O Caminho da Beleza 41
Leituras para a travessia da vida
“A
beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de
nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus
porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca
do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).
“Quando
recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha
íntima alegria” (Jr 15, 16).
“Não
deixe cair a profecia” (D.
Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).
XXII Domingo do Tempo Comum 02.09.2012
Dt 4, 1-2.6-8 Tg 1, 17-18.21-22.27 Mc 7, 1-8.14-15.21-23
“Nada acrescenteis, nada tireis,
à palavra que vos digo, mas guardai os mandamentos do Senhor vosso Deus que vos
prescrevo. Vós os guardareis, pois, e os porei em prática, porque neles está
vossa sabedoria e inteligência perante os povos, para que, ouvindo todas estas
leis, digam: ‘Na verdade, é sábia e inteligente esta grande nação’”(Dt 4, 2-6).
“Todavia, sede praticantes da
Palavra e não meros ouvintes, enganando-vos a vós mesmos. Com efeito, a
religião pura e sem mancha diante do Pai, é esta: assistir os órfãos e as
viúvas em suas tribulações e não se deixar contaminar pelo mundo”(Tg 1, 22.27)
“Este povo honra-me com os lábios,
mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois
as doutrinas que ensinam são preceitos humanos. Vós abandonais o mandamento de
Deus para seguir a tradição dos homens” (Mc 7, 6-8).
“Não há oposição entre a vida
profana e a vida religiosa. Não há vida profana: toda a vida é sagrada, toda a
vida é chamada a ser consagrada, a passar à santidade, todos os caminhos
conduzem a Deus. Trata-se de não se recusar nenhuma fonte: nem a ciência, nem a
arte, nem a música, nem a beleza, nem a natureza, nem a ternura humana, pois
tudo se enraíza em Deus e finalmente se perde Nele”(Maurice Zundel, Silence, Parole et Vie).
“A cisão entre fé e vida, entre
culto e existência, entre legalidade e humanidade, gera a perversão da
religião, o legalismo, o farisaísmo e o espiritualismo angelical” (Cardeal
Gianfranco Ravasi).
A palavra
implantada (Tg 1, 21b) se insere num processo vital e deve favorecer a vida. O
povo libertado da escravidão do Egito se coloca em movimento para atingir a
meta da Terra Prometida. Ele não está num limite regularmente fixado. A lei não
tem a tarefa banal de assegurar uma ordem imutável. A palavra nos convida a
irmos até a Terra Prometida que é a terra da liberdade e não da escravidão. E,
por isso, a lei não é um absoluto, mas também significa mudança, abertura ao
futuro, transformação. Uma lei que não expresse o futuro não é a lei do Deus
libertador do Êxodo. Uma palavra que somente se preocupe em perpetuar o
presente e não impulsione ao que deve ser, cria uma geração de acomodados e não
um povo de peregrinos. Não se permite uma escuta descomprometida, nem uma
palavra que não influencie o nosso agir e responda por uma mudança radical na
orientação da existência. Toda a palavra confinada ao âmbito do sagrado e
cristalizada numa prática religiosa episódica é uma palavra morta. Moisés
recomenda escutar e cumprir, pois uma palavra que não se cumpre torna-se
insignificante. Só podemos dizer que escutamos e entendemos a palavra quando a
traduzimos em ações, gestos e comportamentos. Uma palavra que não determine um
compromisso concreto é uma palavra que nos condena e nos afasta de Deus. Temos
que reafirmar sempre que a conexão mais vital, a partir da escuta da palavra, é
com a humanidade: “a religião pura e sem mancha diante de Deus Pai, é esta: assistir
os órfãos e as viúvas em suas tribulações”. É preciso prolongar o serviço do
templo numa liturgia da solidariedade, fraternidade, justiça e misericórdia que
se celebra ao largo da travessia. O Senhor sonda o nosso coração e se houver
uma cisão entre o “dentro” e o “fora” teremos a degeneração espiritual da
hipocrisia, do legalismo e de uma atividade religiosa aparente e sem
profundidade. Deus está próximo quando a sua palavra anima as ações e nos faz
querer encontrar o próximo. Caso contrário, se somente ouvimos e O cultuamos
exteriormente, Deus está em outra parte. A nossa participação na missa, se a
vivenciarmos apenas como um “assistir” e como uma obediência externa, não vale
grande coisa diante de Deus. Não podemos esquecer que o pão que oferecemos é
acompanhado de dominação, de exploração, da poluição da natureza, da amargura
da concorrência, do egoísmo e da aberração da distribuição mundial: abundância
de uns e pobreza de muitos. Que o vinho também pode ser um dos instrumentos
mais trágicos da degradação humana: embriaguez, lares desfeitos, dívidas,
suicídios. Jesus aniquila com os moralismos e se encarna neste pão e neste
vinho e lhes dá um sentido, pois nada do que é humano lhe é estranho. A missa
deve ser uma realidade que nos compromete inteiramente, que muda nosso coração
colocando em nós o coração de Cristo e nos fazendo capazes de viver segundo seu
amor. E ao trazermos pão e vinho para a mesa do Senhor nós nos comprometemos a
trazer tudo o que eles significam, tudo o que está quebrado e sem amor, pois
estamos comprometidos com a dor e a alegria do mundo.
Um Vislumbre do Cristo, Daniel Bonnell, óleo sobre tela, Georgia,
Estados-Unidos.
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