segunda-feira, 31 de agosto de 2020

O Caminho da Beleza 42 - XXIII Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).

XXIII Domingo do Tempo Comum            06.09.2020

Ez 33, 7-9                Rm 13, 8-10                       Mt 18, 15-20

 

ESCUTAR

“Logo que ouvires alguma palavra de minha boca, tu os deves advertir em meu nome” (Ez 33, 7).

O amor não faz nenhum mal contra o próximo (Rm 13, 10).

“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou aí, no meio deles” (Mt 18, 20).

 

MEDITAR

O amor não tem nada de condescendência. Ele é “duro como a morte”, segundo a palavra do Cântico. Agradar é muitas vezes o contrário de fazer o bem. O amor verdadeiro é implacável. Não ama as fraquezas, ama apesar e contra elas, ele apruma. Porém a sua dureza é a do amor, ele é confiança, abrigo, sustento. Busca-se a violência na ironia ou no insulto, mas é o amor que é verdadeiramente duro. Duro com os outros, mas primeiro consigo próprio. Duro como o diamante, lúcido, transparente e que vai até o fundo. Duro, mas não ofensivo. A violência mata, a ironia alfineta, o amor penetra o coração e cura.

(Jean Daniélou, 1905-1974, França)

 

ORAR

   Entre o Egito e o deserto, entre a escravidão e a liberdade, estende-se uma linha de demarcação. É o momento do ato decisivo pelo qual nos tornamos homens novos, estabelecidos numa situação moral totalmente nova. Em termos geográficos, foi o Mar Vermelho, mas na oração do Senhor é o “Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós somos perdoados”. Esse “como nós somos perdoados” representa o momento em que alcançamos nossa salvação com as próprias mãos, pois tudo o que Deus faz depende do que nós fazemos; e isso é de uma extrema importância na vida cotidiana. Se recusamos o perdão, colocamos em xeque o mistério do amor, nós o recusamos e não há lugar para nós no Reino. Não podemos ir muito longe se não somos perdoados e não podemos ser perdoados por muito tempo também se não perdoamos a todos os que nos fizeram mal. É perfeitamente claro, nítido e preciso que ninguém pode imaginar estar no Reino de Deus, e pertencer a ele, se a recusa de perdoar reside em seu coração. Perdoar a seus inimigos é a primeira característica do cristão, a mais elementar. Se faltamos com isso, não somos cristãos por inteiro, ainda erramos pelo deserto seco do Sinai. Mas perdoar é uma coisa extremamente difícil. Admitir o perdão em um momento em que se sente o coração cheio de mansidão ou num élan de afetividade é relativamente fácil. Mas bem poucas pessoas sabem exercê-lo sem repreender. Com efeito, o que chamamos perdão consiste muitas vezes em colocar o outro à prova e nada mais. E ainda, as pessoas perdoadas ficam felizes quando se trata somente de uma prova e não de um retorno. Esperamos com impaciência os testemunhos de arrependimento, queremos estar seguros que o penitente não é mais o mesmo, mas esta situação pode durar toda uma vida e nossa atitude é absolutamente contrária a tudo o que ensina o Evangelho e, na verdade, a tudo o que ele nos manda. Assim, a lei do perdão não é a de um riacho fino na fronteira entre a escravidão e a liberdade; ela é larga e profunda, é a do Mar Vermelho. Os judeus não o atravessaram graças aos seus próprios esforços e sobre os barcos feitos com mãos humanas. O Mar Vermelho se entreabriu pelo poder de Deus. É preciso que Deus os ajude a atravessá-lo. Mas para ser conduzido por Deus, deve-se comungar com esta qualidade de Deus que é a capacidade de perdoar.

(Antoine Bloom, 1914-2003, Suíça)

 

CONTEMPLAR

Menino italiano ajuda a atravessar a praça a seu amigo, que perdeu a perna durante bombardeio das forças aliadas a Nápoles, em 1943, a foto é de 1944, autoria desconhecida, Itália, em histomania.org/photo/7470.




 

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

O Caminho da Beleza 41 - XXII Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


XXII Domingo do Tempo Comum              30.08.2020

Jr 20, 7-9                Rm 12, 1-2              Mt 16, 21-27

 

ESCUTAR

Seduziste-me, Senhor, e deixei-me seduzir (Jr 20, 7).

Não vos conformeis com o mundo, mas transformai-vos (Rm 12, 2).

“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16, 24).

 

MEDITAR

É realmente verdade que a Cruz significa evasão para fora do Mundo sensível e, mesmo num certo sentido, rutura com esse Mundo. No final da ascensão a que nos convida, ela força-nos a transpor um plano, um ponto crítico, onde já não tocamos com os pés a zona das realidades sensíveis. Este “excesso” final, vislumbrado e aceito desde os primeiros passos, projeta necessariamente uma luz e um espírito particulares sobre todos os nossos passos. E eis aí em que consiste precisamente a loucura cristã em contraste com os “sábios” que não querem arriscar por um total “Além” nenhum dos bens que têm atualmente nas mãos... O caminho real da Cruz é muito exatamente o caminho do esforço humano, sobrenaturalmente retificado e prolongado. – Por termos compreendido plenamente o sentido da Cruz, já não nos arriscamos a pensar que a vida é triste e feia. Simplesmente tornamo-nos mais atentos à sua indizível seriedade... Para o cristão, não se trata de desaparecer na sombra da Cruz, mas subir na luz da Cruz.

(Teilhard de Chardin, 1881-1955, França)

 

ORAR

      Se alguém quiser caminhar comigo que renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga. O que o Senhor pede parece duro e penoso: se alguém quiser caminhar com ele, que renuncie a si mesmo! Mas isso na realidade não é duro e penoso porque aquele que pede é aquele que ajuda a realizar o que pede. Pois é verdadeira também a palavra do salmo: “por causa da palavra de teus lábios segui caminhos penosos” (17, 4). E é verdadeira também a palavra que ele próprio pronunciou: “Meu jugo é fácil de carregar e meu fardo é leve” (Mt 11, 30). O que significa: Tome sua cruz? Carregue tudo o que é penoso: em seguida siga-me. Pois, quando ele começar a me seguir, conformando sua conduta a meus mandamentos, ele terá muitas pessoas para contradizê-lo, muitos para se opor a ele, muitos para desencorajá-lo. E estes agirão também intitulando-se companheiros do Cristo. Eles caminhavam com o Cristo, estes que impediam os cegos de gritar. Quer se trate de ameaças, de adulações ou de interdições, se queres seguir o Cristo mude tudo isso na cruz; paciente, tolerante, não se deixe abater! Estamos num mundo que é santo, que é bom, reconciliado, salvo, ou melhor a salvar, mas remido desde agora em esperança – porque nós estamos salvos, mas em esperança. Nesse mundo, então, isto é, na Igreja, que segue inteira o Cristo, ele diz a todos: “Aquele que quer caminhar a meu lado, renuncie a si mesmo”. Que ela o siga totalmente, ela que é única, ela que é a pomba, ela que é a esposa; que ela o siga, ela que é remida e ornada pelo sangue do Esposo. Seus membros que têm aqui seu lugar, que sigam o Cristo cada um conforme sua categoria, sua classe, cada um à sua maneira. Que renunciem a si próprios, ou seja, que não se apoiem sobre si próprios, que carreguem sua cruz, ou seja, que suportem no mundo, pelo Cristo, tudo o que o mundo lhes infligirá. Que amem a ele, o único que não engana, o único que não se engana, o único que não mente: que o amem porque o que ele promete é verdadeiro. Mas porque ele não cumpre agora, a fé vacila. Continue, persevere, suporte, aceite essa demora e você, então, carregou sua cruz.

(Agostinho de Hipona, 354-430, Argélia atual)

 

CONTEMPLAR

Romaria do Bom Jesus da Lapa, 1982, Bahia, Adenor Gondim (1950-), Bahia, Brasil.



segunda-feira, 17 de agosto de 2020

O Caminho da Beleza 40 - XXI Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


XXI Domingo do Tempo Comum                23.08.2020

Is 22, 19-23            Rm 11, 33-36                     Mt 16, 13-20

 

ESCUTAR

“Eu o farei levar aos ombros a chave da casa de Davi; ele abrirá, e ninguém poderá fechar; ele fechará, e ninguém poderá abrir” (Is 22, 22).

Ó profundidade da riqueza, da sabedoria e da ciência de Deus! Como são inescrutáveis os seus juízos e impenetráveis os seus caminhos! (Rm 11, 33).

“Tudo o que tu ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que desligares na terra será desligado nos céus” (Mt 16, 19).

 

MEDITAR

“Ama-me mais, Senhor, para te querer”.

Busca-me mais, para melhor te achar.

Desassossegue-me, por não te buscar.

Desassossegue-me, por te reter.

 

Poda-me mais, para mais te florescer.

Desnuda-me, para não te encobrir.

Ensina-me a acolher, para te esperar.

Olha-me em todos, para em todos te ver.

 

Como te deixar ser só Tu mesmo,

sem te reduzir, sem te manipular?

Como, crendo em Ti, não te proclamar

igual, maior, melhor que o cristianismo?

 

(Pedro Casaldáliga, 1928-2020, Catalunha/Brasil)

 

ORAR

       Tu és o Cristo, declara Pedro. Tu és Pedro, responde em eco Jesus no vivo da conversação, sem dúvida a mais altamente paritária que o Evangelho nos há relatado, esse entre-dois, esse diá-logo às vezes dinâmico e franco sendo decididamente o espaço no qual se desvela todo o mistério e todo o ministério da Igreja. Eu te darei as chaves, prossegue Jesus. Tudo o que desligares sobre a terra, será desligado nos céus. Eis San Pietro in Vincoli, tal como Roma o venera, em outro lugar que aquele, presumido, de sua Confissão. Pedro, preso nos laços que seu Senhor lhe faz entrever como seu futuro: quando fores velho, estenderás as mãos e um outro te cingirá e te levará para onde não queres ir (Jo 21, 18). Pedro cortando os laços que entravavam todo o elán pessoal ou coletivo em direção ao seu Senhor, tendo de início desatado a si próprio: Eu sou teu servo, o filho de tua serva. Quebrastes os meus grilhões. Vou te oferecer o sacrifício da ação de graças (Sl 115, 16-17). O anjo tocou Pedro no ombro e o acordou: “Levanta-te! Depressa!”, disse-lhe. E as correntes caíram-lhes das mãos (At 12, 7). Pedro ligado e desligado, não segundo seu capricho, mas para a realização do serviço universal que seu Senhor lhe confiou. E notemos bem que há uma ordem, ou mais exatamente que o gesto de ligar está aqui ordenado a um certo gesto de desligar mais fundamental; que o ligar é correlativo a um desligar mais compreensivo e mais vasto. Porque, no momento em que ele prende os homens à sua rede, a vocação de Pedro é a de colocá-los em liberdade (Lc 5, 10). Agi, ele disse, como homens livres, não como homens que fazem da liberdade um véu sobre sua malícia, mas como servos de Deus (1 Pd 2, 16). E a vocação da Igreja construída sobre Pedro é naturalmente fazer entrar a humanidade na liberdade da glória dos filhos de Deus (Rm 8, 21), nessa liberdade que temos em Cristo Jesus (Gl 2, 4), segundo as expressões de Paulo. Instância maior da libertação no coração do homem e no coração da história (se bem que certos membros seus possam falhar sempre nesta tarefa ou ofuscar a claridade dessa imagem), a Igreja está fundamentalmente a serviço do Cristo-Verdade que torna livre (Jo 8, 32; 14, 6). Portadora da vida de seu Senhor ressuscitado, ela oferece aos homens, em particular pelos sacramentos, os meios de viver segundo a lei do Espírito que dá a vida em Cristo Jesus e que liberta da lei do pecado e da morte (Rm 8, 2). Discípula d’Aquele que abre o espírito à inteligência das Escrituras (Lc 24, 45), ela se abre a si mesma como um espaço de interpretação viva da Palavra. Ela nos faz livres entre as palavras, como entre os mortos. Livres no meio das tentações e das tribulações do mundo, para que o mundo inteiro possa exclamar, como o rei Nabucodonossor diante das três pessoas jovens que ele lançou amarradas na fornalha: eu vi homens em liberdade que passeavam em meio ao fogo (Dn 3, 23-24). Amém.

(François Cassingena-Trévedy, 1959-, França)

 

CONTEMPLAR

O cavaleiro tímido, 1958-59, entre Los Angeles e a Cidade do México, William Tynan (1930-2016), Estados Unidos, Monochrome Photography Awards, 2014.



segunda-feira, 10 de agosto de 2020

O Caminho da Beleza 39 - Assunção de Nossa Senhora

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


Assunção de Nossa Senhora              16.08.2020

Ap 11, 19; 12, 1.3-6.10                 1 Cor 15, 20-27                  Lc 1, 39-56

 

ESCUTAR

O dragão parou diante da mulher, que estava para dar à luz, pronto para devorar o seu Filho, logo que nascesse (Ap 11, 4).

É preciso que ele reine até que todos os seus inimigos estejam debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte (1 Cor 15, 25-26).

“Ele mostrou a força de seu braço: dispersou os soberbos de coração. Derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes” (Lc 1, 51-52).

 

MEDITAR

“Miriam, sabes o que é a graça?” “Não exatamente”, respondi. “Não é um modo de andar atraente, não é o porte altivo de certas mulheres, que gostam de se exibir. É a força sobre-humana de enfrentar o mundo sozinha, sem esforço, desafiá-lo para um duelo completo sem nem sequer se despentear. Não é algo feminino, é dote de profetas. É um dom, e tu o recebeste. Quem o possui está libertado de qualquer temor. Eu o vi em ti na noite do encontro, e desde então o tens sobre ti. És cheia de graça. Ao teu redor há uma barreira de graça, uma fortaleza. Tu a espalhas, Miriam: até mesmo sobre mim”. Eram palavras que mereciam abraços.

(Erri de Lucca, 1950-, Itália)

 

ORAR

            Duas mulheres, uma jovem e uma velha, duas criaturas insignificantes, desconhecidas, que ignoravam todos os problemas da humanidade, da existência e da essência do mundo, de seu poder e de seus demônios! O que fazem aqui a pequena Maria e a velha Isabel? O que, pois, o mundo tem a mais? Nada, absolutamente nada, senão que elas estão ali e quando dizemos nada se mudou, contudo, em segredo, uma nova criação apareceu. Maria e Isabel estão inseparavelmente ligadas, não somente porque são parentes, mas em virtude da unidade da promessa recebida, em virtude da graça que elas encontraram em Deus. Elas se saúdam uma a outra. Que incomparável saudação! A de pessoas humanas que se reconhecem porque receberam a promessa de Deus! A Igreja está ali, ali onde duas pessoas insignificantes, duas simples mulheres, estão ligadas estreitamente, unidas na esperança que, pela palavra de Deus, entrou em seus corações. Porque nesta esperança, aquele que esperam já está presente. Ali onde estão Maria e Isabel, está o Salvador, está Deus. Ali está também João Batista. Tudo isto está presente; já é, na verdade, um acontecimento, secreto, mas real no encontro dessas duas mulheres, dessas duas futuras mães. O Salvador está ali e João o saúda desde o ventre de sua mãe. Cada palavra de Isabel é uma palavra que ela diz ao Cristo, já em nome de seu filho João. Se Maria é bendita entre todas as mulheres, é bendito o fruto de seu corpo. “E Maria respondeu: Minha alma engrandece o Senhor e meu espírito se alegra em Deus meu Salvador”. Como escreveu Lutero, é obra de Deus que uma alma engrandeça o Senhor. É sempre um milagre, segundo a Santa Escritura, que Deus aceite um ser humano e que este possa dizer minha alma engrandece o Senhor! Porque, o que significa engrandecer o Senhor? Temos necessidade de engrandecê-lo? Ele, o Altíssimo, não tem necessidade de que o exaltemos. Entretanto, a Santa Escritura nos diz que é melhor assim, que isso faz parte do rebaixamento de Deus a nós, por seu amor, que ele quer ser engrandecido por nós e que esta graça nos é feita: a de engrandecer Deus!... “Meu espírito se alegra”. A alegria é a coisa mais rara no mundo, a mais extraordinária. Encontramos no mundo demasiada austeridade, entusiasmo fanático e zelo sem humor. Mas e a alegria? É que é raro o conhecimento do Deus vivo. Em Deus, nosso Salvador, quando o encontramos ou quando ele nos encontra, nele está a alegria, como diz Maria... Nossa vocação é estarmos ao lado de Maria. Pois esta alegria, esta elevação da alma pode ser também, a cada momento, a nossa alegria. Só temos que fazer uma única coisa, como Maria: deixar Deus agir. “Que me seja feito segundo tua palavra”.

(Karl Barth, 1886-1968, Suíça)

 

CONTEMPLAR

Quando sou uma mulher velha..., 2008, Ola Surdacka (1990-), Lublin, Polônia.



sábado, 8 de agosto de 2020

Pedro Casaldáliga (1928-2020)

 

Pedro Casaldáliga fez a sua páscoa hoje, 08 de agosto, festa de São Domingos. Ele fez um último pedido: o de ser enterrado perto dos marginalizados a quem sempre defendeu. Em São Félix do Araguaia, no cemitério dos Karajás, à beira do rio, debaixo de um pé de pequi, entre um peão e uma prostituta. Ele sabia, como profeta, que eles e elas nos precedem no Reino de Deus (Mt 21, 31).

 

 

“Ama-me mais, Senhor, para te querer”.

Busca-me mais, para melhor te achar.

Desassossegue-me, por não te buscar.

Desassossegue-me, por te reter.

 

Poda-me mais, para mais te florescer.

Desnuda-me, para não te encobrir.

Ensina-me a acolher, para te esperar.

Olha-me em todos, para em todos te ver.

 

Como te deixar ser só Tu mesmo,

sem te reduzir, sem te manipular?

Como, crendo em Ti, não te proclamar

igual, maior, melhor que o cristianismo?

 

(Pedro Casaldáliga, 1928-2020, Catalunha/Brasil)


segunda-feira, 3 de agosto de 2020

O Caminho da Beleza 38 - XIX Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


XIX Domingo do Tempo Comum                09.08.2020

1 Rs 19, 9.11-13                 Rm 9, 1-5                Mt 14, 22-33

 

ESCUTAR

Depois do fogo, ouviu-se o murmúrio de uma leve brisa. Ouvindo isso, Elias cobriu o rosto com o manto, saiu e pôs-se à entrada da gruta (1 Rs 19 12-13).

Irmãos, não estou mentindo, mas, em Cristo, digo a verdade, apoiado no testemunho do Espírito Santo e da minha consciência (Rm 9, 1).

“Coragem! Sou eu. Não tenhais medo!” (Mt 14, 27).

 

MEDITAR

O que separa sempre é o eu, é a posse. Quando estamos despojados de tudo, tornamo-nos um espaço livre e o mundo inteiro pode se abrigar ali.

(Maurice Zundel, 1897-1975, Suíça)

 

ORAR

Onde está teu Deus? Era a interpelação que um não crente do passado lançava ao salmista em oração. Onde está nosso Deus? É também a questão que nós nos colocamos, às vezes, diante de um acontecimento particularmente odioso que nos escandalizou, um revés ou uma tristeza que nos marcou, diante de um sofrimento imprevisto. “Senhor, onde estás? Que fazes? Onde está nosso Deus?  É a questão que o profeta Elias, perseguido, ameaçado de morte, se colocava fugindo para o Horeb, a montanha onde Deus havia falado antes a Moisés. E ali, lentamente, Elias toma consciência que Deus não está nos triunfos espetaculares que nós desejamos, nem nos tremores de terra ou nos ciclones dos quais nos falam as mídias e que nos inquietam... Não, Deus não está ali de jeito nenhum. Onde está nosso Deus? Elias compreende que Deus está no “silêncio de uma brisa leve” que nos fala a Bíblia, isto é, no silêncio da oração na qual se adivinha o sopro do Espírito. Elias compreende então que Deus o espera ali, que ele o envia ao comum de sua vida, ao comum de sua responsabilidade como profeta. Deus está sempre lá onde nós temos nossas responsabilidades cotidianas. Onde está nosso Deus? Jesus, após ter alimentado a multidão no deserto, retirou-se só à montanha para orar. Mas durante o tempo em que estava lá, seus apóstolos estão presos na tempestade do lago Tiberíades. A Igreja, ao longo dos séculos, será sempre agredida pelas tempestades da história que a sacodem. Então, Jesus vem, ele está lá; ele está sempre com seus apóstolos, sempre com sua Igreja. Mas nós o esquecemos, o tomamos por um fantasma, temos medo. Ele se dispôs a nos reanimar, reanimar nossa fé: “Coragem! Sou eu, não tenhais medo! Porque todas essas dúvidas e todos esses medos?” Onde está nosso Deus? Mas ele está sempre conosco, sempre pronto a nos estender a mão como fez com Pedro sobre as águas. Ele não está lá para nos afastar das tempestades e tumultos do mundo, mas para nos ensinar a enfrentá-los com confiança. Ele não quer agir em nosso lugar, mas nos confirmar em nossas responsabilidades e na fé de sua presença sempre fiel. Onde está vosso Deus? Ele está aí quando vocês o alcançam no silêncio da oração; ele está aí, como com Elias, para enviá-los às suas diversas responsabilidades de homens ou mulheres, porque é lá também que ele os espera... Onde está nosso Deus? Ele está em nós. Nós o alcançamos no silêncio da oração. E ele nos reenvia à nossa vida cotidiana, é lá que ele nos espera, na família, no trabalho, em nossas festas... Ele está em nossos encontros de amigos que nos fazem tanto bem.

(Bernard Prévost, 1913-?, França)

 

CONTEMPLAR

Raio de luz, 2018, Alberto Cicchini (1968-), Itália, World’s Top 10 Black & White Photo Contest 2018.