segunda-feira, 29 de outubro de 2018

O Caminho da Beleza 50 - Solenidade de Todos os Santos e Santas


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

Solenidade de Todos os Santos e Santas              04.11.2018
Ap 7, 2-4.9-14                    1 Jo 3, 1-3                Mt 5, 1-12

ESCUTAR

“Esses são os que vieram da grande tribulação. Lavaram e alvejaram as suas roupas no sangue do Cordeiro” (Ap 7, 14).

Vede que grande presente de amor o Pai nos deu: de sermos chamados filhos de Deus! (1 Jo 3, 1).

“Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus” (Mt 5, 10).


MEDITAR

Todo santo não é essencialmente para si mesmo, mas sim para Deus e para seus irmãos. Um santo que trabalha para conseguir sua própria santidade seria uma contradição em si. Não estaria inflamado pelo fogo de Deus, que é sempre amor que purifica, mas seria iluminado por seu próprio fogo que, em última instância, só pode ser tirado do inferno.

(Hans Urs von Balthasar, 1905-1988, Suíça)


ORAR

Santidade é parresia: é ousadia, é impulso evangelizador que deixa uma marca neste mundo. Para isso ser possível, o próprio Jesus vem ao nosso encontro, repetindo-nos com serenidade e firmeza: “Não tenhais medo!” (Mc 6, 50). “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28, 20). Essas palavras permitem-nos partir e servir com aquela atitude cheia de coragem que o Espírito Santo suscitava nos Apóstolos, impelindo-os a anunciar Jesus Cristo. Ousadia, entusiasmo, falar com liberdade, ardor apostólico: tudo isso está contido no termo parresia, uma palavra com que a Bíblia expressa também a liberdade de uma existência aberta, porque está disponível para Deus e para os irmãos... Olhemos para Jesus! A sua entranhada compaixão não era algo que o ensimesmava, não era uma compaixão paralisadora, tímida ou envergonhada, como sucede muitas vezes conosco. Era exatamente o contrário: era uma compaixão que o impelia fortemente a sair de si mesmo a fim de anunciar, mandar em missão, enviar a curar e libertar. Precisamos do impulso do Espírito para não ser paralisados pelo medo e o calculismo, para não habituarmos a caminhar só dentro de confins seguros. Lembremo-nos disto: o que fica fechado acaba cheirando a mofo e criando um ambiente doentio. Quando os apóstolos sentiram a tentação de deixar-se paralisar pelos medos e perigos, juntaram-se a rezar pedindo parresia: “Agora, Senhor, olha as ameaças que fazem, e concede que os teus servos anunciem corajosamente a tua palavra” (At 4, 29). E a resposta foi esta: “quando terminaram a oração, tremeu o lugar onde estavam reunidos. Todos ficaram cheios do Espírito Santo e anunciavam corajosamente a Palavra de Deus” (At 4, 31). É verdade que precisamos abrir a porta a Jesus Cristo, porque Ele bate e chama (Ap 3, 20). Mas, pensando no ar irrespirável da nossa auto-referencialidade, pergunto-me se, às vezes, Jesus não estará já dentro de nós, batendo para que o deixemos sair. Deixemos então que o Senhor venha despertar-nos, dar um solavanco na nossa sonolência, libertar-nos da inércia. Desafiemos o comodismo, abramos bem os olhos, os ouvidos e, sobretudo, o coração, para nos deixar mover pelo que acontece ao nosso redor e pelo clamor da Palavra viva e eficaz do Ressuscitado.

(Francisco, 1936-, Gaudete et Exultate, Roma, Vaticano)


CONTEMPLAR

Denis Mukwege, 2018, médico congolês que atendeu mais de 30 mil vítimas de abuso sexual, Prêmio Nobel da Paz de 2018, Safin Hamed, Agence France Press, Iraque.




terça-feira, 23 de outubro de 2018

O Caminho da Beleza 49 - XXX Domingo do Tempo Comum


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

XXX Domingo do Tempo Comum              28.10.2018
Jr 31, 7-9                 Hb 5, 1-6                 Mc 10, 46-52


ESCUTAR

“Eles chegarão entre lágrimas e eu os receberei entre preces” (Jr 31, 9).

Cristo não se atribuiu a si mesmo a honra de ser sumo sacerdote (Hb 5, 5).

“Vai, a tua fé te curou” (Mc 10, 52).


MEDITAR

A Palavra de Deus é capaz de dar provas de autenticidade pelo seu poder transformador que opera uma invasão de amor, unidade, paz, compreensão mútua e liberdade, onde havia antes preconceito, conflito, ódio, divisão e ganância.

(Thomas Merton, 1915-1968, Estados Unidos)


ORAR

            O relato de Marcos não nos descreve apenas a cura de um cego nos arredores de Jericó. É, além disso, uma catequese elaborada com mão de mestre, que nos convida à mudança e nos incita à conversão. A situação de Bartimeu está descrita com traços muito bem elaborados. Ele é um homem cego, ao qual falta luz e orientação. Um homem sentado, incapaz de caminhar atrás de Jesus. Um homem à beira do caminho, desencaminhado, fora do caminho seguido pelo Mestre de Nazaré. O relato nos revelará, no entanto, que neste homem existe ainda uma fé capaz de salvá-lo e pô-lo novamente no verdadeiro caminho. “Recuperou a vista e o seguia pelo caminho”. Quase sempre existe um momento na vida no qual se torna penoso continuar caminhando. É mais cômodo instalar-nos no conformismo. Assentar-nos naquilo que nos dá segurança e fechar os olhos a todo outro ideal que exija de nós sacrifício e generosidade. Mas então algo morre em nós. Já não vivemos a partir de nosso próprio impulso criador. O que vive em nós é a moda, a comodidade ou o “sistema”. Renunciamos a crescer como pessoas. Quantos homens e mulheres se instalam assim na mediocridade, renunciando às aspirações mais nobres e generosas que despertam em seu coração! Não caminham. Sua existência fica paralisada. Vivem apegados ao essencial, sem olhos para conhecer aquilo que poderia dar nova luz à sua vida. É possível alguém reagir quando se instalou na rotina e na indiferença? Pode alguém libertar-se dessa vida “programada” para a comodidade e o bem-estar? Esta é a boa notícia de Jesus: dentro de cada um de nós existe uma fé que pode levar-nos a reagir e colocar-nos novamente no caminho verdadeiro. Não temos outra vida de reposição. Agora mesmo estamos sendo chamados a viver, a caminhar, a crescer. O evangelho tem força para fazer-nos viver uma vida mais intensa, verdadeira e jovem. Recordemos as palavras de Georges Bernanos: “Sois capazes de rejuvenescer o mundo, sim ou não? O evangelho é sempre jovem. Vós é que estais velhos”.

(José Antonio Pagola, 1937-, Espanha)


CONTEMPLAR

Stokes, 2012, Vicent Louis Carrella (1965-), The Light House Photography, Estados Unidos.





segunda-feira, 15 de outubro de 2018

O Caminho da Beleza 48 - XXIX Domingo do Tempo Comum


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

XXIX Domingo do Tempo Comum             21.10.2018
Is 53, 10-11             Hb 4, 14-16             Mc 10, 35-45


ESCUTAR

Por esta vida de sofrimento, alcançará luz e uma ciência perfeita (Is 53, 11).

Irmãos, temos um sumo sacerdote eminente, que entrou no céu, Jesus, o Filho de Deus (Hb 4, 14).

Tiago e João, filhos de Zebedeu, foram a Jesus e lhe disseram: “...Deixa-nos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda quando estiveres na tua glória!” (Mc 10, 35.37).


MEDITAR

Abbá Agathon dizia: “Se pudesse encontrar um leproso a quem doar meu corpo para tomar o dele, ficaria contente, pois tal é a caridade perfeita”.

(Sentenças dos Padres do deserto, séculos 3-4)


ORAR

A resposta que Jesus fez ao nossos dois impetrantes é mais desconcertante ainda, porque, longe de estigmatizar severamente, como se esperaria, seu topete e sua ingenuidade, ela, por sua vez, coloca rapidamente a questão nos seus termos; uma vez que, longe de explicar uma suposta nomenclatura, ela lança as palavras – e o homem por inteiro – à beira de um abismo: Podeis beber? Eles falavam seriamente em certeza, instituição, hierarquia (eclesiástica já, sobretudo) e eis que ele lhes canta um banquete; eles aspiravam a um conforto (deixa-nos sentar) e ele lhes faz incorrer num risco; eles esperavam uma segurança e ele lhes propõe uma vertigem; eles se contentavam com uma simples justaposição e eis que, desprezando toda a higiene, ele lhes oferece uma promiscuidade, pela bebida e pelo banho; eles careciam da respeitabilidade de vidas paralelas e ele lhes fala, ele, de uma causa comum, de uma vida comum e de uma morte comum, a acontecer. Eles se afetavam por títulos e ele preparava, antes deles, suas capacidades fora do comum e, não obstante, destinadas a todo o mundo. Podeis beber o cálice que eu vou beber? Jesus é um bebedor, um grande bebedor: é de conhecimento público, ao menos entre seus inimigos que não se cansavam de dizer (Mt 11, 19). Ele bebe água, sem dúvida, mas barganha por ela próximo a uma mulher perigosa: Dá-me de beber! (Jo 4, 7). Ele bebe vinho, mas grand cru, pois ele o mistura pessoalmente. Ele bebe vinagre, por fim. Ele bebe o sofrimento, a humilhação, ele sorve, ele deglute a morte mesma, se bem que a morte é absorvida em sua vitória (1 Cor 15, 54). Ardente bebedor, ele absorve as grandes águas da morte... E não contente em beber, ele convida generosamente a beber com ele, melhor ainda, ele se apresenta a ele mesmo, ele exorta a ele mesmo como a única bebida capaz de saciar: Se alguém tem sede, que venha a mim e beba! (Jo 7, 37).

(François Cassingena-Trévedy, 1959-, França)


CONTEMPLAR

Meu irmão é mesquinho, 2010, Lula Lola (1970-), Estados Unidos.




segunda-feira, 8 de outubro de 2018

O Caminho da Beleza 47 - XXVIII Domingo do Tempo Comum


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

XXVIII Domingo do Tempo Comum                     14.08.2018
Sb 7, 7-11                 Hb 4, 12-13             Mc 17-30


ESCUTAR

Preferi a sabedoria aos cetros e tronos e, em comparação com ela, julguei sem valor a riqueza (Sb 7, 8).

A Palavra de Deus é viva, eficaz e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes (Hb 4, 12).

Jesus olhou para ele com amor e disse: “Só uma coisa te falta: vai, vende tudo o que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me!” (Mc 10, 21).


MEDITAR

Eu vejo com os olhos de Cristo e posso dar ao outro muito mais do que as coisas externamente necessárias: posso dar-lhe o olhar de amor de que ele precisa.

(Bento XVI, Deus Caritas Est, Roma/Alemanha)


ORAR

            Um homem de bem se aproxima de Jesus, cai de joelhos, o interroga – com uma certa ansiedade: “Bom Mestre, que se deve fazer para obter a vida eterna?” (Mc 10, 17). A resposta de Jesus fê-lo voltar-se inicialmente a suas próprias palavras, aos seus valores e o questiona sobre a sua verdade. Quando me chamas “bom” a que, a quem te diriges? Reconheces aqui a Bondade Absoluta, aquela mesma de Deus? Sabes o que dizes? Qual o sentido profundo da tua pergunta: queres simplesmente te certificar do valor das estruturas religiosas nas quais estás situado? Neste caso, conheces os mandamentos?...Então Jesus, continua o evangelho, “tendo-o olhado, amou-o e lhe disse: uma só coisa te falta” (10, 21). É preciso deter-se um momento no caráter muito pessoal deste olhar e deste diagnóstico. Trata-se, em primeiro lugar, de um encontro, o encontro de dois olhares, e de um conhecimento novo que se desperta nesta troca. Mas bruscamente qualquer coisa surge de radicalmente novo. Nós somos envolvidos num evento muito concreto, testemunhas de um encontro e de um diálogo vivos, atendendo a um convite pessoal para arriscar o dom total como resposta ao amor de um olhar. Apenas uma coisa TE falta... Jesus afirma assim o conhecimento íntimo que ele tem deste coração inquieto. Ele sabe sua divisão, ele conhece seus laços: o que te falta é te libertares, abandonado tudo aquilo que, ao mesmo tempo, te tranquiliza e te aprisiona. Falta a ti conhecer o impulso do risco e a alegria da partilha. “Vai, vende tudo que tens e o dá aos pobres” (10, 21). Olhar do Cristo que penetrou Zaqueu encolhido no seu refúgio da árvore e lhe deu a liberdade de se desfazer de seus bens equívocos. Apelo que fisgou Levi-Mateus de sua mesa de cambista... Pela perspicácia deste olhar, o jovem rico é posto a nu em sua pobreza, mas, ao mesmo tempo, esta pobreza lhe é revelada como um vazio de amor e justamente por Aquele, o único que tal vazio pode encher.

(Bible et Vie Chrétienne, França)


CONTEMPLAR

Mão de Homem, 2016, Ialesh Aldarwish, Mönchengladbach, Alemanha.




segunda-feira, 1 de outubro de 2018

O Caminho da Beleza 46 - XXVII Domingo do Tempo Comum


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

XXVII Domingo do Tempo Comum                       07.10.2018
Gn 2, 18-24             Hb 2, 9-11               Mc 10, 2-16


ESCUTAR

O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne (Gn 2, 24).

Jesus, a quem Deus fez pouco menor do que os anjos, nós o vemos coroado de glória e honra, por ter sofrido a morte (Hb 2, 9).

“Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés vos escreveu esse mandamento” (Mc 2, 5).


MEDITAR

O amor, inclusive o amor sexual, compartilhado por um casal em um relacionamento os une em comunhão, e essa comunhão compartilhada reflete a comunhão da Trindade, aproxima-os mais ainda de Deus, fortalece seu relacionamento e transborda para todos os seus demais relacionamentos. De uma maneira mais profunda, essa comunhão sexual sempre gera uma nova vida, exatamente como a comunhão amorosa entre o Pai e o Filho gera o Espírito.

(Todd A. Salzman, & Michael G. Lawler, 1933-, Estados Unidos)


ORAR

            Ao homem faltava algo para chegar à sua plenitude, faltava-lhe a reciprocidade. A mulher não é uma “réplica” do homem; ela vem diretamente do gesto criador de Deus. A imagem da “costela” não exprime, de fato, inferioridade ou subordinação, mas, ao contrário, que homem e mulher são da mesma substância, são complementares e têm também essa reciprocidade. E o fato de que Deus plasme a mulher enquanto o homem dorme salienta exatamente que ela não é de modo algum uma criatura do homem, mas de Deus. Sugere também uma outra coisa: para encontrar a mulher – e podemos dizer para encontrar o amor da mulher -, o homem primeiro deve sonhá-la e, depois, a encontrar. O matrimônio consagrado por Deus protege o vínculo entre o homem e mulher que Deus abençoou desde a criação do mundo, e é fonte de paz e de bem para a inteira vida conjugal e familiar. Por exemplo, nos primeiros tempos do Cristianismo, essa grande dignidade do vínculo entre o homem e a mulher derrubou um abuso considerado então de todo normal, ou seja, o direito de os maridos repudiarem as mulheres, mesmo com os motivos mais despropositados e humilhantes. O Evangelho da família, o Evangelho que anuncia exatamente esse Sacramento, derrubou essa cultura de repúdio habitual. A semente cristã da igualdade radical entre os cônjuges deve atualmente trazer novos frutos. O testemunho da dignidade social do matrimônio se tornará persuasivo exatamente por essa via, a via do testemunho que atrai, a via da reciprocidade entre eles, da complementaridade entre eles. A aliança de amor entre o homem e a mulher, aliança para a vida, não se improvisa, não se faz de um dia para o outro. Não há o matrimônio “express”: é preciso trabalhar sobre o amor, é preciso caminhar. A aliança de amor do homem e da mulher aprende-se e afina-se. Permito-me dizer que é uma aliança artesanal. Fazer de duas vidas uma única vida é também quase um milagre, um milagre da liberdade e do coração, confiado à fé.

(Papa Francisco, 1936-, Argentina/Roma)


CONTEMPLAR

Dia da Independência, 4 de julho de 1971, Aspen, Colorado, Estados Unidos, Henri Cartier-Bresson (1908-2004), Magnum Photos, Paris, França.