Os transbordamentos de amor acontecem
sobretudo nas encruzilhadas da vida, em momentos de abertura, fragilidade e
humildade, quando o oceano do amor de Deus arrebenta os diques da nossa
autossuficiência e permite, assim, uma nova imaginação do possível (Papa
Francisco).
Ramos e Paixão do Senhor 28.03.2021
Is
50, 4-7 Fl 2, 6-11 Mc 15, 1-39
ESCUTAR
O Senhor abriu-me os ouvidos; não lhe resisti nem voltei atrás (Is 50, 5).
Ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens (Fl 2, 7).
Eles tornaram a gritar: Crucifica-o! (Mc 15, 13).
MEDITAR
E então ele foi suspenso sobre a cruz e um título foi fixado, indicando quem era que estava sendo executado. Doloroso é dizer, mas mais terrível é não dizer... Ele que elevou a terra é elevado, ele que fixou os céus é fixado, ele que firmou todas as coisas é firmado ao madeiro; o Senhor é ultrajado; Deus é assassinado.
(Melito de Sardes, - c.180, Anatólia)
ORAR
Requer-se algum esforço de imaginação para compreender o grau
singular de repugnância pública causado pela crucificação como um método de
execução. Porém, devemos fazer este esforço com a intenção de compreender mais
profundamente o significado do termo grego skandalon (“obstáculo”,
“cilada”) que o apóstolo Paulo usa, como na frase “o skandalon da cruz”
(Gl 5, 11). Muitos de nós somos condicionados a pensar a morte de Jesus
como um escândalo, quando de fato não é a morte em si, mas o modo da
morte que cria a ofensa. A maneira da morte de Jesus tem selado o caráter da fé
em todos os tempos. Ele mesmo a fez central quando disse a qualquer um que fosse
seu discípulo: “tome a sua cruz e siga-me”. Falar de uma crucificação é falar
de uma morte como escravo. “Desprezado e rejeitado pelos homens... ao vê-lo os
homens cobriam o rosto, desprezado, nós o tomamos por nada (Is 53, 3). Assim, o
Filho de Deus entrou em solidariedade com os mais desamparados e menores, os
esquecidos e sem nome, “a escória de todos” (1 Cor 4, 13). A crucificação era
designada especificamente para ser o último insulto à dignidade pessoal, a
última palavra em humilhação e tratamento desumano. Degradação era a meta
principal. Nas palavras de Bonhoeffer, “Deus se deixa ser expulso para fora
do mundo sobre a cruz”. Ele escreveu esta passagem oito meses antes de sua
execução, logo ela tem um excepcional poder. O prisioneiro de Adolf Hitler
continua: “[Cristo] está fraco e impotente no mundo e este é precisamente o
caminho, o único caminho, no qual ele está conosco e nos acode. Mateus 8, 17
deixa muito claro que o Cristo nos acode não pela virtude de sua onipotência,
mas pela virtude de sua fraqueza e sofrimento.... Isto é o inverso do que os
homens religiosos esperavam de Deus. O homem é convocado a partilhar dos
sofrimentos de Deus pelas mãos de um mundo sem Deus”. Jesus tomou para si o
papel do Último dos últimos. Ele aceitou se tornar o menor entre a escória
humana. E os impulsos maléficos da raça humana se concentraram sobre ele. A
crucificação, como método totalmente vil, foi pior do que qualquer um de nós
hoje pode absolutamente imaginar. Refletir sobre isso, entretanto, pode nos
ajudar, sob a orientação do Espírito, a nos atrair para mais perto deste ato
inimaginável do amor de Deus por toda humanidade por meio da mors turpissima
crucis (Orígenes). A cruz é ofensiva a todo mundo, às pessoas
religiosas (“Judeus”) e, da mesma maneira, às pessoas seculares (“Gregos”). É
este rebaixamento radical para quem está dentro e para quem está fora que torna
a cruz tão profundamente ameaçadora para muitos. Toda realização humana,
especialmente a realização religiosa, é colocada em questão pela impiedade da
morte de Jesus. Se Deus, nas três pessoas, é mais plenamente revelado a nós
pela morte amaldiçoada do Filho fora da comunidade dos piedosos, isto
significa que se deve repensar por completo o que normalmente se chama de
religião.
(Fleming Rutledge, 1937-, Estados Unidos)
CONTEMPLAR
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