O Canto do Amor dos Amores
Padre Paulo
Botas, mts
Para Madre Belém, Madre
Chantal, Irmã Marta e Iya Stella de Oxóssi que testemunharam, em vida, este
cântico de amor e gozo.
“Ele, o artesão, faz dentro dela sua
oficina e ela, a tecelã, vai fiar nas malhas do seu ventre o homem de amanhã”.
(Milton Nascimento e Chico Buarque,
Primeiro de Mai0)
Orígenes, o grande mestre cristão de
Alexandria, no Egito, dizia: “feliz quem compreende e canta os cânticos da
Sagrada Escritura, porém bem mais feliz quem canta e compreende o Cântico dos
cânticos”.[1]
São Jerônimo, considerava o Cântico como um poema erótico e aconselhava que
fosse lido após os 60 anos de idade.
O Cântico dos Cânticos
possui, na língua hebraica, uma arquitetura numérica particular. É um múltiplo
de 9. São 117 versos, 1251 palavras e 5158 letras que se equivalem ao TEITH, a letra T em hebraico. Esta letra significa Terra Fértil, a fecundidade do feminino,
isto é, a regeneração permanente da vida. O Cântico está cravado, secretamente,
no mistério da feminilidade. Devemos compreender esta noção de fecundidade no
sentido simbólico da acolhida profunda do outro no jogo do amor e não no
sentido material da natalidade.
Para muitos autores contemporâneos, estes
poemas foram escritos por uma mulher ainda que sejam, tradicionalmente,
nomeados como os cantos de Salomão. O nome Salomão pode ser lido, em hebraico,
tanto no masculino como no feminino. Este rei, arquétipo masculino, representa
o que se procura em toda a aventura bíblica: a chegada de um novo masculino que
não seja a rejeição do feminino, mas a sua afirmação no sentido de uma abertura
ao outro, de sua acolhida e na partilha amorosa com ele. Como canta Gil: “Quem
dera pudesse todo homem compreender, ó mãe, quem dera, ser o verão o apogeu da
primavera e só por ela ser” (Super homem).
Para a tradição
hebraica, o Cântico dos Cânticos é percebido como sendo o Santo dos Santos, ou
seja, a própria essência do ser, o coração da vida: a presença de Deus que se
oferece às criaturas.
O Zohar, o
grande livro da Cabala judaico-espanhola do século XIII, que é a arte do
anagrama, afirma que a palavra Rêah
– perfume, fragrância, aroma – é um sinônimo da palavra Rûah – o sopro – e que a palavra Shemen, o óleo, é o anagrama da palavra Nesham, a respiração, o ser divino constituinte em cada pessoa.
O óleo perfumado simboliza a manifestação sutil do Ser divino que nos constitui
e cada vez que tomamos consciência do Ser divino estamos sob a unção do
Espírito.[2]
É um canto dos
laços nupciais assumidos na liberdade do dom e não dos laços matrimoniais
regrados por instituições de coerção social e religiosa. Um canto que nos
revela a dinâmica amorosa dos amantes em que seus corpos são oferecidos como
uma paisagem, que remete ao Jardim da Criação: fontes, árvores, frutos, flores,
campos, odores, sabores, etc. O Cântico nos ensina que o verdadeiro amor deseja
o reencontro e a união de duas plenitudes livres. Se o amor do casal consagrado
pela Lei é o pilar da sociedade judaica, o Cântico dos Cânticos é a legitimação
do impossível, ou seja, uma impossibilidade erigida em lei amorosa. A mensagem
do Cântico, como a do Evangelho, é a de que temos, verdadeiramente, a
responsabilidade de tornar o amor mais forte, apesar dos desprezos e
proscrições do mundo. [3]
O Cântico se
inicia com um beijo entre os dois amantes[4]: “Beija-me
com os beijos da tua boca (...) Sim, teus abraços me excitam mais que o vinho”
(Ct 1, 2,4.10). Este beijo faz nascer um mundo novo e o “sujeito amoroso vive
cada encontro com o ser amado como uma festa”[5]. O caráter único deste poema é o de descrever
o amor na sua encarnação erótica em contraste com toda a sua ideologização
religiosa. O poema não se reduz à exaltação passional dos amantes, pois a
erótica nunca deixa de se relacionar com a dimensão da transcendência porque o
encontro de amor supõe o encontro renovado com tudo o que foi criado.
Toda vez que o amor vem ao mundo é o
próprio mundo que vem novamente à luz e por esta razão o erotismo do Cântico é
privado do sentido de culpa, nem contagiado por um juízo moral e nem envenenado
pelo ressentimento. Ele é somente a alegria pura do encontro e do êxtase erótico
manifestando o esplendor da Criação. Sua tônica é sobre a embriaguez erótica
que restitui aos amados o que é melhor do que o vinho.
No livro d0 Gênesis,
a origem da mulher não é vinculada à necessidade da reprodução da espécie, nem
ao desejo genital no sentido estrito, mas a uma relação: sem a presença do
Outro a vida não é plenamente vida. O nascimento da mulher coincide com o
nascimento da relação, que, portanto, é um princípio essencialmente feminino.
Todo o poema do Cântico é, de fato, o desejo feminino a conduzir a dança do
encontro erótico e amoroso e neste encontro não temos como protagonista o gozo
fálico do corpo, mas a presença de um gozo ilimitado, sem apropriação. Um gozo
sem fim que não exige tanto a descarga orgástica, mas a posteridade infinita do
abraço, de um embriagar-se recíproco.[6]
O Cântico dos Cânticos não fala, como
os outros livros bíblicos, da luta do povo e nem dos problemas sociais. Fala de
uma maneira provocante do amor entre os amantes como o lugar privilegiado onde
Deus se revela e onde o ser humano experimenta algo da presença de Deus na
vida. A sua marca é a revelação de que a beleza da corporeidade vivida em sua
plenitude erótica é o caminho para a contemplação divina do Amor e de que a
relação pessoal amorosa é tão importante quanto a luta social. As duas se
entrelaçam, completam-se e se iluminam mutuamente e não podem ser separadas.
O erotismo do Cântico dos Cânticos é
o próprio erotismo da Presença Divina e seria impossível fazer aliança com ela
sem nos abrirmos ao seu sopro vital e ao seu desejo de nos esposar em núpcias
de ternura e gozo. É o Eros divino que funda o Eros humano e lhe confere sua
verdadeira amplitude e profundidade. O Papa Bento XVI, em sua Encíclica sobre o
amor, revela que é na vivência do amor erótico, da amizade e da fé no amor
fraterno que podemos vivenciar a sensualidade de um élan que ultrapassa
os limites do nosso ser individual para nos abrir aos outros e ao Outro. O
Cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do Conselho Pontifício da Cultura e
estudioso do Cântico, escreve: “O Cântico é, portanto o livro de todos os
homens verdadeiros, autênticos, que sabem amar”.
Parece-nos bastante insensata a
contínua oscilação que na história se verificou na leitura do Cântico: amor humano ou amor divino?
homem ou Deus? Nele um único amor entrelaça ambas as possibilidades. O amor do
Cântico é galhardamente humano, mas este amor humano tem em si uma semente
divina, é o paradigma para o conhecimento do “Deus que é amor” (1 Jo 4,8.16). O
amor é sinal de infinito; o ponto de partida do Cântico é terrestre e humano,
porém aberto ao espiritual e ao místico”.[7]
A mulher que
emerge neste Cântico pode ser associada às mulheres da unção nos Evangelhos que
também enfrentaram as proibições e reconheceram em Jesus o que as acolhia e as
libertava do medo, da angústia e do isolamento. A mulher do Cântico enfrenta
seus irmãos e se declara dona do seu próprio corpo para entregá-lo não mais
como mercadoria e moeda de troca, mas livremente e por amor: “Eu também
tenho uma vinha e faço dela o que quero” (Ct 8, 12). Na casa onde a amada mora, não se dá o amor. Lá moram o perigo e
as ameaças: os irmãos estão sempre dispostos a extorquir e a vender as suas
irmãs.
Naquele tempo o amor era visto como
mercadoria. As jovens eram vendidas para aumentar a reprodução em vista do
aumento de mão de obra para o trabalho. Os irmãos vendiam as suas irmãs e
quanto maior os seios tanto maior a capacidade de mercado. “Nós temos uma
irmãzinha que ainda tem seios pequenos. O que faremos por nossa irmãzinha
quando um rapaz quiser namorá-la?”. O defloramento devia ser impedido a
qualquer custo, pois reduziria o preço da mulher no comércio: “Se ela for
uma muralha, nós a defenderemos com uma torre de prata. Se ela for uma porta,
nós a reforçaremos com sarrafos de cedro”. A mulher grita contra
tudo isto e proclama o seu desejo fora do controle masculino: “Amor meu, minha vida, dizei-me onde irás
pastorear. Onde repousarás ao meio-dia? Não quero parecer uma prostituta a
andar vagando onde teus companheiros vão apascentar seus rebanhos” (Ct 1, 7).
O verdadeiro amor do Cântico só
poderá ser entregue num jardim, pois é no jardim que o amor tem mais encanto e
a nudez mais graça e beleza. É num jardim que se dá o encontro de Madalena com
o Ressuscitado. A casa, a alcova e a cama limitam os contornos do amor e a
corporeidade não conhece limites, pois colocar limites é impedir o conhecimento
extático do Deus Inefável: “Em meu leito, na noite, procuro o amor da minha vida”
(Ct 3, 1).
O Verbo se fez
carne e é nesta encarnação do belo que o livro do Cântico canta as belezas dos
corpos da amada e do amado: “São pombas teus olhos escondidos sob o véu, os
seus cabelos ondulados são como um rebanho de cabras, os seus dentes são
brancos como ovelhas com a lã cortada, que acabaram de ser lavadas, as curvas
dos teus quadris são como joias, são trabalho de um artista. O seu umbigo é uma
taça onde não falta vinho, a sua cintura é como um feixe de trigo cercado de
lírios, os seus seios parecem duas crias gêmeas de uma gazela que se apascentam
entre as açucenas. Tua cabeça se eleva como o monte Carmelo, os teus cachos de
cabelo fluem como a purpura e um rei está preso em tuas tranças. Teus lábios
são favos de mel escorrendo e tua língua é para mim como leite e mel” (Ct
4,1.7, 6).
A corporeidade do amado também é enaltecida:
“Sua cabeça é ouro puro, os seus cabelos são compridos, ondulados e
pretos como as penas de um corvo, os seus olhos são como os olhos das pombas na
beira de um riacho; pombas brancas como leite banhando-se ao lado da
correnteza, seus lábios são como lírios que deixam cair pingos de mirra
preciosa. A sua cintura é como marfim polido, coberto de safiras, as suas
pernas são colunas de mármore assentadas sobre bases de ouro puro. É doce
beijar a sua boca e tudo nele me excita. Ele é todo uma delícia. O meu amante
mete a sua mão na fenda e minhas vísceras tremem por ele” (Ct 5, 4).
O arrebatamento
pela beleza corporal, transformado em poema, testemunha que só na entrega da
intimidade amorosa pode-se compreender que não há erótica sem poesia e que não
há melhor suporte para a poesia do que o próprio corpo. A entrega amorosa se
faz na primavera: brotam as flores, não há chuvas, as vinhas exalam perfumes,
as rolas arrulham e há um mistério nas grutas dos barrancos. É a temporada do
amor, da floração e da fecundação: “Venha amado, vamos para o campo; vamos
passar a noite nas plantações de uvas. Vamos levantar cedo e olhar as
parreiras, para ver se elas já começaram a brotar. Veremos se as flores estão
se abrindo e se as romãzeiras já estão em flor. Ali eu lhe darei o meu amor”.
E segue o diálogo entre os amantes: “Como você é linda, minha amada!
Como você me dá prazer! Você é tão graciosa como uma palmeira; os seus seios
são como cachos de tâmaras. Vou subir na palmeira e colher os seus frutos. Os
seus seios são para mim como cachos de uva. Suas nádegas são como almofadas perfumadas
e seu púbis pétalas de lótus que gotejam mirra. Tua virilha uma cesta de grãos
enfeitada de flores de lótus. A sua boca tem o perfume das maçãs e os seus
beijos são como vinho delicioso (Ct 6,13 ss).
“Então que o meu querido beba suavemente deste
vinho que escorre entre seus lábios e dentes. Na fenda, toda suculenta, os meus
frutos deliciosos e novos estão guardados para ti. Tu me iniciarás no amor. Te
farei beber vinho aromático d0 suco da minha romã. Eu sou do meu amado e ele me
quer”.
Contemplar a beleza do amor é
realizá-lo assim como Deus contemplou a beleza de sua obra ao fazê-la. Os
místicos são os que conhecem o arrebatamento erótico desta entrega absoluta ao
amor, desta experiência nupcial livre porque amorosa. Santa Clara (1194-1242)
exclamava inspirada no Cântico: “Arrasta-me atrás de ti. Corramos no odor
suave dos teus bálsamos, ó Esposo Celeste! Vou correr sem desfalecer, até me
introduzires na tua adega, até que tua mão esquerda esteja sobre minha cabeça,
tua mão direita me abrace toda com ternura e me dês o beijo mais feliz de tua
boca”.
Santa Teresa
d’Ávila (1515-1582) viveu profundamente a erótica do arrebatamento. Escrevia no
seu Livro da Vida, capítulo XXIX: “Vi em suas mãos [do Anjo] um dardo de
ouro e no fim do ferro me parecia ter um pouco de fogo. Parecia que este o
penetrava pelo coração, algumas vezes, e me chegava às entranhas. Ao tirá-lo,
parecia que as levava todas consigo e me deixava toda abrasada no grande amor
de Deus. Era tão grande a dor, que me fazia dar aqueles gemidos; e tão
excessiva é a suavidade que põe esta grandíssima dor que não há que se desejar
que me deixa. Não é dor corporal, mas espiritual, ainda que não deixe de
participar, fartamente, algo do corpo. É um galanteio, um requebro tão suave
que se passa entre a alma e Deus, que suplico À sua bondade, que o faça
experimentar a quem pensar que minto”.
Quando nasce o Eros, nasce a vida e
os movimentos carregados da rotina cotidiana se transformam numa existência em
festa pela reciprocidade da relação. Se com o gosto do amor nós tocamos a vida,
toda a crispação sobre o eu e toda falta de amor é uma escolha de morte. Uma
morte amadurecida no sepultamento de uma vida solitária.
Eros é a paixão da vida feita núpcias e a
institucionalização deste Eros é o enquadramento da liberdade no matrimônio
necessário, como expressão da posse, da apropriação e da propriedade do outro.
Não é fortuito que temos codificado a relação matrimonial pelas regras do
direito, pois a lei consolida a exigência do direito natural e reivindica até a
conduta dos desejos.
Somente o Eros
anuncia a Boa Nova da imortalidade pessoal: o êxtase fora das possibilidades
existenciais da natureza, a consumação da existência pela comunhão amorosa. O
Eros muda a existência numa vida livre de qualquer constrangimento e limitação,
pois o próprio Deus é como a realização de uma união amorosa na Trindade: Deus
é Amor!
O grão de trigo
da individualidade humana deve cessar de querer existir por si mesmo; deve
esgotar a existência da vida, não pelo desejo de ser autônomo, mas pelo dom
amoroso, o dom de si mesmo. O homem deve se tornar uma existência amorosa kenótica - que se despoja de si mesmo – assim
como Deus é uma pericorése, uma dança
de três pessoas que se dão, uma à outra, reciprocamente e ao mesmo tempo,
despojando-se do que são.[8]
No Cântico dos
Cânticos, o Eros humano mostra a face de um amor sempre em busca e quase nunca
satisfeito. E o eco desta inquietude percorre as estrofes do poema: “O meu
amado se foi. Procuro-o e não o encontrei”. O amor se mostra maior do que o
corpo pode e é capaz de exprimir. A fragilidade corporal em que se inscreve o
amor é revelada pela Amada que carrega o amor de ambos: “Estou doente e
desfalecida de amor”. As núpcias de amor, a união numa só carne, significam
que nesta comunhão não há uma fusão e uma perda da individualidade. No abandono
de si ao outro é que nos encontramos no Outro e na nossa solidão original e
singular somos cada vez mais o que somos aos olhos do Amor.
O Cântico dos Cânticos não é uma carta branca,
como poderiam pensar os puritanos de plantão, para o desenfreio sexual. O
Cântico leva a sério a personalização do amor e, por esta razão, nos salva da
massificação, da banalização, pois já não mais entendemos a poesia do amor e,
desta forma, não nos entendemos a nós mesmos. O nosso empobrecimento afetivo
tem nos conduzido ao embrutecimento em todos os campos da vida cotidiana.[9]
Nada de humano
é estranho na Bíblia e o amor é a poesia de ver no outro o que está aberto ao
divino, pois a força do amor é ver o outro sob a sua forma divina.
Os que se amam
fazem juras de amor e súplicas: “Grava-me como selo em teu braço, como selo
em teu coração, pois o amor é forte como a morte, a paixão é cruel como o
abismo; é centelha de fogo, labaredas divinas; as águas torrenciais não poderão
apagar o amor, nem os rios afogá-lo. Se alguém quisesse comprar o amor com
todas as riquezas de sua casa se tornaria desprezível”.
Neste pedido,
que cada um dos dois amantes recorre ao Outro, não devemos ver um apelo de
recíproca apropriação. Não se trata de marcar o corpo como se um nome
ratificasse a propriedade. O amor exaltado no Cântico transcende,
definitivamente, toda referência à vida conjugal ou familiar.
Não há parte do
corpo fragmentada, e suas diferenças são cantadas na sua beleza e poesia. Mas,
também, a poesia e a beleza cantam o que lhes é comum no seu corpo de amor.
Nosso falso pudor esconde o que, também, são partes divinas da criação amorosa
Deus.
“A bunda,
que engraçada, está sempre sorrindo, nunca é trágica(...) Anda por si na
cadência mimosa, no milagre de ser duas em uma plenamente(...)Lá vai sorrindo a
bunda. Vai feliz na carícia de ser e balançar. Esferas harmoniosas sobre o
caos. A bunda é a bunda, redunda” (Carlos Drummond de Andrade).
O tiro de
misericórdia, nos moralistas de plantão, será desferido por uma mulher,
católica convicta, mineira e com muitos prêmios literários: “De tal ordem é
e tão precioso o que devo dizer-lhes que não posso guardá-lo sem que me oprima
a sensação de um roubo: cu é lindo! Fazei o que puderes com esta dádiva. Quanto
a mim dou graças pelo que agora sei, e mais que perdôo, eu amo” (Adélia
Prado).
Em todo enredo amoroso, as bocas que
se beijam partilham e comungam num único sopro – alento de Deus – e recriam o
mistério do encontro e da fusão dos corpos amados numa só carne e num só
coração sem, em nenhum momento, perder a sua originalidade e singularidade.
Como nos ensina o ZOHAR: “Pelo beijo, os amantes trocam seus espíritos, e
por isso o beijo se dá na boca, fonte do espírito. Quando os espíritos de dois
amantes se reencontram num beijo, boca a boca, estes espíritos não se separam
nunca mais um do outro”.[10]
O poeta Salman Sheurn (1887-1980)
vaticina: “Sabe quando nos beijamos? Quando o coração não pode mais ser distinguido
do coração do outro, quando peito a peito nenhum de nós sabe qual dos dois
respira, quando material e imaterial desaparecem e apenas sobra um único sopro,
quando não existem mais palavras, mas apenas a linguagem dos olhos: esse é o
beijo”.
Assim poderemos, finalmente, cantar:
“YÎCHÂQÉNÎ MÎNNCHÎQÔTH PÎHOU”
BEIJA-ME
COM OS BEIJOS DE SUA BOCA!” (Ct 1, 2).[11]
Ano do Jubileu de 2025
Bibliografia
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Le Zohar, Cantique des cantiques,
Paris, Éditions Verdier, 1999.
*************************************************
[1]
Citado em prefácio de Gianfranco Ravasi, Cantico
dei cantici, Milão Ed. Pauline, 1985, p.6.
[2] Le
Zohar, Cantique des cantiques, Paris,
Éditions Verdier, 1999.
[3]
Pierre Trigano & Agnés Vincent, Le
Cantique des cantiques ou la psychologie mystique des amants, Lyon, Reel
Editions, 2007.
[4] Todas
as citações a seguir no texto do Livro do Cântico dos Cânticos são da última
edição da Bíblia italiana organizada por Enzo Bianchi, Biblia, Torino,
Einaudi, 2021, 3v., tradução livre.
[5] Roland Barthes, Frammenti di um discorso
amoroso, Einaudi, Torino,1979, p.66.
[6]
Massimo Recalcati, La legge de la parola,
Torino, Einaudi, 2023.
[7]
Ravasi, Cantico dei cantici.
[8]
Christos Yanarras, Variations sur le
Cantiques des Cantiques, Paris, DDB, 1992.
[9]
Eugen Drewermann, La palavra de salvacion
y sanación, Barcelona, Herder, 1996.
[10]
Zohar, Cantique des cantiques, p. 66.
[11] Podemos ler a expressão Yîshâqéni como “que ele me beije”, ou ainda Yîsaqénî “que ele me ilumine”. Os amantes proclamam, nesta oração de
súplica, que o Eros que os ilumine seja Deus, pois não desejam viver o seu
desejo fora desta fonte de vida. Citado em Trigano & Vincent, Le Cantique des cantiques, p.68.
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