segunda-feira, 30 de junho de 2014

O Caminho da Beleza 33 - XIV Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 33
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XIV Domingo do Tempo Comum                06.07.2014
Zc 9, 9-10                Rm 8, 9.11-13                    Mt 11, 25-30


ESCUTAR

“Eis que vem teu rei ao teu encontro; ele é justo, ele salva; é humilde e vem montado num jumento, um potro, cria de jumenta” (Zc 9, 9).

“Se alguém não tem o Espírito de Cristo, não pertence a Cristo” (Rm 8, 9).

“Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondestes estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11, 25).


MEDITAR

Eu não quero Senhor nem ouro nem prata... Eu não procuro Senhor nem prazeres, nem a alegria deste mundo... Eu não peço honras... Dai-me teu Espírito Santo, para que ele ilumine meu coração, fortifique-me e me console em minha angústia e em minha miséria (Martinho Lutero).

“O homem jovem conhece a carne, o homem amadurecido conhece o coração” (Provérbio Massango, Gabão).


ORAR

O Senhor vem montado num jumento e não é um rei guerreiro como o esperado. São os reis que fazem ostentação de poder e se impõem pelas armas. Jesus é manso, pacífico, humilde, mas quando desce do jumento é um deus nos acuda: é invadido por um furor sagrado e desencadeia um alvoroço no átrio do Templo. Ele é um sinal de contradição. Algumas vezes fala de sua missão como espada, fogo, jugo, sal que queima e suas palavras ao invés de carícias, parecem pedradas. Outras vezes usa palavras tão meigas que parecem açucaradas. Aquele que usa o chicote também se apresenta como manso e humilde. Jesus testemunha que a doçura não é uma caraterística de pessoas passivas. Os plenos de ternura são dotados de uma robusta espinha dorsal e mantêm a sua capacidade de indignar-se diante de situações intoleráveis. O manso e humilde não é um resignado, um impotente, incapaz de afrontar os desafios árduos que dele exigem uma posição inequívoca. Se não estivermos prontos a gritar e a nos queimar por dentro de ternura ou indignação, nunca poderemos falar de mansidão e doçura. Não existe doçura sem força e somente o não-violento é forte. Os verdadeiros senhores do mundo são os consumidos pela ternura e os que recebem, como dom, a plenitude da vida. Os cansados e fatigados convidados por Jesus são os sobrecarregados com o peso de leis interpretadas por uma visão rigorista; são desprezados pelos moralistas religiosos e guardiões da intolerância que deformam a imagem de Deus ao desfigurar os homens e mulheres submetidos ao seu jugo. Jesus nos apela a sermos despenseiros da misericórdia e da generosidade que desbloqueiam as consciências e as libertam. A ternura é a única conquista da qual é lícito gabar-se e o único motivo de orgulho compatível com a humildade. A oração de Jesus é, antes de mais nada, um cântico dos pequenos e pobres que revela os segredos do seu coração. A oração é vida segundo o Espírito e por ela a religião de preceito e da obrigação é substituída pela fé no amor de Deus. Meditemos as palavras de São Bernardo de Claraval no seu sermão sobre o Cântico dos cânticos: “A esposa diz que seu amado é um simples ramalhete de mirra e por seu amor ela está pronta a considerar leve todo o sofrimento. Para mim que amo é um punhado de flores, pois a força do amor vence as dores mais atrozes” (Sermão sobre o Cântico 46, 1).


CONTEMPLAR

Cristo escarnecido por um soldado, Carl Bloch, 1880, óleo sobre tela, Copenhagen, Dinamarca.



segunda-feira, 23 de junho de 2014

O Caminho da Beleza 32 - São Pedro e São Paulo

O Caminho da Beleza 32
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



São Pedro e São Paulo                         29.06.2014
At 12, 1-11                2 Tm 4, 6-8.17-18                        Mt 16, 13-19


ESCUTAR

“Levanta-te depressa!” (At 12, 7).

“O Senhor me libertará de todo mal e me salvará para o seu reino celeste” (2 Tm 4, 18).

“Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo” (Mt 16, 16).


MEDITAR

“Não é a crença que faz o homem, são os seus atos. Quando eu encontro alguém novo, não me pergunto sobre sua religião, sua prática ou seus ritos. Eu procuro saber quais são as relações que ele mantém com seus irmãos” (Soeur Emmanuelle).

“Há que pensar um pouco nos outros, há que trabalhar um pouco pelos outros. O que nos diria Deus se chegássemos até Ele uns sem os outros?” (Charles Péguy).


ORAR

A confissão de Pedro não exige nenhum cenário particular, nenhuma instituição e nenhum templo: ela se faz na precariedade e na urgência. Cesaréia está e estará em todos os lugares e a Igreja de Jesus sempre será confrontada com a mesma pergunta: “E vós quem dizeis que sou?” Jesus não deseja igrejas que apenas O recitem, mas que O confessem com palavras e gestos samaritanos. A confissão de Pedro não é uma lição de catecismo, mas um grito inspirado pelo Espírito Santo: “Meu coração e minha carne são um grito inspirado pelo Espírito Santo” (Sl 83, 3). Paulo confirma o salmista: “Ninguém pode dizer: Senhor Jesus! Se não é movido pelo Espírito Santo” (1 Cor 12, 3). Jesus não suporta nenhuma adesão à mentira deste mundo de aparências daqueles que “gostam de passear com longas túnicas, que os saúdem pela rua, dos primeiros assentos nos templos e dos melhores lugares nos banquetes” (Mc 1, 39). Ele apela para que renunciemos a encerrar Deus num sistema de crenças que nos leva a disputas para podermos nos abrir à miséria dos que são considerados pecadores e colocados à margem da comunidade eclesial. Jesus nos dá um exemplo extremamente intenso do que é viver na contínua presença do amor, do que é viver no único tempo verbal em que se pode estar com Deus: o presente. Nesta festa de hoje reconhecermo-nos católicos é vivermos o sentido literário de kath’holon – uns com os outros – ou seja, a comunhão universal do Reino. A Igreja de Jesus deve ser peregrina, hospitaleira, samaritana e em permanente êxodo. A Igreja de Jesus deve se converter numa Igreja do Perdão, pois o perdão foi dado tanto à negação de Pedro quando à perseguição de Paulo. Jesus é quem constrói a sua igreja ao chamar e reunir seus seguidores em torno de si. A Igreja é sua, nasce dele. E ela não é construída sobre a areia. Pedro será uma das pedras nesta construção permanente da comunidade eclesial não porque tenha a solidez e a firmeza de temperamento, pois por mais apaixonado e colérico que seja, é inconstante e inconsistente. Sua força repousa simplesmente em sua fé em Jesus Cristo. A Igreja de Jesus deve estar sempre aberta ao diálogo e à acolhida dos diferentes para que possa aprender com eles e beber da mesma busca de Deus. O Papa Bento XVI adverte: “Ao diálogo com as religiões deve acrescentar-se hoje, sobretudo, o diálogo com aquelas pessoas para quem a religião é uma realidade estranha, para quem Deus é desconhecido e, contudo, a sua vontade não é permanecer simplesmente sem Deus, mas aproximar-se Dele, pelo menos como Desconhecido” (Discurso dos bons votos de Natal para a Cúria Romana, 2009). Não temos o direito de construir uma identidade a partir da negação e da exclusão dos outros, dos diferentes de nós. Se assim o fizermos seremos apenas uma barca destroçada e encalhada nas correntes de nossas âncoras, presas em si e por si mesmas; uma barca impotente para avançar por mares nunca dantes navegados que apodrecerá com a sua proa encravada e imóvel (At 27, 41). Todo coração estagnado apodrece, toda vida limitada fenece, toda igreja defensiva e fechada em si mesma nunca vislumbrará o horizonte plural de Deus, pois bloqueia o fluxo do Espírito que suscita gestos que libertam onde melhor lhe aprouver. O papa Francisco adverte: “Quem somos nós para fechar as portas? Na Igreja antiga, e ainda hoje, temos o ministério do hostiário. E o que o hostiário fazia? Abria a porta, recebia as pessoas, fazia as pessoas passarem. Nunca houve o ministério de fechar a porta, nunca!” (Missa na Casa de Santa Marta, 12.5.2014).


CONTEMPLAR

Papa Francisco com um cordeiro sobre os ombros. AP Photo, Osservatore Romano, http://roma.repubblica.it, 01/06/2014.



segunda-feira, 16 de junho de 2014

O Caminho da Beleza 31 - XII Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 31
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XII Domingo do Tempo Comum                 22.06.2014
Jr 20, 10-13                       Rm 5, 12-15                                   Mt 10, 26-33


ESCUTAR

“Mas o Senhor está ao meu lado como forte guerreiro; por isso, os que me perseguem cairão vencidos. Por não terem tido êxito, eles se cobrirão de vergonha. Eterna infâmia, que nunca se apaga!” (Jr 20, 11).

“O dom gratuito concedido por meio de um só homem, Jesus Cristo, se derramou em abundância sobre todos” (Rm 5, 15).

“Não tenhais medo!” (Mt 10, 31).



MEDITAR

“Nós deveríamos a cada instante ter o Senhor diante dos olhos. Nós deveríamos executar cada ação sob os olhos plenos do amor e da benevolência de Deus. A experiência de Deus é libertadora, ela dá força e cura. Ela me libera do medo e do pavor face ao Inimigo” (Anselm Grün).

"O medo é a extrema ignorância em momento muito agudo" (Guimarães Rosa).



ORAR

“Não temais!” é a invocação deste domingo ainda que estejamos expostos a todos os riscos e vivamos num estado permanente de conflitos e contradições. Jeremias testemunha que o Senhor lhe confia uma palavra ardente, que corta a carne e arranca as falsas seguranças. O profeta incomoda a tranquilidade alheia e por mais que o Senhor esteja ao seu lado como forte guerreiro, Ele não intervém para livrá-lo dos golpes. Os discípulos do Cristo estão sempre sob a proteção paterna de Deus, mas apesar disto, estão expostos a todas as provas e tentações sem nenhuma imunidade divina. O Cristo na Cruz se faz voluntariamente impotente e conserva somente o poder do amor e do perdão. Deus não intervém e muito menos de fora, pois o risco do amor é a debilidade e o desprezo. Quando o amor recorre à força para se fazer valer ou recorre à lei para tutelar os seus direitos desmente-se a si mesmo. A única razão do amor é o amor. O evangelho nos faz saber que o Pai está comprometido em tudo o que nos acontece e está dentro de nós encarando conosco os golpes que recebemos. A fé cristã não tem uma função de impermeabilizar. A fé cristã se expõe e nesta exposição nos faz saber e sentir a presença providencial do Senhor. No calvário, existe somente a Cruz e nela se encontram e cruzam o pecado do homem e o dom de Deus que oferece o seu Filho único. O amor, ainda que derrotado, continua dando tudo e sempre. Jesus quer libertar as pessoas do medo e da angústia que se apodera delas quando em nosso coração cresce a desconfiança, a insegurança e a falta de liberdade interior. O amor é sempre um gesto que liberta. Jesus procurou, antes de mais nada, despertar a confiança no coração das pessoas. Seu maior desejo era que elas vivessem em paz, sem medos e angústias, pois onde cresce o medo perde-se de vista Deus, afoga-se a bondade das pessoas, a vida se apaga e a alegria desaparece. Meditemos em nossos corações as palavras de Paulo: “Quem nos afastará do amor de Cristo: tribulação, angústia, perseguição, nudez, perigo, espada? Em todas essas circunstâncias, somos mais que vencedores, graças àquele que nos amou” (Rm 8, 35-37). Uma comunidade cristã deve ser o lugar em que, vivendo a verdade, libertamo-nos dos fantasmas, que são os nossos medos, para respirar a paz e viver a fraternidade entranhada que nos torna possível, hic et nunc, escutar o apelo de Jesus: “Não tenhais medo!”.



CONTEMPLAR
O Grande São Miguel, Raffaello Sanzio, 1518, óleo transferido da madeira para tela, 268 cm x 160 cm, Museu do Louvre, Paris, França.







terça-feira, 10 de junho de 2014

O Caminho da Beleza 30 - Santíssima Trindade

O Caminho da Beleza 30
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



Santíssima Trindade                15.06.2014
Ex 34, 4-6-6.8-9               2 Cor 13, 11-13                   Jo 3, 16-18


ESCUTAR

“Moisés gritou: ‘Senhor, Senhor! Deus misericordioso e clemente, paciente, rico em bondade e fiel’” (Ex 34, 6).

“Irmãos, alegrai-vos, trabalhai no vosso aperfeiçoamento, encorajai-vos, cultivai a concórdia, vivei em paz, e o Deus do amor e da paz estará convosco” (2 Cor 13, 11).

“Deus amou tanto o mundo que deu o seu Filho unigênito, para que não morra todo o que nele crer, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16).



MEDITAR

“A Trindade e a Cruz são os dois polos do cristianismo, as duas verdades essenciais: uma, a alegria perfeita e a outra a perfeita infelicidade. O conhecimento de uma e de outra e da sua misteriosa unidade é indispensável” (Simone Weil)

 “Quem não consegue mais ouvir o irmão, em breve também não conseguirá mais ouvir a Deus. Estará sempre falando, também, perante Deus. Aqui começa a morte da vida espiritual, e no fim restará só o palavreado piedoso, a condescendência clericalesca que sufoca com palavras piedosas” (Dietrich Bonhoeffer).



ORAR

A Trindade revela o dinamismo vital que faz a comunidade eclesial viver. A comunidade deve ser o lugar de visibilidade em que não temos medo da verdade seja qual for e onde cada um reconhece o direito de expressar livremente o seu pensamento e o de fazê-lo com coragem. Uma comunidade em que as murmurações e as dissimulações correm soltas pelos becos e bares elas só poderão ser superadas por uma reciprocidade respeitosa e lúcida. A comunidade cristã não se basta a si mesma, mas deve buscar a comunhão: “Tende os mesmos sentimentos de Cristo Jesus” (Fl 2,5). A comunidade sem comunhão é uma esquálida referência e uma casca vazia de conteúdo. A comunidade eclesial não é uma simples justaposição de pessoas que temem acolher-se, reciprocamente, na verdade: “Alegrai-vos, trabalhai no vosso aperfeiçoamento, encorajai-vos, cultivai a concórdia e vivei em paz”. A comunidade não é uma uniformidade niveladora, quase sempre pela rasura, mas a comunhão de pessoas plurais e diversas. O primado da comunidade não é a disciplina, mas o amor. A dinâmica vital da comunidade é a fraternidade que se converte no sinal do amor do Pai, revelado pelo Filho e infundido em nossos corações no Espírito. Ela testemunha e proclama o nome de Deus como revelado a Moisés: “Misericordioso e clemente, paciente, rico em bondade e fiel”. Se a comunidade cristã não reflete o amor trinitário desaparece o sinal específico do amor e ela se reduz a um espelho que não reflete nenhuma imagem. Quando afirmamos o primado do amor na comunidade valorizamos a centralidade da pessoa e o valor supremo é a valorização das diferenças. O amor é dinâmico: se expande e circula. Somos tentados a forjar um Deus à nossa imagem e conceituá-lo como o contrário do homem e, por esta razão, nos contentamos com a acomodação de encerrar Deus num puro ato de contemplação e numa suposta e feliz autossuficiência. A Boa Nova da revelação da Trindade é que existem diferenças entre si e, portanto, a vida divina não se define como um eterno retorno narcisista sobre si, pelo êxtase. Cada pessoa só existe em relação às outras pessoas e é esta relação que as constitui como diferentes. É uma dança amorosa que jamais termina, pois nela a comunhão brota da interdependência e da intercomunicação. Meditemos as palavras de Emmanuel Mounier: “Eu preciso do olhar dos meus amigos para saber quem eu sou”.



CONTEMPLAR


Abrão e os três anjos, Marc Chagall, 1966, óleo sobre tela, 190 cm x 292 cm, Musée National Message Biblique Marc Chagall, Nice, França.




segunda-feira, 2 de junho de 2014

O Caminho da Beleza 29 - Pentecostes

O Caminho da Beleza 29
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



Pentecostes                       08.06.2014
At 2, 1-11                  1 Cor 12, 3-7.13-13                       Jo 20, 19-23



ESCUTAR

“Todos ficaram confusos, pois cada um ouvia os discípulos falar em sua própria língua” (At 2, 6).

“A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum” (1 Cor 12, 7).

“E depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: ‘Recebei o Espírito Santo’” (Jo 20, 22).



MEDITAR

“Deve-se estar sempre embriagado. Nada mais conta. Para não sentir o horrível fardo do Tempo que esmaga os vossos ombros e vos faz pender para a Terra, deveis embriagar-vos sem tréguas. Mas de quê? De vinho, de poesia ou de ternura, à vossa escolha. Mas embriagai-vos. E se algumas vezes, nos degraus de um palácio, na erva verde de uma vala, na solidão baça do vosso quarto, acordais já diminuída ou desaparecida a embriaguez, perguntai ao vento, à vaga, à estrela, à ave, ao relógio, a Deus, a tudo o que foge, a tudo o que geme, a tudo o que rola, a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai que horas são; e o vento, a vaga, a estrela, a ave, o relógio e Deus vos responderão: ‘São horas de vos embriagardes! Para não serdes os escravos martirizados do Tempo, embriagai-vos sem cessar! De vinho, de poesia ou de ternura, à vossa escolha’” (Baudelaire).

“É isto, o espírito. Esta capacidade de não submeter sua existência, mas de assumi-la no amor para fazer dela uma oferenda luminosa e universal” (Maurice Zundel).



ORAR

Tentemos deixar fluir ao menos uma vez na vida o sopro do Espírito no meio e dentro de nós. Deixemos que sejam varridos das cabeças todos os símbolos do poder: coroas, solideus, mitras com todas as máscaras e disfarces que ornam as liturgias do poder. Permitamos que o sopro arranque as páginas dos nossos códigos, que leve para o mais longe as sandices dos nossos discursos políticos, sociais e religiosos e assistamos o fogo se ocupar de queimá-los para que nunca mais pretendam dosificar a sua força. Com certeza, será um ganho para todos nós. Ele não sopra para garantir a ordem, para avalizar decisões que prejudiquem o Bem Comum e nem desempenha a função de juiz em nossos jogos com as regras determinadas por nós e para o nosso sucesso. Façamos, ao menos uma vez, com plena confiança no Espírito da Liberdade, a prova de acolher este mesmo Espírito como elemento perturbador, verdadeira inspiração, desmonte das regras fixadas de antemão e portador de coisas jamais vistas, ouvidas e experimentadas antes. Tenhamos a coragem de sermos habitados pelo vento e pelo fogo. É o Espírito de verdade que vem a nós e nos produz como homens e mulheres que não temem as travessias plurais da vida. O Ressuscitado abre o futuro, abre a porta e abre a esperança do possível. Pentecostes é a festa de todos os possíveis. O Espírito acende em nós uma paixão e uma nova criação nasce de um colossal incêndio que nos deixa enamorados e nos surpreende com as palavras apaixonadas que por falso pudor nunca nos permitimos, publicamente, dizer. O Espírito – vento e fogo – rompe os limites das alcovas e das salas e brinca, se diverte e ri da nossa sisudez e pretensa seriedade. Vento e fogo são incontroláveis, imprevisíveis e a nova aliança que trazem nos faz orbitar fora de nós e encontrar os outros conhecidos e desconhecidos num abraço amoroso e livre. Os discípulos foram considerados embriagados, pois novamente despertavam entusiasmados para anunciar, em todas as línguas, as maravilhas do Senhor. Toda a tentativa de administrar a ação do Espírito e falar em seu nome será um contra senso. O Espírito de Jesus se encontra na oração, na solidariedade, no perdão, na palavra comprometida e na misericórdia que superam todas as fórmulas e as frases de conveniência, os conselhos moralizantes e as respostas pré-fabricadas. Jesus nos fala de um pecado contra o Espírito que nunca terá perdão. É a blasfêmia de conceder ao Espírito apenas um sussurro e uma sutil e vigiada fissura ao invés de janelas e portas abertas dos corações. O pecado irreparável é a pretensão de falar da coragem cristã e oferecer ao Espírito um pouco menos da metade de todo o resto que concedemos ao medo e a angústia. O pecado sem perdão é falar de Pentecostes sem nunca nos permitir experimentar e viver até as últimas consequências a sua embriaguez.



CONTEMPLAR


Pentecostes, autor não identificado, s. d., referência: http://www.cruzblanca.org/hermanoleon/sem/c/pasq/pentecostes/pentecostes02.jpg.