segunda-feira, 15 de março de 2021

O Caminho da Beleza 18 - V Domingo da Quaresma

Os transbordamentos de amor acontecem sobretudo nas encruzilhadas da vida, em momentos de abertura, fragilidade e humildade, quando o oceano do amor de Deus arrebenta os diques da nossa autossuficiência e permite, assim, uma nova imaginação do possível (Papa Francisco).

V Domingo da Quaresma                    21.03.2021

Jr 31, 31-34            Hb 5, 7-9                 Jo 12, 20-33

 

ESCUTAR

“Imprimirei minha lei em suas entranhas e hei de inscrevê-la em seu coração” (Jr 31, 33).

Na consumação de sua vida, tornou-se causa de salvação eterna para todos (Hb 5, 9).

“Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto” (Jo 12, 24).

 

MEDITAR

Tu és, ó Cristo, o único

homem que sucumbiu por seu intento,

triunfador da morte, pois que a vida

por Ti se enalteceu. E desde então

tua morte por Ti nos vivifica,

por Ti a morte se fez nossa mãe,

por Ti a morte agora é amparo doce

que dulcifica esse amargor da vida;

por Ti, o Homem morto que não morre

branco qual lua em plena noite. A vida

é sonho, Cristo, e a morte é a vigília.

Enquanto a terra solitária sonha,

a branca lua vela, e vela o Homem

em sua cruz, enquanto os homens sonham;

vela o Homem sem sangue, o Homem branco

como a lua a velar na noite negra;

vela o Homem que deu todo o seu sangue

para que as gentes saibam que são homens.

Tu salvaste da morte. Abre teus braços

A essa noite, que é negra e muito bela,

porque o sol da vida a contemplou

com seus olhos de fogo e fez a noite

morena, sim o sol, e tão formosa.

Como é formosa a lua solitária,

a branca lua na estrelada noite

negra, igual à frondosa cabeleira

negra do nazareno. E a branca lua

como o corpo do Homem na cruz, espelho

do sol da vida, o sol que nunca morre.

Os raios, Mestre, de tua luz suave

nos guiam pela noite deste mundo,

a nós ungindo com a esperança régia

de um dia eterno. Noite carinhosa,

oh! noite, mãe de nossos brandos sonhos,

mãe da esperança, oh! nossa doce Noite,

noite escura da alma, és a nutriz

da esperança no Cristo salvador!

(Miguel de Unamuno, 1864-1936, Espanha)


ORAR

   Deus não é primeiramente o Todo-Poderoso: ele é primeiramente Amor. Eu digo isso balbuciando porque não há “primeiramente” em Deus; mas eu procuro dizer, mais ou menos, que Deus só pode agir como Deus se ele age conforme seu ser que é Amor. E o Amor não é violência nem despotismo, mas sussurro, proximidade, excitação, chamado. O Amor não se estabelece por via de decreto, nem por humilhação, mas por uma iniciativa que situa Deus ao lado dos homens: pela encarnação redentora. Deus toma para si o sofrimento e o faz seu, num gesto de abnegação de si... É no aniquilamento de si que ele se torna senhor e vencedor do mal, do pecado e da morte. Ele não triunfa, mais uma vez, pelo poder de sua majestade e esplendor de sua glória, mas pelo todo-poderoso de sua impotência. O grão de trigo está morto na terra: Jesus aplicou sobre si tudo o que disse sobre a morte como semente de vida. Em sua morte, celebramos a ressurreição dos homens e do mundo. Em seu sofrimento, descobrimos a verdadeira face de Deus. Por nossa parte, resistimos a aceitar o sofrimento como parte integrante de nossa vida cristã e do nosso crescimento espiritual. Quando o sofrimento se apresenta, não importa sob que forma, tenho a tentação de virar logo a página, de não me deixar invadir por ele, de não beber o cálice até a última gota. Não é preciso se envergonhar desta fraqueza: no Jardim das Oliveiras, Jesus também foi tentado a fugir. Ele nos pede, a despeito de toda a nossa repugnância, que acolhamos o sofrimento como um mensageiro de Deus e que o assumamos como uma atitude de profunda humildade, em resposta ao convite sagrado: “inclinai-vos sob a mão poderosa de Deus para que ele vos eleve no tempo de sua visita”. Justificamos muito facilmente o recuo diante do sofrimento, dizendo que não é necessário nos deixar imergir em águas amargas e que há o perigo de ali se abrirem as comportas ao desencorajamento, à depressão e à neurastenia. Seria com efeito um perigo se o sofrimento fosse recebido e vivido como um fechamento sobre si mesmo; mas se ele é reconhecido como um encontro misterioso com Alguém que nos ama, como um encontro secreto com Deus, então é preciso deixar a Deus a solicitude de terminar o diálogo e de não precipitar o fim. É preciso que a palavra de Deus, que se esconde nele, nos burile pouco a pouco e nos livre de nós mesmos. Como se extrai o ouro do minério bruto.

(Léon-Joseph Suenens, cardeal, 1904-1996, Bélgica)

 

CONTEMPLAR

Despertar, 2019, Eva, uma jovem refugiada da Armênia, Tomek Kaczor, Gazeta Wyborcza/World Press Photo 2020, Polônia.




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