda formação teológica. Nos anos de ditadura militar, ainda como superiora, protegeu, em seu convento, homens e mulheres perseguidos pela repressão política, num claro testemunho de solidariedade samaritana para com todos os indefesos. Conselheira de bispos, abades e sacerdotes, teve, até os seus últimos dias, uma correspondência profícua com os eremitas do mundo. Poliglota, estudiosa da Palavra de Deus, na sua profunda humildade, aceitou todas as mudanças e transformações decididas pela sua Província no entorno do seu convento, cujas terras foram doadas à congregação de Sion, pelo seu pai, Arthur Martins Franco. No início dos anos 70, radicalizou a sua vida contemplativa no seu eremitério perto de Ponta Grossa, que tão carinhosamente chamava de Taperinha, sob a proteção de São Miguel Arcanjo. No seu testamento espiritual, in articulo mortis, no leito do hospital, rodeada por seus familiares e seus filhos espirituais, balbuciou: “Nós nascemos para nos perder em Deus e não para nos achar. A maior certeza que nós temos ao morrer é a certeza do amor de Deus por nós. Deus nos ama tanto que se a gente soubesse quem era Deus a gente não fazia outra coisa se não amá-Lo.” Madre Belém legou para as suas irmãs contemplativas e da congregação a certeza vivida de que o único caminho da salvação passa pelo despojamento e pelo serviço aos menores que são o rosto verdadeiro de Cristo. Conclui o seu testamento espiritual afirmando: “Outra coisa é sabermos manter esse amor ao Cristo por uma doação completa aos pobres e necessitados. Mesmo que seja pouco o que eles não ousam pedir, nós temos que adivinhar e é essa a resposta que Deus pede de nós”. Aprendemos com a sua vida que existem apenas dois tipos de pessoas no mundo: as que, mesmo passando, continuam vivas eternamente no coração de Deus e dos seus irmãos e irmãs e as que vão morrendo, desde que nasceram, deixando atrás de si apenas um rastro de amargura e dissimulação. Madre Belém finalmente encontrou o Esposo amado e pode Lhe dizer o que mais amava dizer no momento da sua comunhão do Sangue de Cristo: “Beija-me com os beijos de sua boca” (Ct 1, 1). Passou para a eternidade no dia de São João da Cruz que um dia escrevera aos soberbos de pouca inteligência e coração: “Deus nos livre de nós mesmos”. Que ela, mais do que nunca, continue sendo a advogada nossa diante da Trindade Amorosa e interceda por nós junto ao Pai, seu Esposo amado, Senhor e Fonte da Vida, pela graça de seu Filho e na liberdade do Espírito Santo. Amém!



            TESTAMENTO ESPIRITUAL DE MADRE BELÉM

Dia 05 de dezembro de 2011, em um quarto de hospital, após ter resistido a uma intubação na UTI, Belém, expandida no Espírito, nos ofereceu esse depoimento de vida e de amor, um verdadeiro testamento espiritual proferido “in articulo mortis”, quase sem interrupção, e que nós, testemunhas presentes, consideramos uma epifania. Deus esteja!


O Amor Máximo, o Espírito Santo. Devemos amar o Espírito. É o encontro do teu Espírito com o Espírito Santo. Se tua igreja pequenina não estiver incorporada na igreja de Deus, ela não é nada. A igreja é certa até certo ponto. Tem que participar da igreja e não dessa igrejinha que somos nós.
Deus não é só Espírito, é pele. Tem que amar o Espírito Santo, chamar por Ele que Ele responde por nós. Responde por Ele, a ternura. O grande é o Espírito Santo, pequeno é a gente. Eu não tenho medo da morte porque eu vou me entregar a Deus inteira.
Nós nascemos para nos perder em Deus e não para nos achar. A maior certeza que nós temos ao morrer é a certeza do amor de Deus por nós. Deus nos ama tanto que se a gente soubesse quem era Deus a gente não fazia outra coisa se não amá-Lo. “Apaixonite” aguda, agudíssima, nos perder no amor de Deus.
A Eucaristia para nós é a descida ao nosso nível e ao nosso amor absoluto como Ele é. Deus é louco por nós. Se não nos amasse, Ele não dava tudo que precisava a nós. Àquilo que a Deus se pede, é uma graça.
Eu não recebo Deus como pessoa, eu recebo como ente vivo. Deus nos amou assim, eternamente, internamente manifesta o Seu amor. Mas não acreditam muito, mas se já acreditassem seria uma consagração a Deus. Ser capaz de dar à igreja o que ela pede, sem crítica.
As pessoas que amei na vida amei muito até o fim. Foram vocês. Não houve gente que amasse vocês como eu amei, intensamente. É o jeito que eu tinha de amar vocês que é diferente, entende? Essa é a verdade que vivemos, em gozá-la.
Se um dia eu for pro céu, eu venho sempre retribuir. A igreja deve ser mais simples e mais despojada, mas eu não tenho o direito de abrir a boca.
Foi boa a nossa vidinha juntos. Graças a Deus. Isso é a verdadeira prova de amor. Qualquer coisa que vocês precisarem digam, essa é a maior prova de amor. Mas eu peço realmente o que o nosso Père disse: ser fiel ao amor de Deus! Sabe o que isto consiste? De ser um apaixonado de Deus. Por apaixonado de Deus se entende ser capaz de dar o que somos de amor possível para as pessoas. Que a gente ame a Deus, mas até que ponto a gente pode chegar a amar, esse amor que tem que ser total para ser verdadeiro?
A maior paixão que Deus podia nos dar ele nos deu. Nós nos sentimos obrigados a retribuir essa mesma paixão, até para morrer na cruz, como os monges de Tibhirine [que foram martirizados na Argélia, em 1996]. A nossa religião só chega à verdade nesse ponto. Ser capaz de entregar a vida, como os monges, sem o mínimo interesse, só por paixão. Nós fomos feitos para se perder em Deus. Se não soubermos nos perder em Deus nos perderemos na vida.
Deus se apresenta como possibilidade de amor total e nós temos que nos deixar impregnar no Espírito desse amor total. E esse amor total exige de nós uma entrega absolutíssima! É uma exigência de Deus, se soubermos ser fiel a essa paixão de Cristo, que é a paixão de sabê-Lo amá-Lo a esse ponto.
Outra coisa é sabermos manter esse amor ao Cristo por uma doação completa aos pobres e necessitados. Mesmo que seja pouco o que eles não ousam pedir, nós temos que adivinhar e é essa a resposta que Deus pede de nós.
Deus me perdoe as bobagens que eu digo. Ter pensamentos humanos que não podem chegar a atingir o amor que Deus pede de nós. O sinal de atingirmos o amor é que chegaremos junto Dele, se não Ele não nos entende.
Você tem que provar na sua vida que você é filho de verdade e tem que amar sabe como? Totalmente!
Quando há uma missa que a gente não vai e despreza tivemos é uma oportunidade perdida. Peço a vocês, nunca deixem de ir a uma missa por preguiça, afazeres ou distração. A fidelidade à missa de domingo é uma garantia de salvação. Porque Deus põe as graças da semana em cima do altar e nós temos que buscá-las, se não quem sai perdendo somos nós.
Durmam bem na glória de Deus!
[Referindo-se ao terço em suas mãos]: Isso abre as chaves do céu! Nós temos a obrigação de nos abrirmos ao amor de Cristo pela abertura através de Nossa Senhora porque ela é a única pessoa que recebe de Deus.
Deus pede ao sacerdote o seu Espírito e ele deve dar! Se não der será uma falsidade. Diga a Deus que me perdoe todas essas minhas intervenções e a minha falta de entrega à igreja.
[Apontando para a mão manchada pelas agulhas]: isso é uma prova de amor, de amor nupcial!
Peço perdão a Deus. Somos capazes de amar a Deus somente na medida em que Ele nos pede.
         Rezem para Deus para fazer eu morrer de amor. Isso é o mais essencial. Não há coisa melhor do que esse encontro. Vamos gozá-lo juntos.
         Quero ir para casa logo porque eu tenho um encontro marcado, sabem com quem? Com Deus!

[Madre Belém passou dormindo na cela de seu convento, na madrugada do dia 14 de dezembro de 2011, Festa de São João da Cruz, em plena solidão com Deus.]


Testemunhas:

Maria do Rocio Munhoz da Rocha Lemos
Maria Rosa Ribas Munhoz da Rocha
Francisco Sérgio Barreto Munhoz da Rocha
Joaquim Monteiro Franco Filho
Pe. Paulo Botas, mts
Pe. Eduardo Spiller, mts







terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O Caminho da Beleza 05 - Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo

O Caminho da Beleza 05
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo          25.12.2011
Is 52, 7-10               Hb 1, 1-6                  Jo 1, 1-18



ESCUTAR

“O Senhor desnudou seu santo braço aos olhos de todas as nações; todos os confins da terra hão de ver a salvação que vem do nosso Deus” (Is 52, 10).
“Muitas vezes e de muitos modos falou Deus outrora aos nossos pais pelos profetas; nestes dias, que são os últimos, ele nos falou por meio do Filho, a quem ele constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual também ele criou o universo” (Hb 1, 1-2).
“E a Palavra se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14).



MEDITAR
“O homem é uma criatura que recebeu a ordem de se tornar Deus” (São Basílio).
“O sagrado no Cristo não é qualquer coisa que existe sob os ferrolhos ou que é colocada atrás das grades ou ainda sob véus impenetráveis. O sagrado em Jesus é o homem, é o próprio homem. São as nossas mãos, o trabalho de nossas mãos; são os nossos olhos e a luz que os preenche; são os nossos corações e esta maravilhosa capacidade de amar. Isto tudo é o que constitui o sagrado que perpetua a Encarnação e que não cessa de tornar presente o Cristo entre nós” (Maurice Zundel).

ORAR
Natal significa que “um Menino nos nasceu” (Is 9, 5) e este é o sinal para a Humanidade. Nada de grandioso ou espetacular, pois Deus para nos encontrar escolhe o caminho da modéstia e da pequenez. Paulo é firme: “Manifestou-se a graça de Deus que salva todos os homens... Apareceu a bondade do nosso Deus e Salvador e seu amor pelo homem (Tt 2, 11.3,4). O Natal significa que o sorriso divino pousou sobre as nossas misérias, devolveu a esperança e nos abriu todas as possibilidades futuras. Este rosto do Menino não é mais o de um Deus distante, carrasco; nem o de um Deus desiludido e traído. Este rosto terno e carinhoso revela a única condição para conquistarmos a vida eterna: deixarmo-nos amar. O natal não é apenas uma data inventada, mas o início da Boa Nova que nos faz saber que um escapou do censo ordenado por Cesar Augusto e que, portanto, não foi incluído como um dado estatístico. Não comemoramos uma data que colocou tudo em ordem, mas um início de um tempo em que a justiça de Deus se manifesta em toda a sua plenitude. A solidão acabou porque os homens e mulheres têm a mão que os guia, que os salva e os consola. O evangelista revela que o Verbo não somente entra no mundo, mas se torna um membro da humanidade e declara que a presença de Deus (Shekinah), até então na tenda da Aliança, está agora plenamente realizada na tenda de carne do Emmanuel. A divindade não  se sobressai como um árbitro destacado e eterno do contexto terrestre, mas está implicada na complexidade da realidade humana. O evento decisivo da nossa existência e o artigo de fé fundamental do cristianismo é a encarnação do Verbo. No Natal é desvelado que o Cristo é a Palavra que exige escuta; é a Vida que exige adesão do coração; é a Luz que exige a luta contra a cegueira para que possamos todos juntos, peregrinos, construir a cada nova geração um mundo de justiça e paz. No entanto, alguns natais são anunciados sem nenhum engajamento de fé. Um natal folclórico, mercantilizado, ruidoso e de uma ritualismo consumista; um natal emotivo, marcado pelo infantilismo e que, apesar dos sentimentos, sabe calcular os impulsos de generosidade; um feriado natalino para ser aproveitado em viagens esnobes, que nos levem o mais distante possível de todos. Finalmente, um natal dos que foram um dia batizados e que, ao menos uma vez por ano, vestem a carapuça de cristãos para poder passar pelo umbral das igrejas mais próximas que lhes ofereça um horário de celebração mais cômodo para não atrapalhar a ceia natalina e a troca de presentes. Outros natais são possíveis de ser acrescentados à lista uma vez que são apenas pretextos para qualquer coisa. Que neste dia de Natal sejamos capazes de colocar nas nossas vidas um pouco menos de qualquer coisa, como os restos de nossas ceias. Que sejamos capazes de conseguir um pouco menos de alienada religiosidade e um pouco mais de fé comprometida com Aquele cujo nome é “Conselheiro Admirável, Deus Guerreiro, Pai dos Tempos Futuros e Príncipe da Paz” (Is 9, 5).



CONTEMPLAR
Le Mystère de L'Incarnation, Louis Rivier,  1954, tríptico da Encarnação (painel central), 250 x 150cm, Lausanne, Suíça.






terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O Caminho da Beleza 04 - IV Domingo de Advento

O Caminho da Beleza 04
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



IV Domingo de Advento                      18.12.2011
2 Sm 7, 1-5.8-12.14.16                Rm 16, 25-27                     Lc 1, 26-38



ESCUTAR

“Nessa mesma noite, a palavra do Senhor foi dirigida a Natã nestes termos: ‘Vai dizer ao meu servo Davi: Assim fala o Senhor: Porventura és tu que me construirás uma casa para eu habitar?’” (2 Sm 7, 4).

“Irmãos, glória seja dada àquele que tem o poder de vos confirmar na fidelidade ao meu evangelho e à pregação de Jesus Cristo, de acordo com a revelação do mistério mantido em sigilo desde sempre” (Rm 16, 25).

“Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1, 38).


MEDITAR

“Senhor, concede-me esta fé que não teme nem os perigos, nem a dor, nem a morte, que sabe caminhar na vida com calma, paz e alegria profunda e que estrutura a alma num desapego absoluto de tudo o que Tu és” (Charles de Foucauld).

“Eu não quero orar para estar protegido dos perigos, mas para poder enfrentá-los” (R. Tagore).


ORAR

Os textos deste último domingo de Advento desvelam duas maneiras de viver a espera. A primeira, a de Davi preocupado em construir um espaço externo para Deus: um templo mais monumental do que os santuários pagãos. A segunda, a de Maria disponível para oferecer a Deus o espaço interior das suas entranhas de escuta e acolhida. O Senhor não está de acordo com os sonhos de grandeza do rei Davi ainda que generosos. Deus não quer habitar uma casa de pedras, mas fazer de um povo a sua própria habitação e caminhar com ele, pois prefere as pedras vivas mais do que aos monumentos. Deus privilegia como seu Templo a comunidade humana: “Ele, que é Senhor do céu e da terra, não habita em templos construídos por homens, nem pede que o sirvam mãos humanas, como se precisasse de algo” (At 17, 24-25). Nestes dias que antecedem a chegada do Menino, estamos ansiosos e mais envolvidos com a lista de presentes, com a receita das comidas, com as vestimentas para a noite de festa e com o esplendor da árvore natalina. Tudo está pronto como o programado. Nada falta do que pensamos, mas falta Alguém. Ainda bem que existe Maria para conduzir-nos na simplicidade ao essencial e Deus tem necessidade dela. Tem necessidade de poder dispor de uma criatura que não coloque resistência à sua ação; uma criatura não encouraçada pelas coisas e nem por si mesma. Uma criatura que não diga: “Eis o que decidi e preparei”, mas apenas pronuncie: “Eis-me aqui!”. Maria de Nazaré oferece ao seu Senhor o único espaço que Ele necessitava: o seu corpo, a sua pessoa e todo o seu ser. Para o Senhor, o templo-monumento é estreito demais porque somente um templo de carne pode conter a sua glória. Só as pequenas entranhas de uma jovem conseguem abraçar a grandeza divina e nelas Deus finalmente encontrou uma casa. São Bernardo de Claraval dizia: “havendo Deus de ter Mãe, não podia ser senão virgem, e havendo uma virgem de ter um Filho, não podia ser senão Deus”. Nestes dias que faltam para o Natal, devemos deixar de imitar Davi com seus preparativos suntuosos e nos identificarmos com Maria na calma, na paz e na oração. O Emmanuel não reconhece seu espaço nas coisas, nos shoppings, nos salões, nos frenesis das compras e desvarios dos presentes. O Emmanuel se encontra no humilde e sussurrante Sim de quem, silenciosamente, O acolhe nas entranhas do seu ser e O embala nas vísceras de ternura do seu corpo, adormecendo-O com o ritmo do seu coração. O Natal é, antes de mais nada, um convite para redescobrir a nossa humanidade, a nossa interioridade e o nosso peregrinar para as Bodas nupciais do Cordeiro que já está no meio de nós.


CONTEMPLAR

A Jovem Sagrada Família, Daniel Bonnell, óleo sobre madeira, 48” x 92”, Carolina do Sul, Estados-Unidos.


sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O Caminho da Beleza 03 - III Domingo de Advento

O Caminho da Beleza 03
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



III Domingo de Advento                      11.10.2011
Is 61, 1-2.10-11                  1 Ts 5, 16-24                                  Jo 1, 6-8.19-28

ESCUTAR
“O espírito do Senhor Deus está sobre mim, porque o Senhor me ungiu; enviou-me para dar a boa-nova aos humildes, curar as feridas da alma, pregar a redenção para os cativos e a liberdade para os que estão presos; para proclamar o tempo da graça do Senhor” (Is 61, 1-2).
“Não apagueis o espírito! Não desprezeis as profecias, mas examinai tudo e guardai o que for bom. Afastai-vos de toda espécie de maldade!” (1 Ts 5, 19-22).
“Surgiu um homem enviado por Deus; seu nome era João. Ele veio como testemunha para dar testemunho da luz, para que todos chegassem à fé por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz” (Jo 1, 6-8).

MEDITAR
“Não há nada de melhor no mundo do que estas amizades maravilhosas que Deus desperta e que são como o reflexo da gratuidade e da generosidade do seu amor” (Jacques Maritain).
“Parti sem o mapa da estrada para descobrir Deus, sabendo que Ele está no caminho e não no fim desta mesma estrada” (Madeleine Delbrel).

ORAR
Quatro vozes diversas nos seus tons e timbres ressoam na unidade de um único anúncio: o do Reino de Deus. A primeira, do profeta Isaías anunciando que a relação Deus/Homem voltou a ser uma aliança de amor inquebrantável e nesta celebração nupcial revela-se o símbolo da veste: “Ele me vestiu com as vestes da salvação, envolveu-me com o manto da justiça e adornou-me como um noivo com sua coroa ou uma noiva com suas joias”. A segunda, a do Batista, para testemunhar Aquele-que-vem: “Quem tem a noiva é o noivo. Aquele que o ouve alegra-se por ouvir a voz do noivo. E nisso consiste minha alegria completa. Ele deve crescer, eu diminuir” (Jo 3, 29-30). A terceira voz é a de Jesus que assume o profeta Isaías e afirma, publicamente, na sinagoga, que os novos tempos já começaram: “Hoje, em vossa presença, cumpriu-se esta Escritura” (Lc 4, 21). A quarta voz ressoa na Igreja pela voz de Paulo ao anunciar o Cristo Ressuscitado na história humana e que a vontade do Pai não é abstrata nem genérica, mas concreta e exigente: “em espírito, alma e corpo!”. A pergunta que decorre do Evangelho de hoje é se a profecia ainda encontra lugar na Igreja, pois os profetas nos afetam, nos comprometem e nos incomodam. Profecia é uma palavra do verbo incomodar. Somos avessos aos profetas porque tememos os poderosos que eles denunciam. Anunciamos aos quatro ventos os oprimidos, mas falamos entre quatro paredes dos opressores. Os profetas são sempre difamados, exilados, excomungados e mortos. Depois de um tempo são exaltados, consagrados e com as pedras da sua lapidação se constroem monumentos ou templos em sua honra. A força da Palavra de Deus é que ela não fica, para sempre, gravada na lápide de um túmulo. Ela ressuscitou e continua a profetizar no meio de nós por meio dos que são considerados loucos e poetas; dos que nos tiram da acomodação, abalam nossas seguranças e certezas. João, o Batista, começou a anunciar a presença do Cristo no meio de nós antes mesmo de tê-Lo reconhecido. É nesta atitude que se conhece o verdadeiro profeta: ele persegue a sua missão mesmo na noite, pois o que importa antes de tudo é que os homens creiam. Todas estas vozes se unem num único tema: a misericórdia como lei superior à da justiça: “Sede misericordiosos, como vosso Pai é misericordioso” (Lc 6, 36). Nestes tempos de Assis e de “peregrinos da verdade, peregrinos da paz”, apesar de toda a violência em nome das religiões, é bom saber que também para o Islã o nome mais belo dos 99 nomes de Deus é “Misericordioso”.

CONTEMPLAR
Madona de Porto Lligat (detalhe), Salvador Dalí, 1950, óleo sobre tela, 144 x 96 cm, Coleção Particular, Tóquio, Japão.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O Caminho da Beleza 02 - II Domingo do Advento

O Caminho da Beleza 02
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



Segundo Domingo de Advento                     04.12.2011
Is 40, 1-5.9-11                    2 Pd 3, 8-14                                   Mc 1, 1-8



ESCUTAR

“‘Consolai o meu povo, consolai-o’ – diz o vosso Deus... Grita uma voz: ‘Preparai no deserto o caminho do Senhor, aplainai na solidão a estrada de nosso Deus’” (Is 40, 1.3).

“O Senhor não tarda a cumprir sua promessa, como pensam alguns, achando que demora. Ele está usando de paciência para convosco, pois não deseja que alguém se perca” (2 Pd 3, 9).

“Esta é a voz daquele que grita no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas estradas’” (Mc 1, 3).


MEDITAR

“Tomar consciência dos nossos medos nos permite superá-los e nos abrir a um mundo de possibilidades. Ao cessar de duvidar de nós mesmos encontramos ao mesmo tempo a coragem de assumir nossos erros” (François Gervais).

“Pelo amor de Deus, eu vos suplico: não tenhais medo de Deus, pois Ele não vos deseja nenhum mal. Ao contrário, amai-O com todas as vossas forças, porque Ele vos ama infinitamente” (Padre Pio).


ORAR

João, o Batista não é certamente um tipo fascinante para angariar simpatias e popularidade, pois se vestia com uma pele de carneiro, comendo gafanhotos e mel do campo. Nos dias de hoje, com certeza, não seria o porta-voz de nenhum personagem importante, nem relações públicas de uma multinacional e muito menos promotor vocacional de alguma ordem religiosa. Além de tudo, criaria situações incômodas nos ambientes eclesiásticos. João foi o escolhido para pregar a conversão e o perdão e elegeu o deserto para a sua missão. João não escolheu nem os templos e nem as praças porque é no deserto que a palavra provoca o silêncio e não os aplausos. É pelo deserto que passa o caminho do Senhor e nele o profeta semeia inquietudes, questionamentos; acende os desejos, suscita uma espera e exige uma busca. João, o Batista, espera a chegada do Senhor no despojamento de si e numa ética de vida, dando o exemplo para que a Igreja, da mesma maneira, espere a segunda vinda do Cristo. Ele nos apela a preencher os vales que se tornaram abismos de insignificâncias; a aplainar os montes e as colinas da presunção e da autossuficiência e a endireitar os terrenos acidentados das dissimulações e incoerências. João é chamado de lâmpada conforme a palavra do Senhor: “Ele era uma lâmpada que ardia e iluminava” (Jo 5, 35). O Cristo é precedido por uma lâmpada como canta o salmista: “Preparo uma lâmpada para o meu Ungido” (Sl 132, 17) e João prediz que a claridade da sua lâmpada se tornará inútil e desaparecerá com a vinda do Sol: “É preciso que Ele cresça e eu diminua” (Jo 3, 30). A Boa Nova faz saber que somos mais ricos do que acreditamos; nossas almas são mais belas do que nos fizeram pensar e somos homens e mulheres com infinitas possibilidades. João, o Batista, anuncia que o milagre é possível: as nossas vidas banhadas pela luz do Sol Nascente abandonarão a mesquinhez para se vestirem com a pródiga esperança que alimenta todos os desejos de expansão da força vital. Seremos transformados pelo Espírito de Deus e realizaremos a profecia de Joel: “Nos últimos dias, eu farei que vossos jovens tenham visões e vossos velhos, sonhos” (Jl 2, 28). João, no deserto, anuncia e cumpre a promessa de que “água fresca para a alma sedenta é o mensageiro de uma boa nova que vem de uma terra distante”(Pv 25, 25).


CONTEMPLAR

Nascimento em Belém (detalhe), Jean-Marie Pirot (Arcabas), 2002, óleo e ouro 24 q. sobre tela, Políptico da Infância do Cristo, Palácio Arquiepiscopal de Malines, Bruxelas, Bélgica.


terça-feira, 22 de novembro de 2011

O Caminho da Beleza 01 - I Domingo do Advento

O Caminho da Beleza 01
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



I Domingo de Advento             27.11.2011
Is 63, 16-17.19; 64, 2-7               1 Cor 1, 3-9             Mc 13, 33-37


ESCUTAR

“Ah! Se rompesses os céus e descesses! As montanhas se desmanchariam diante de ti... Vens ao encontro de quem pratica a justiça com alegria, de quem se lembra de ti em teus caminhos” (Is 63, 19; 64, 4).

“Nele fostes enriquecidos em tudo, em toda palavra e em todo conhecimento, à medida que o testemunho sobre Cristo se confirmou entre vós” (1 Cor 1, 5-6).

“O que vos digo, digo a todos: vigiai!” (Mc 13, 37).


MEDITAR

“Aquele que ensina o bem aos outros sem o praticar é como um cego que segura uma lanterna” (Provérbio Argelino).

“Procurar Deus é se deixar constantemente questionar por Ele. Não se deve procurar Deus como se procura qualquer coisa que se pode comprar” (Anselm Grün).


ORAR

Somos chamados a acertar os nossos relógios e calendários e a liturgia de hoje nos oferece para isto dois acontecimentos. O primeiro, é que o Senhor não esconde mais o seu Rosto e o segundo é a vinda do Cristo para o Juízo Final. Estes dois acontecimentos não se referem um ao passado e outro ao futuro, mas dizem respeito ao hoje, ao aqui e agora. Cristo já veio, mas é também acolhido hoje. Cristo, contudo, deve vir, mas há de ser esperado aqui e agora e, por esta razão, vigiamos. Devemos despertar do torpor que temos vivido, pois nunca seremos leais a um Deus em movimento se não assumirmos uma postura dinâmica que implica uma permanente conscientização e um compromisso responsável. O Deus da Encarnação e do Juízo é surpreendente, pois não vem exigir, mas dar: “Nunca se ouviu dizer nem chegar aos ouvidos de ninguém, jamais olhos viram que um Deus, exceto TU, tenha feito tanto pelos que Nele esperam” (Is 64, 3). Acolher este Deus não é preparar um espetáculo colossal, mas nos apresentarmos com nossa pobreza que é, essencialmente, a disponibilidade para receber. Não cabe delegar a ninguém a tarefa de vigiar para nos despertar no momento oportuno, pois, aos olhos de Deus, somos os únicos responsáveis por nossos atos. Todo o dia pode ser o dia e toda a hora poderá ser a hora e o momento do Advento do Senhor. No coração de cada um desdobra o infinito dos céus, a beleza da alma e o apelo generoso para a liberdade. Bernardo de Claraval exortava no seu sermão de Advento: “Não é necessário atravessar os mares, penetrar as nuvens ou transpor montanhas. Não é um caminho muito longo que te é proposto: basta entrar em ti mesmo para correr ao encontro de teu Deus”. Esperamos Alguém e por isto vigiamos e vigiar quer dizer orar! E orar é ser invadido pelo Espírito do Senhor para que possamos olhar o mundo, que é a matéria prima do Reino, com os olhos de Deus. O amor de Deus e a esperança do Homem se entrelaçam no coração do Advento para vingar a tenda nupcial: “Eu estava dormindo, meu coração vigiando, quando ouço meu amado que me chama: - Abre-me, amada minha, minha amiga, minha irmã, minha pomba sem mancha, pois tenho a cabeça orvalhada, meus cabelos, do sereno da noite” (Ct 5, 2). O Esposo e seu amor sempre nos surpreenderão: “vem à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao amanhecer”. Nestes tempos de espera vigilante, devemos fazer acontecer uma terceira vinda: a do cristão. A de homens e mulheres surpreendentes que rompem com um cristianismo irrelevante, banal, repetitivo e queixoso. Um cristianismo sonolento e impotente para despertar os que dormem e que repartem entre si os despojos do tédio e da desesperança. Precisaremos sempre, em todos os lugares e horas, de cristãos que testemunhem que os céus foram rompidos pelo seu compromisso de fazer vingar a justiça na terra. Cristãos que não temam o momento a vir e que, vigilantes e despertos, enfrentem a noite dos desesperados, fazendo-os  irromper à soleira da vida com suas faces banhadas pelo Sol Invencível.


CONTEMPLAR

Ia Orana Maria (Ave Maria), Paul Gauguin, 1891, óleo sobre tela, 113,7 x 87,6 cm, Atuona, Hiva Oa, Ilhas Marquesas, Polinésia.




segunda-feira, 14 de novembro de 2011

O Caminho da Beleza 53 - Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo

O Caminho da Beleza 53
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo                  20.11.2011
Ez 34, 11-12.15-17            1 Cor 15, 20-26.28                       Mt 25, 31-46


ESCUTAR

“Assim diz o Senhor Deus: Vede! Eu mesmo vou procurar minhas ovelhas e tomar conta delas” (Ez 34, 11).

“Na realidade, Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram. Pois é preciso que ele reine até que todos os seus inimigos estejam debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte” (1 Cor 15, 20.25-26).

“Em verdade eu vos digo, todas as vezes que não fizestes isso a um desses pequeninos, foi a mim que não o fizestes” (Mt 25, 45).


MEDITAR

“Porventura não está o mundo a ser devastado pela corrupção dos grandes, mas também dos pequenos, que pensam apenas na sua própria vantagem? Porventura não é ele devastado por causa do poder da droga, que vive, por um lado, da ambição de vida e de dinheiro e, por outro, da avidez de prazer das pessoas que a elas se abandonam?” (Bento XVI, Discurso na Konzerthaus, Freiburg, 25.09.2011).

“Cristo fala às multidões, mas dirige o seu olhar aos homens, um por um. Não opera conversões em massa, não conhece triunfalismos; é um Messias que não arrebata gentes. Pode mover-se de compaixão pelas multidões justamente porque não as considera aglomerados anônimos, mas sabe distinguir por entre elas cada rosto, cada drama” (Ettore Masina, O Evangelho segundo os anônimos, 1972).


ORAR

A parábola do Juízo Final é uma descrição grandiosa do veredicto derradeiro sobre a história humana. Nela estão presentes povos de todas as raças, religiões, culturas e lugares da terra habitada. Dois grupos emergem desta multidão: o dos que receberão a benção de Deus porque exerceram a sua compaixão com os mais necessitados e por eles fizeram o máximo que podiam. O outro grupo será convidado a se afastar de Deus porque foi indiferente ao sofrimento dos homens e mulheres que encontraram em seus caminhos. A parábola é explícita ao afirmar que o que vai decidir a sorte final de todos não é a religião sob a qual cada um viveu nem a fé que cada um professou. O que vai decidir a sorte de todos é uma vida de compaixão e solidariedade para com os que sofrem. A religião mais agradável a Deus é a que ajuda os que sofrem. Nesta parábola, não são pronunciadas as grandes palavras como “justiça”, “solidariedade”, “democracia”, pois nenhuma delas significa nada diante da situação real dos que sofrem.  Jesus fala de comida, de roupa, de algo para beber e de um teto para se abrigar. Nesta parábola, não se fala tampouco de “amor”. Jesus nunca usou uma linguagem abstrata, mas disse palavras concretas como comer, vestir, hospedar, acudir e visitar. Jesus, no entardecer das nossas vidas, não nos perguntará sobre o amor, mas nos questionará sobre os gestos concretos que fizemos diante das pessoas que necessitavam da nossa compaixão. Nenhuma religião, que não gerasse compaixão, foi abençoada pelo Pai de Jesus Cristo. O Juízo Final não será um dia espetacular e pirotécnico. Não devemos nos iludir, cada dia é o dia do nosso juízo final porque todo o dia, em cada momento, colocamo-nos em julgamento e quando cerrarmos os olhos será tarde demais para o juízo. O rosto do Cristo Rei não é o dos soberanos da Terra, mas o de um homem pobre, de uma mulher violentada, de uma criança desprezada e abandonada à sua própria sorte, de um velho mergulhado na sua angustiada solidão. O rosto do Cristo é o rosto acolhido e rejeitado sempre que acolhemos ou rejeitamos tantos rostos concretos que passam ao nosso lado pela vida. Jesus recebe o título de Rei na sua encarnação: “Onde está o rei dos judeus recém nascido?” (Mt 2,2). E atinge a maioridade deste título na hora mesma da sua Paixão ao ser indagado por Pilatos: “És tu o rei dos judeus?” ( Mt 27, 11). O Cristo se apresenta como pastor, pois o pastor dá a sua vida pelo rebanho, ao passo que o rei é defendido pelos súditos que devem morrer por ele. O templo do nosso Rei e o seu palácio são a miséria dos homens e mulheres e Ele está sempre à espera de que, na compaixão a eles, nos produzamos mais humanos e dignos do seu Reino. Cada pessoa é um ícone vivo no qual podemos reconhecer o Ressuscitado que se apresenta ao mundo como Alguém a quem alimentamos, damos de beber, acolhemos, vestimos, visitamos na prisão, nos hospícios e nos hospitais. Ele é como um mendigo que bate à porta do nosso coração e nos pede sempre, com a mão estendida, alguma coisa, pois no seu próprio despojamento quer ser nosso devedor. É preciso sempre ruminar o salmo “É teu rosto, Senhor, que eu procuro” (Sl 26, 8), para que encontremos a face de Deus nos que são considerados supérfluos e descartáveis e que apenas nos pediram e pedem um pouco de pão, um teto e algumas palavras de consolo e pequenos gestos de compaixão.


CONTEMPLAR

Cristo Rei do Universo, Letícia Cotrim, 2011, tecido sobre cartão, 21 x 32 cm, Rio de Janeiro, Brasil.






segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O Caminho da Beleza 52 - XXXIII Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 52
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



XXXIII Domingo do Tempo Comum                 13.09.2011
Pr 31, 10-13.19-20.30-31               1 Ts 5, 1-6                  Mt 13, 14-30


ESCUTAR

“Uma mulher forte, quem a encontrará? Ela vale muito mais do que as jóias... Proclamem o êxito de suas mãos e na praça louvem-na as suas obras” (Pr 31, 10. 19, 31).

“Vós mesmos sabeis perfeitamente que o dia do Senhor virá como ladrão, de noite” (1 Ts 5, 2).

“Porque a todo aquele que tem será dado mais, e terá em abundância, mas daquele que não tem, até o que tem lhe será tirado” (Mt 25, 29).


MEDITAR

“Sabemos que, unidos a Cristo, nos tornamos vinho generoso. Deus sabe transformar em amor mesmo as coisas pesadas e acabrunhadoras da nossa vida. Importante é permanecermos na videira, em Cristo” (Bento XVI, Homilia no Estádio Olímpico de Berlim, 22.09.2011).

“Deus exerce o seu poder de maneira diferente de como costumamos fazer nós, os homens. Ele próprio impôs um limite ao seu poder, ao reconhecer a liberdade de suas criaturas. Sentimo-nos felizes e agradecidos pelo dom da liberdade; mas, quando vemos as coisas tremendas que sucedem por causa dela, assustamo-nos. Mantenhamos a confiança em Deus, cujo poder se manifesta, sobretudo, na misericórdia e no perdão” (Bento XVI, Homilia no aeroporto de Freiburg, 25.09.2011).


ORAR

Somos chamados a não enterrar a vida e nem a esterilizá-la completamente. Somos chamados a romper a obsessiva preocupação com a segurança e a afirmar diante de todos a maravilha do risco de existir para transformar o mundo. Somos chamados para o seguimento de um Jesus comprometido e não para coexistir com uma fé sufocada pelo conformismo e pela indolência. O cristão se questiona sempre sobre o que semeia ao seu redor; a quem contagiamos com a esperança e como aliviaremos a angústia que faz sofrer nossos amados e amadas. Não somos chamados a conservar a Palavra em potes herméticos de vinagre e sal, mas proclamar a Boa Nova que, ao transformar vidas, introduz o Reino de Deus no mundo. O teólogo von Balthasar é enfático: “ Ninguém se converterá a Cristo porque existe um magistério, os sete sacramentos, um direito canônico, um clero, os núncios apostólicos ou um gigantesco aparato eclesiástico. Alguém se converte ao Cristo porque encontrou um cristão que, por meio da sua existência e exemplo, manifestou que é precisamente, no meio da vida que se dá um seguimento de Cristo digno de fé” (in Examinadlo todo y quedaos com lo bueno). A parábola de hoje faz eco a um provérbio africano que reza “Quem te ama te dá sementes” e Deus nos entrega um tesouro pessoal apesar dos nossos limites, faltas e defeitos. Somos convidados a gastar este tesouro saindo de nós mesmos, arriscando-nos no meio da vida e, desta maneira, participando da alegria do Senhor. Jesus nos deixa livres para aventurar a travessia e sermos fecundos. Existem os que empacam, enterram seus talentos, se emburrecem e vivem, literalmente, enfezados. Suas vidas passam despercebidas e melancólicas e a presença do Senhor é temida e transforma-se num fardo. A nossa fé nos garante que o Senhor nunca entrega nada a ninguém sem garantir os meios para que expanda e frutifique a sua doação. O cristão sabe que deve ousar o quanto puder, pois na fé e no amor não se calcula e nem se poupa para que não se perca tudo. O papa Bento XVI exorta: “Tenha a coragem de ousar com Deus! Tente! Não tenha medo Dele! Tenha a coragem de arriscar a fé! Tenha a coragem de arriscar a bondade! Tenha a coragem de arriscar o coração puro! Comprometei-vos com Deus. Então verás que, precisamente, por isso a tua vida se tornará grande e iluminada, não mais entediada, mas plena de infinitas surpresas, porque a bondade infinita de Deus jamais se esgota!”. Não existem lugares e nem situações fechadas para a presença cristã. O espetáculo mais deprimente é aquele no qual um cristão esconde seu talento, mascara a sua fé, dissimula a sua pertença a Cristo, sepulta a Palavra ou a utiliza para seus projetos mesquinhos. A maior deformação é a vileza de uma Igreja satisfeita que se isola para usufruir, contemplar e defender os talentos recebidos. O cristão comprometido com o anúncio da Boa Nova sabe que guardar não é o mesmo que semear. A Igreja não foi instituída para preservar os dons de Deus, mas para multiplicá-los para todos. Não podemos empacar as nossas vidas e a dos outros e fenecermos estanques no mesmo lugar. Como afirma Guimarães Rosa: “Burro só não gosta é de principiar viagens. As coisas acontecem é porque já estavam ficadas prontas, noutro lugar, no sabugo da unha; e com efeito tudo é grátis quando sucede, no reles do momento. O medo é a extrema ignorância em momento muito agudo”(Guimarães Rosa).


CONTEMPLAR

Meditação em país tibetano, Olivier Follmi, da coleção de fotografias “O Himalaia de Olivier Follmi”, www.follmi.com .