terça-feira, 26 de dezembro de 2017

O Caminho da Beleza 06 - Sagrada Família de Jesus, Maria e José

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


Sagrada Família de Jesus, Maria e José              31.12.2017
Eclo 3, 3-7.14-17               Cl 3, 12-21               Lc 2, 22-40


ESCUTAR

A caridade feita a teu pai não será esquecida (Eclo 3, 16).

Que a paz de Cristo reine em vossos corações, à qual fostes chamados como membros de um só corpo (Cl 3, 15).

“Agora, Senhor, conforme a tua promessa, podes deixar teu servo partir em paz; porque meus olhos viram a tua salvação” (Lc 2, 29).


MEDITAR

Eu sou livre, devo sê-lo sempre mais, mas para ligar a minha liberdade a algo maior (mais belo, mais justo, mais verdadeiro) do que ela. A liberdade se realiza à medida que adere à verdade enquanto lógica da vida, e essa lógica da vida é a relação harmoniosa. A liberdade se realiza aderindo à vida boa e à vida justa. É este o porto no qual a liberdade deseja aportar. A liberdade se realiza no amor.

(Vito Mancuso)


ORAR

            Simeão é um personagem visceral. Nós o imaginamos quase sempre como um sacerdote ancião do Templo, embora o texto não diga nada sobre isso. Simeão é um homem bom do povo, que guarda em seu coração a esperança de ver um dia “o consolo” de que tanto precisa. “Conduzido, pelo mesmo Espírito”, sobe ao templo no momento em que entram Maria, José e seu menino Jesus. O encontro é comovente. Simeão reconhece no menino, trazido por aquela pobre dupla de judeus piedosos, o Salvador que esperava há tantos anos. O homem se sente feliz. E num gesto atrevido e maternal, “tomou-o em seus braços” e com grande amor e carinho bendisse a Deus e aos pais. Sem dúvida, o evangelista o apresenta como modelo: é assim que devemos acolher o Salvador. Mas, de pronto, ele se dirige a Maria, seu rosto muda, e suas palavras não pressagiam nada de tranquilizador: “uma espada te atravessará o coração”. Este menino que tem em seus braços “será sinal de contradição”, fonte de conflitos e enfrentamentos. Jesus fará que todos “ou caiam ou se levantem”. Uns o acolherão e sua vida adquirirá uma dignidade nova, sua existência se encherá de luz e de esperança. Outros o rechaçarão e sua vida se porá a perder, a recusa a Jesus será a sua ruína. Diante de Jesus, “manifestar-se-ão claramente os pensamentos de todos”. Ele desvelará o que há de mais profundo nas pessoas. A acolhida deste menino pede uma mudança profunda. Jesus não vem trazer tranquilidade e sim gerar um processo doloroso e conflitivo de conversão radical. Sempre é assim, hoje também. Uma Igreja que leve a sério sua conversão a Jesus Cristo não será nunca um espaço de tranquilidade, mas sim de conflito. Não é possível uma relação mais vital com Jesus sem dar passos até níveis maiores de verdade, e isto é sempre doloroso para todos. Quanto mais nos aproximamos de Jesus, melhor veremos nossas incoerências e desvios, o que há de verdade ou mentira em nosso cristianismo, o que há de pecado em nossos corações e estruturas, em nossas vidas e teologias.

(José Antonio Pagola).


CONTEMPLAR


Um menino olha de um abrigo temporário num campo de refugiados Rohingya, 2014, Sittwe, Myanmar, Soe Zeya Tun, Agência Reuters, Yangon, Myanmar.



domingo, 24 de dezembro de 2017

O Caminho da Beleza 05 - Natal do Senhor

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


Natal do Senhor              25.12.2017
Is 52, 7-10               Hb 1, 1-6                  Jo 1, 1-18


ESCUTAR

Como são belos, andando sobre os montes, os pés de quem anuncia e prega a paz, de quem anuncia o bem e prega a salvação (Is 52, 7).

“Tu és o meu Filho, eu hoje te gerei” (Hb 1, 5).

A Deus ninguém jamais viu. Mas o unigênito de Deus, que está na intimidade do Pai, ele no-lo deu a conhecer (Jo 1, 18).


MEDITAR

O sagrado no Cristo não é qualquer coisa que existe sob os ferrolhos ou que é colocada atrás das grades ou ainda sob véus impenetráveis. O sagrado em Jesus é o homem, é o próprio homem. São as nossas mãos, o trabalho de nossas mãos; são os nossos olhos e a luz que os preenche; são os nossos corações e esta maravilhosa capacidade de amar. Isto tudo é o que constitui o sagrado que perpetua a Encarnação e que não cessa de tornar presente o Cristo entre nós.

(Maurice Zundel)


ORAR

            São raros os que festejam o Natal!... Os que festejam o Natal vêm de longe. Erguem-se de repente do meio de um povo indiferente, partem, deixam tudo atrás de si, trazem o que têm de mais precioso e vão firmes em frente, sem mesmo saber a quem lhes será dado oferecê-lo. Quão poucos há entre nós que creem na Natividade! Rezemos para que alguns de nós se desabituem deste hábito, desta ilusão de crer que é a pior falta de fé, e se ponham a escutar o que em meio a esta noite neles surge de alegre, de novo, de vivo e de forte. De nada nos serve que o Senhor tenha nascido há dois mil anos atrás se nada nasce verdadeiramente hoje. De nada serve que ele tenha proferido palavras de Deus há dois mil anos atrás se não houver hoje quem nos fale da parte de Deus. De nada nos serve que há dois mil anos tenha feito gestos de Deus; que há dois mil anos a ternura de Deus se tenha manifestado, se ninguém há hoje entre nós para amar, cuidar, compadecer, se não nos amamos um pouco, hoje, uns aos outros. A maravilha desta noite, irmãos, é que Deus, entre nós, se pode tornar vivo. Há sempre necessidade de um corpo, de mãos para curar, de braços para apoiar, boca para falar, coração para amar. Em qual de nós irá ele nascer esta noite? Oh! Por certo que há de ser um nascimento pobre, uma criança frágil e ameaçada. Envolvei-a em pobres linhos, deitai-a sobre a palha de um presépio. Será uma festa humilde em confronto com as festas do mundo.

(Louis Evely, 1910-1985)


CONTEMPLAR

Mãe e Filho, 1962, Walter Chapell (1925-2000), Novo México, Estados Unidos.





segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

O Caminho da Beleza 04 - IV Domingo do Advento

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12)


IV Domingo do Advento                      24.12.2017
2 Sm 7, 1-5.8-12.14.16                Rm 16, 25-27                     Lc 1, 26-38


ESCUTAR

“Vê, eu resido num palácio de cedro, e a arca de Deus está alojada numa tenda!” (2 Sm 7, 2).

Glória seja dada àquele que tem o poder de vos confirmar na fidelidade ao meu evangelho (Rm 16, 25).

“Para Deus nada é impossível” (Lc 1, 37).


MEDITAR

Sede o que sou. Eu sou o Amor. Sede amor. Não vos é possível atingir a plenitude do Amor. Mas é possível a cada um, e sempre, orientar-se para ele, tender para ele, dar alguns passos na via sagrada. Haverá muitos obstáculos, muitas quedas, muitos acidentes. Mas toda a vontade de se dar ao Amor, todo movimento verdadeiro de Amor, tem um valor infinito. As derrotas podem se acumular. É preciso, contudo, recomeçar sempre a amar.

(Um monge da Igreja Oriental)


ORAR

Hoje, o grão de trigo foi disposto numa terra virgem. O mundo afaimado exulta e bendiz de alegria. A natureza inteira prepara os dons que oferecerá para o menino. A terra irá oferecer uma manjedoura e as cidades vão oferecer Belém. Os ventos oferecerão sua obediência e o mar sua submissão. As profundezas do mar oferecerão os peixes da pesca miraculosa e os peixes eles mesmos uma peça de moeda. As águas vão oferecer o Jordão, as fontes vão oferecer a Samaritana e o deserto, João Batista. Os animais oferecerão um jumento e os pássaros uma pomba. As estéreis oferecem Isabel e as virgens Maria. Os sacerdotes vão oferecer Simeão e as viúvas Ana. Os pastores vão oferecer seus cantos e as crianças seus ramos. Os perseguidores oferecerão Paulo e os pagãos uma cananeia. A hemorroíssa oferecerá sua fé e a prostituta seu perfume. As árvores oferecerão Zaqueu e as florestas uma cruz. O Oriente oferecerá uma estrela e Gabriel sua saudação: “Alegra-te, tu a quem uma graça foi feita, o Senhor está contigo; ele é mesmo de ti e em ti. Em ti, para onde veio segundo seu bom agrado. De ti, da qual sairá, pois ele desejou que fosse assim. Ele próprio antes de ti, pois antes de todos os séculos, sem alteração e de maneira inefável, ele foi engendrado pelo Pai”. Maria é mãe, pois ela colocou no mundo aquele que quis nascer. Ela se disse serva, e dizer que ela é serva, é confessar sua natureza humana e a graça de Deus. Ela é uma arca que porta não mais a lei, mas o autor da lei. “O Senhor está contigo”: ele está de hoje em diante com nós todos, Emmanuel, Deus Conosco. O Senhor está conosco, e agora todo erro desaparece; agora os demônios tremem e estão em fuga. O Senhor está conosco: a morte ficará adormecida, os mortos vão ser libertados. O Senhor está conosco, não mais um subalterno, nem um anjo, mas o Senhor ele mesmo. Ele vem para nos salvar. Aquele que os céus não podem conter, uma virgem o recebeu; nela ele se fez carne. Hoje, o grão de trigo foi disposto numa terra virgem. O mundo exulta e bendiz de alegria.

(Proclo de Constantinopla, 446 d.C.)


CONTEMPLAR

Mulher muçulmana [Rohingya], desalojada pela violência recente em Kyukphyu, Myanmar, chora após chegar ao campo de refugiados, 2012, Soe Zeya Tun, Agência Reuters, Yangon, Myanmar.



segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

O Caminho da Beleza 03 - III Domingo do Advento

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


III Domingo do Advento                     17.12.2017
Is 61, 1-2.10-11                  1 Ts 5, 16-24                       Jo 1, 6-8.19-28

ESCUTAR

Como a terra faz brotar a planta e o jardim faz germinar a semente, assim o Senhor Deus fará germinar a justiça (Is 61, 11).

Não apagueis o espírito! Não desprezeis as profecias (1 Ts 5, 19-20).

“Eu sou a voz que grita no deserto” (Jo 1, 23).


MEDITAR

Perguntaram a um ancião: “Por que tenho medo quando vou ao deserto?”. “Porque até então vives para ti mesmo”, respondeu o ancião.

(Padres do Deserto, XXII, 2).


ORAR

            O Grito se fez carne, finalmente, o Grito em pessoa que rasga a história pelo meio. Jesus, o Grito de uma extremidade a outra, desde o que ele certamente soltou, como todo homem, para entrar no mundo, até aquele que soltou, como todo homem, para sair dele. É este que, nos dias de sua carne, com violento clamor e lágrimas, dirigiu pedidos e súplicas àquele que podia salvá-lo da morte, e sendo atendido em razão de seu amor, apesar de ser Filho, aprendeu, por aquilo que sofreu, a obediência (Hb 5, 7-8).  Na verdade, a manjedoura do Natal seria infantil e franzina se não desse a ver, ou melhor, a escutar baixinho, em seu ostensório de palha seca, o Grito capital, o Grito hospedeiro de todos os gritos do homem, até os arrancados da dor, da violência sofrida e da sensação do abandono. E pela hora nona, Jesus clamou com um grande grito: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Mt 27, 46). Ainda que seja bem compreensível, a indignação que suscita no mundo católico atual o ostracismo em que a manjedoura aqui e ali se encontra, não deveria ser ela acompanhada de um exame de consciência? Decididamente, não temos que nos censurar por ter feito do Natal algo tão pequeno? Não tornamos silenciosa a manjedoura, distante dos gritos reais que soltam as crianças e os homens? Teríamos falhado em nossa missão de fazer escutar naqueles que estão longe, muito longe, cada vez mais longe, o Deus real, isto é, aquele que reúne, em sua carne, todos os gritos do homem e que somos nós que os escutamos em seu Nome? Porque se é verdade que Deus conosco é seu Nome, como é que ele não gritaria também conosco? Não precipitamos nós mesmos, com o tempo, o exílio, isso que hoje em dia perturba as nossas boas consciências, inspirando o sentimento de uma religião que excomunga a priori os gritos os mais insolentes e poderosos do homem (aqueles de que os Salmos, todavia, estão cheios)?

(François Cassingena-Trévedy, monge beneditino do Mosteiro de Ligugé, Vienne, França)


CONTEMPLAR


Sahel: O Fim da Estrada - Refugiados no campo de refúgio de Korem, 1984, Korem, Tigray, Etiópia, Sebastião Salgado (1944-), Magnum Photos, do livro África (2007), Brasil.



segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

O Caminho da Beleza 02 - II Domingo do Advento

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

II Domingo do Advento                       10.12.2017
Is 40, 1-5.9-11                    2 Pd 3, 8-14                                    Mc 1, 1-8


ESCUTAR

“Aplainai na solidão a estrada de nosso Deus” (Is 40, 3).

O que nós esperamos, de acordo com sua promessa, são novos céus e uma nova terra, onde habitará a justiça (2 Pd 3, 13).

“Depois de mim virá alguém mais forte do que eu. Eu nem sou digno de me abaixar para desamarrar suas sandálias” (Mc 1, 7).


MEDITAR

Obrigado, irmão, pelo sol que me deste, na aparência roubando-o.

(Carlos Drummond de Andrade)


ORAR

A santa Escritura não cessa de falar e gritar, como está escrito sobre João: “Eu sou a voz que grita no deserto” (Jo 1, 23).  João não apenas gritou no tempo em que dizia aos fariseus, anunciando o Deus Salvador: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai as veredas de Nosso Senhor!”. Ele grita ainda para nós e o trovão de sua voz ruge no deserto de nossos pecados. Mesmo se ele adormeceu pela morte de seu martírio, sua voz, ela, permanece sempre viva. Ainda hoje, João Batista nos diz: “Preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas”. A santa Escritura não cessa de falar e gritar. Devemos então preparar os caminhos do Senhor, não no sentido literal, mas para a pureza de nossa fé. O Senhor não toma os caminhos terrestres, mas avança pelo segredo dos espíritos. João nos ordena a preparar o caminho do Senhor, mas vejam qual o caminho ele preparou para si mesmo. Em tudo, ele ordenou e dirigiu a trama de sua vida em função da vinda do Cristo. Ele foi, de fato, jejuador, humilde, pobre e puro, como disse o Evangelista, descrevendo seu tipo de vida: “João tinha uma manta de pelo de camelo, cingia os rins com um couro; seu alimento eram gafanhotos e mel silvestre”. Penso que todo esse comportamento do profeta era ele mesmo profético. João era, portanto, grande, e o Senhor mesmo lhe louvou a grandeza: “Entre os nascidos de mulher, não há um maior que João, o Batista” (Mt 11,11). Ele teve precedência sobre todos os profetas que o precederam; ele ultrapassou todos os patriarcas... E João Batista, como uma lâmpada frágil que precede a luz do sol disse dele mesmo: “Depois de mim vem alguém maior do que eu e não sou digno de desamarrar a corda de suas sandálias, ele mesmo vos batizará com o Espírito Santo e o fogo”. Ao mesmo tempo, ele predisse que a clareza de sua lâmpada tornar-se-ia inútil e desapareceria com a vinda do Sol. O sol torna inútil a luz de uma lâmpada e a vinda da graça do Cristo torna igualmente caduco o batismo de penitência de João.

(Máximo de Turim, 380-465 dC)


CONTEMPLAR


Uma mulher protegendo a si e a seu filho do sol a bordo de um barco de refugiados no Golfo de Siam, 1977, Cambodja, Eddie Adams (1933-2004), Associated Press, de seu livro “Barco dos Não Sorrisos”, Nova Iorque, Estados Unidos.



segunda-feira, 27 de novembro de 2017

O Caminho da Beleza 01 - I Domingo do Advento


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


I Domingo do Advento             03.12.2017
Is 63, 16-17.19;64, 2-7               1 Cor 1, 3-9             Mc 13, 33-37


ESCUTAR

Como nos deixaste andar longe de teus caminhos e endureceste nossos corações para não termos o teu temor? (Is 63, 17).

Nele fostes enriquecidos em tudo, em toda palavra e em todo conhecimento, à medida que o testemunho sobre Cristo se confirmou entre vós (1 Cor 1, 5).

“Não suceda que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo. O que vos digo, digo a todos: vigiai!” (Mc 13, 37).


MEDITAR

Deus meu, foi te buscando
Que alguém te encontrou,
Eu, ao contrário, te encontrei fugindo de ti.
Foi mediante a busca que alguém te achou,
Eu descobri que eras tu quem outorga a busca.
Tu mesmo eras o caminho que permite chegar até Ti.
Tu eras o princípio e serás o final.
Tu eras tudo e isso me basta.
Tudo mais é loucura.

Senhor, leve a termo em mim Tua tarefa indizível.

(Abdolah Ansari, 1006-1089)


ORAR

     Tanto na encarnação como na última vinda, o Deus com quem somos chamados a prestar contas é um Deus “surpreendente”. Para viver o hoje da primeira vinda, o cristão é chamado à acolhida. O Deus que rasga os céus e desce não é um Deus “ocasional”, furtivo, episódico, “excepcional”. É o Deus conosco. O Deus que quer estar no meio de nós, no centro de nossa existência, não em suas margens. Sua presença é constante e não está ligada a momentos privilegiados e a lugares especiais. Este “rasgão” permanece. Temos de “suportar” cotidianamente a intromissão do céu nos assuntos da terra... Por outra parte, a acolhida nos obriga a... receber. O Deus “surpreendente” antes de tudo não vem exigir ou reivindicar, mas sim dar... Acolhê-lo não significa preparar um espetáculo colossal, uma recepção grandiosa em sua honra. Mas sim nos apresentar com nossa pobreza, que é essencialmente a disponibilidade para receber... Jesus não nos revela a hora. A espera assume uma dimensão particular: a esperança. E esta se concretiza em uma postura de responsabilidade e de compromisso. Cada um em seu posto e atento ao próprio trabalho: “a cada um sua tarefa”... Um Deus “surpreendente”, que chega “ao entardecer ou a meia-noite, ou ao canto do galo, ou ao amanhecer”, não pode ser anunciado mediante um sinal de alarme. O Deus “surpreendente” deve ser esperado no estupor, com as portas abertas de par em par, com mãos trabalhadoras, olhos livres das travas e coração finalmente curado da dureza (Alessandro Pronzato).


CONTEMPLAR

Uma Ceia de Páscoa na sala de jantar do Kibbutz Kinneret, 1979, Israel, Micha Bar-Am (1930-), Magnum Photos, Berlim, Alemanha.






segunda-feira, 20 de novembro de 2017

O Caminho da Beleza 53 - Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo

Muitos pensam de modo diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)

Não temos um só Pai? Não nos criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)

Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo                 26.11.2017
Ez 34, 11-12.15-17            1 Cor 15, 20-26.28                       Mt 25, 31-46

ESCUTAR

Assim diz o Senhor Deus: “Vede! Eu mesmo vou procurar minhas ovelhas e tomar conta delas” (Ez 34, 11).

Em Cristo todos reviverão (1 Cor 15, 22).

“Todos os povos da terra serão reunidos diante dele, e ele separará uns dos outros, assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos” (Mt 25, 32).


MEDITAR

Em 1935, Hitler havia dito que “se a guerra viesse, ele englobaria e resolveria a questão da eutanásia, porque era mais fácil fazê-lo em tempo de guerra”. O decreto foi cumprido imediatamente no que dizia respeito aos doentes mentais e, entre dezembro de 1939 e agosto de 1941, cerca de 50 mil alemães foram mortos com monóxido de carbono em instituições cujas salas de execução eram disfarçadas exatamente como seriam depois em Auschwitz – como salas de duchas e banhos... Os homens que haviam sido empregados no programa de eutanásia na Alemanha foram então mandados para o Leste para construir as novas instalações para o extermínio de todo um povo” (Hannah Arendt).


ORAR

      Os textos deste domingo encerram o ano litúrgico e nos fazem refletir sobre o julgamento derradeiro. O profeta nos faz saber que este não será uma anistia ampla, geral e irrestrita, pois o amar do Senhor é fazer justiça e tomar partido pelos menores entre os menores. A comunidade de Mateus revela que o Filho do Homem é Jesus, o Crucificado, e seu poder é o Reino do Amor que renuncia a si mesmo para construir a fraternidade entre homens e pecadores. É este Jesus cheio de “sabedoria, glória e realeza” que recebe do Pai o poder de julgar. O Evangelho nos faz saber que o único critério para o julgamento derradeiro, e que diz respeito a todas as nações da terra, é o amor aos menores, aos considerados insignificantes. Devemos atender à oração de São João Crisóstomo: “Rende-te ao meu modesto pedido: não peço nada que te custe; somente pão, teto e algumas palavras de consolo”. Todas as nossas “celebrações” serão abominadas pelo Senhor se não forem celebrações do testemunho efetivo da comunidade para com os irmãos menores entre nós. O Ressuscitado, como um mendigo, bate à nossa porta e nos pede sempre, com a mão estendida, alguma coisa. Ele quer ser alimentado por nós, pois Ele quer ser o nosso devedor. Porque nos ama, Ele quer sempre estar sentado em nossa mesa, entre amigos, e proclamar ao mundo que a fraternidade é possível e não é um mero sonho ou quimera. O Ressuscitado quer se apresentar ao mundo como Alguém a quem alimentamos, damos de beber, acolhemos, vestimos, visitamos na prisão, nos hospícios e nos hospitais. A grande revelação do Evangelho é que seremos julgados pelo que não fizemos: “Em verdade eu vos digo, todas as vezes que não fizestes isso a um desses pequeninos, foi a mim que não o fizeste”. Ainda é tempo de amar, de praticar o amor, pois ninguém sabe nem o dia e nem a hora derradeiros. E praticar este amor é seguir à risca o roteiro traçado pelo profeta que nos garante como prêmio a Coroa da Vida: “O jejum que eu prefiro é este: acabar com a injustiça qual corrente que se arrebenta; acabar com a opressão qual canga que se solta; deixar livre os oprimidos, acabar com toda espécie de imposição e jamais te esconder do pobre do teu irmão. Aí, então, qual novo amanhecer, vai brilhar a tua luz e tuas feridas hão de sarar rapidamente. Teus atos de justiça irão à tua frente e a glória do Senhor te seguirá. E quando o invocares, o Senhor te atenderá e ao clamares, Ele responderá: Aqui Estou!” (Is 58, 6-9).


CONTEMPLAR

S. Título, 1998, França, Paris, Museu Rodin, Elliot Erwitt (1928-), Magnum Photos, franco-americano.




segunda-feira, 13 de novembro de 2017

O Caminho da Beleza 52 - XXXIII Domingo do Tempo Comum

Muitos pensam de modo diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)

Não temos um só Pai? Não nos criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)

XXXIII Domingo do Tempo Comum                     19. 11.2017
Pr 31, 10-13,19-30.30-31                      1 Ts 5, 1-6                Mt 25 14-30


ESCUTAR

Abre suas mãos ao necessitado e estende suas mãos ao pobre (Pr 31, 20).

Não durmamos, como os outros, mas sejamos vigilantes e sóbrios (1 Ts 5, 6).

Todo aquele que tem será dado mais, e terá em abundância (Mt 25, 29).


MEDITAR

Digo ao senhor: tudo é pacto. Todo o caminho da gente é resvaloso. Mas também cair não prejudica demais – a gente levanta, a gente sobe, a gente volta! Deus resvala? Mire e veja. Tenho medo? Não. Estou dando batalha...O sertão tem medo de tudo. Mas eu hoje em dia acho que Deus é alegria e coragem – que Ele é bondade adiante... (João Guimarães Rosa).


ORAR

Não há espetáculo mais deprimente do que o de um cristão que esconde o seu talento, que mascara a sua fé e dissimula a sua pertença a Cristo ao sepultar a Palavra. Mais deprimente ainda é reduzir a Palavra a um moralismo barato ou a uma celebração triunfalista. Não há deformação mais vil do que a das igrejas que se isolam para contemplarem, satisfeitas, os talentos recebidos. Guardar não é o mesmo que semear e Deus tem o direito de nos pedir coragem, liberdade e responsabilidade. Nossa relação com Deus não pode ser reduzida a uma relação servil de uma miserável contabilidade de toma lá dá cá. A parábola dos talentos não é uma estória de medos e ameaças, mas uma luta contra os medos e a afirmação da nossa liberdade de correr riscos. O medo bloqueia e nos faz mergulhar na inutilidade, pois “quem afrouxa na saída ou se entrega na chegada não perde nenhuma guerra, mas também não ganha nada” (G. Vandré). Se damos a Deus apenas o que Ele nos deu, na realidade não lhe damos nada. O talento que mantemos enterrado como cimento de nossa segurança é a expressão da esterilidade da nossa vida. Jesus exige de nós a audácia, a coragem e a disposição ao risco. Somente quem é capaz do risco receberá a amizade de Jesus e encontrará o sentido da vida. Devemos romper a nossa acomodação e vingar o livro dos Provérbios: “Dá bebida ao andarilho e vinho ao aflito para que beba e esqueça a sua miséria e não se lembre de seus sofrimentos. Abre a tua boca a favor do mudo e em defesa do desventurado. Abre a tua boca e dá a sentença justa, defendendo o pobre e o infeliz” (Pr 31, 6-9). A fé no Cristo é o risco de todos os riscos e para todos o mesmo salto no vazio, mas é também alegria, promessa, ternura, amor e vida em abundância.


CONTEMPLAR

Sertão sem Fim, 2009, Araquém Alcântara (1951-), Florianópolis, Brasil.





segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O Caminho da Beleza 51 - XXXII Domingo do Tempo Comum

Muitos pensam de modo diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)

Não temos um só Pai? Não nos criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)

XXXII Domingo do Tempo Comum                       12.11.2017
Sb 6, 12-16              1 Ts 4, 13-18                       Mt 25, 1-13


ESCUTAR

A sabedoria é resplandecente e sempre viçosa. Ela é facilmente contemplada por aqueles que a amam, e é encontrada por aqueles que a procuram (Sb 6, 12).

Não fiqueis tristes como os outros, que não têm esperança (1 Ts 4, 13).

“No meio da noite, ouviu-se um grito: ‘O noivo está chegando. Ide ao seu encontro!’ (Mt 25, 6).


MEDITAR

Quem me compreende como o Eterno, o Anônimo,
o Imanifesto, o Inconcebível, o Supremo,
não limitado de forma alguma,
o Infinito,
quem me adora desse modo e, contudo, vê a minha presença
em todos os seres
e, praticando o bem,
vive alegremente,
esse acabará por unir-se a mim.

(Krishna, em “do amor universal”, bhagavad-gita, século 1 a.C.)


ORAR

A sabedoria não se encontra somente nas universidades, igrejas e templos. Ela é oferecimento e busca: “Ela é facilmente contemplada por aqueles que a amam, e é encontrada por aqueles que a procuram”. No evangelho de hoje, a necessidade da sabedoria soma-se ao convite de estar vigilantes. Cristo não nos pede que renunciemos ao descanso, mas que rompamos com tudo que se opõe à vida e à luz. A vigilância é a capacidade de acolher o momento presente, pois a esperança não se encontra fora do tempo. O teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer afirma que devemos levar a sério as realidades últimas e, ao mesmo tempo, tomar posições decididas diante das penúltimas. É necessário viver a plenitude de cada instante. A hora da chegada do Esposo não pode ser improvisada. É uma hora como as outras. A sabedoria é o sinal luminoso da espera vigilante e da capacidade de sentir o tempo que se faz breve. Deus se atrasa porque, paradoxalmente, é a sua característica de ser pontual. É urgente sem pressa. O noivo estava demorando e não sabemos o dia e nem a hora da sua chegada. Deus sempre chega pontualmente na sua hora, mas por meio de uma sucessão interminável de atrasos em relação aos nossos vorazes relógios. A vida é eterna não por causa da sua duração indefinida, mas pela sua qualidade indestrutível. Ser fiel é se entregar aos outros e esta atitude não pode ser tomada de última hora e improvisadamente. O Cristianismo não é prática de vida reservada para a hora da morte. Não é uma imprudência. Para os imprudentes fecham-se as portas e ouve-se somente o veredicto: “Não vos conheço!”.


CONTEMPLAR


Sem Título, sem data, sem autoria definida, acessado em pinterest.com, outubro 2017.



segunda-feira, 30 de outubro de 2017

O Caminho da Beleza 50 - Solenidade de Todos os Santos

Muitos pensam de modo diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)

Não temos um só Pai? Não nos criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)

Solenidade de Todos os Santos                    05.11.2017
Ap 7, 2-4.9-14                    1 Jo 3, 1-3                Mt 5, 1-12a


ESCUTAR

Eu, João, vi outro anjo, que subia do lado onde nasce o sol. Ele trazia a marca do Deus vivo (Ap 7, 2).

Vede que grande presente de amor o Pai nos deu: de sermos chamados filhos de Deus! E nós o somos! (1 Jo 3, 1).

“Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5, 9).


MEDITAR

Creio que nem os Romanos e nem os Judeus compreenderam Jesus de Nazaré, nem tampouco Seus discípulos que agora pregam Seu nome.
Os Romanos O mataram. E isso foi um erro. Os Galileus fizeram d’Ele um deus, e isso foi um engano.
Jesus era do coração do homem.

(Kalil Gibran)


ORAR

Viver a festa da santidade é viver a realidade de um censo impossível: “uma multidão imensa de gente de todas as nações, tribos, povos e línguas, e que ninguém podia contar”. E como não podemos conhecer todos os nomes dos santos, devemos chamar este domingo da Festa da Santidade Anônima. Todos participam da mesma santidade de Deus e a santidade é o sinal inequívoco do vestígio de Deus em nossas vidas. Os santos não se reduzem ao dos altares oficiais, mas circulam cotidianamente entre nós. Devemos buscar em cada dia o rosto dos santos porque são um reflexo do rosto de Deus. Os santos não vivem em nichos de gesso, mas em casas comuns. Não trazem auréolas luminosas em suas cabeças, mas problemas e preocupações. Não flutuam no ar, mas tem pernas e pés doloridos como os nossos. Os santos são contaminados pela alegria, pela surpresa e compõem a sinfonia dos loucos de Deus. O milagre dos santos consiste no fato de existirem no cenário perverso desta sociedade e querer acrescentar um pouco de graça e ternura no cotidiano do mundo. A santidade não é um luxo, mas uma condição normal e obrigatória do cristão: ela é um dom e uma possibilidade oferecida a todos e não reservada a uns poucos privilegiados. Devemos sempre suspeitar que eles estão mais próximos de nós do que podemos supor. Os santos correm pelas ruas e a maior parte dos bem-aventurados são pessoas simples e que têm coração. A declaração conciliar Nostra Aetate afirma: “A Igreja Católica não rejeita o que é verdadeiro e santo em todas as religiões. Considera suas práticas, maneiras de viver, preceitos e doutrinas como reflexo da verdade que ilumina todos os seres humanos, ainda que se distanciem do que ela crê e ensina (...)A Igreja rejeita como contrária ao pensamento de Cristo toda a discriminação ou perseguição por causa das diferenças de raça, cor, condição ou religião” (NA 857.871).


CONTEMPLAR

Monge budista noviço, Kyaw Thiha, brinca durante a chuva no Monastério Shin Ohtama Tharya, em Yangon, Myanmar, 2011, Soe Zeya Tun, Agência Reuters, Yangon, Myanmar.