A palavra de
Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).
XXXIII Domingo do Tempo Comum 15.11.2020
Pr 31, 10-13.19-20.30-31 1 Ts 5, 1-6 Mt 25, 14-30
ESCUTAR
MEDITAR
E que meu olhar, bem reto, desperte uma
fome de pureza.
Faze que não seja nunca um olhar
desiludido, desabusado, desesperado.
Mas saiba admirar,
Extasiar-se, contemplar.
Dá-me aos olhos a graça de saberem
fechar-se para melhor te encontrar,
Mas que nunca se afastem do Mundo por medo.
Dá-me olhar a graça de ser bastante
profundo para reconhecer tua presença no Mundo.
E faze que jamais meus olhos se fechem à
miséria dos homens.
Que meu olhar, Senhor, seja limpo e firme,
Mas saiba enternecer-se,
E que meus olhos sejam capazes de chorar.
Faze que meu olhar não suje o que tocar,
Não perturbe, mas serene,
Não entristeça, mas semeie a Alegria,
Não seduza para guardar cativo,
Mas convide e arraste à superação de si
mesmo.
Faze que meu olhar transtorne, por ser um
encontro, o encontro de Deus.
Que seja o apelo, o toque de clarim que
mobilize toda a gente cada qual à soleira da porta,
Não por causa de mim, Senhor,
Mas porque vais passar.
Para que meu olhar seja tudo isso, Senhor,
Uma vez mais, esta noite,
Eu te dou a minha alma,
Eu te dou o meu corpo,
Eu te dou os meus olhos,
Para que ao olhar os homens, meus irmãos,
Sejas tu quem os olhe
E de dentro de mim lhes acene.
ORAR
Hoje,
em nossa sociedade ocidental ultra-desenvolvida, é surpreendente constatar a
que ponto alguns se satisfazem em não assumir nenhum risco e que nada se altera
em suas vidas. Eles são absolutamente “imóveis”. O homem vive, todavia, numa
sociedade que, globalmente, mesmo se pensando nos atuais atos terroristas, é
menos perigosa que a da Idade Média e, menos ainda, que a de Jesus. Isso nos
faz crer que quanto mais o homem se habitua à segurança e ao seu bem-estar mais
ele recusa o risco. Alguns preferem mesmo morrer do que viver! Viver é assumir
o risco de se ferir, de ficar frustrado, de sofrer pelo outro. Morrer é
evitar de ter que se confrontar com a realidade do outro e de destruir
uma imagem ideal de si mesmo por meio da qual nos amamos e nos identificamos. Um
ser pode se deixar prender, sem o saber, nas malhas da rede invisível de tudo
possuir e se interditar de assumir o risco de viver a aventura do outro,
com o risco de morrer por isso! Resta que entre os que têm a paixão de viver o
risco da aventura e os que preferem morrer antes de viver, há todos esses
“fantasmas” da vida, que se encontram em nosso caminho, que decidiram não se
colocar questões, aproveitar-se do tempo que passa (e dos outros), salvar-se de
“todo risco” esperando morrer um dia, o mais tarde possível, que recusam o
inesperado que poderia colocar em questão todas as proteções que reúnem tão
arduamente ao redor de si. Foi assim que um paciente me disse um dia: “Eu só
procuro durar”. A sociedade não fabrica cada vez mais “assistidos” que só
pensam em proteger o que adquiriram em nome da solidariedade, mas que em nenhum
caso seriam capazes de partilhar com aqueles que se achassem em necessidade? Em
que medida conseguiríamos escapar desta força social centrífuga que se nutre de
nossa vontade de não perder e que nos conduz sem cessar a esse famigerado
“reflexo de segurança”? Ao inverso, existem pessoas que empreendem, que
inventam, que inovam no cenário da sociedade. São essas que assumem o risco da
aventura interior, que aceitam acolher o estrangeiro que há nelas, que fazem
aliança com ele e que tiram finalmente sua energia deste encontro com o outro
para partir para a descoberta do homem e do mundo. Visivelmente, Jesus foi um
homem desta têmpera. Alguns santos também. Seria desejável retirar o véu em que
foram colocadas suas biografias durante muitos séculos para reencontrar o vigor
desses homens e mulheres de ação e redescobrir a propósito deles o sentido da
palavra “notável”. Na parábola dos talentos, Mateus nos ecoa um Jesus que
desenvolve uma verdadeira filosofia da ação da qual se destaca uma
espiritualidade: uma maneira de ser para o outro e, por meio dela, para
o mundo e para Deus. Jacques Maritain sublinhava: “A ação é uma epifania do
ser”.
CONTEMPLAR
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