O Caminho da Beleza 48
Leituras para a
travessia da vida
“A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o
tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também
reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à
liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).
“Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu
prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).
“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara,
1999, dias antes de sua passagem).
XXIX Domingo do Tempo Comum 21.10.2012
Is 53, 10-11 Hb 4, 14-16 Mc 10, 35-45
“Meu
Servo, o justo, fará justos inúmeros homens, carregando sobre si suas culpas” (Is
53, 11).
“Aproximemo-nos
então, com toda a confiança, do trono da graça, para conseguirmos misericórdia
e alcançarmos a graça de um auxílio no momento oportuno” (Hb 4, 16).
“Quem
quiser ser grande, seja vosso servo; e quem quiser ser o primeiro, seja o
escravo de todos” (Mc 10, 43-44).
MEDITAR
“A
inteligência é insípida sem altruísmo” (Michel Bouthot).
"Você não pode tornar Deus
católico... Certamente, as pessoas precisam de regras e de limites... Mas Deus
tem o coração sempre maior" (Cardeal Martini).
ORAR
Os textos deste domingo nos colocam diante
do valor fundamental da nossa sociedade atual: o status e o poder. O
evangelista, ao narrar o pedido dos filhos de Zebedeu, denuncia o fisiologismo, a busca da satisfação de
interesses, de vantagens pessoais ou partidárias, em detrimento do bem comum:
queimando todas as etapas do seguimento de Jesus, sobretudo a cruz, os dois
pediam para estar, lado a lado, na glória
do Senhor. A ambição do poder rompe todo e qualquer princípio, transforma-se
numa violenta injustiça porque corrompe as pessoas, gera a discriminação,
legitima a traição, incentiva a divisão, estimula o cinismo e aguça os preconceitos
que amarram a vida, diminuindo a nossa própria humanidade. O pedido é
sumariamente recusado e Jesus os faz descobrir a condição para o acesso à
glória: o servir a todos. Jesus não estabelece uma regra para vencer na vida,
mas traça o caminho do seguimento. Servir
não é desaparecer, nada fazer, dar algumas poucas horas voluntárias ou recusar
responsabilidades. Servir é
tornar público o nosso testemunho de amor ainda que sejamos vítimas do ardil
das pessoas que só pensam em si mesmas, como Tiago e João. O caminho da cruz
não é feito de um dolorismo, como muitas vezes somos levados a pensar. O
caminho da cruz não é um sofrer,
mas é, antes de tudo, um servir.
A pedagogia de Jesus, como uma sinfonia, vai num crescendo: primeiro, devemos
tomar a nossa cruz e arriscar a nossa vida pelo Evangelho; depois viver entre
irmãos num testemunho de amor fraterno e, finalmente, assumirmos a identidade
com o Cristo-Servo até o dom da sua vida por todos. Jesus tinha uma verdadeira
repulsa contra a ambição entre seus discípulos: “Sabeis que os que são considerados chefe das nações as dominam, e os seus
grandes fazem sentir seu poder. Entre vós não deve ser assim. Quem quiser ser o
maior entre vós seja aquele que vos serve, e quem quiser ser o primeiro entre
vós seja o escravo de todos”. Jesus entendia que o ser humano não é
chamado apenas para sobreviver, mas para expandir tanto a plenitude da sua
própria humanidade quanto a do mistério de Deus. Ele nos conclama a possuirmos
tão plenamente a nossa vida que possamos doá-la sem medo. Jesus marca a sua
vida por uma liberdade tão assustadora para os que não são livres que eles se
levantam com ira para destruir o doador da vida. A cruz de Jesus representa,
nestes nossos tempos, essa destruição que ainda acontece nas disputas e nas
guerras religiosas. A cruz revela o poder ameaçador do amor presente na vida
deste homem que se oferece como vítima, como tantos homens e mulheres se
ofereceram por amor aos seus irmãos, sem se importar com seu credo, raça ou status.
Jesus testemunha que uma vida marcada pelo amor é uma vida que se manifesta na
disposição humana de se aventurar além das fronteiras da segurança. Uma vida
que rompe toda e qualquer estagnação e que nos chama a existir, a expandir a
vida que flui por meio de nós. É o amor e o servir que intensificam uma vida
que nunca terá necessidade de se proteger e nem de se justificar, pois ela se
torna a nossa porta de entrada ao infinito e inesgotável poder do amor. Numa
vida assim beber o cálice é sorver, até a última gota, o amor que
conseguimos como entrega e oblação; e ser batizado é mergulharmos no
risco que acarreta de sermos cristãos no mundo de hoje, pois Jesus não está do
lado do triunfo e do sucesso, mas da fraqueza e da morte. E o Cristo não espera
de nós o sucesso, mas a fidelidade. Muitas vezes, o servir e o
amar são um sinal de contradição, praticado por poucos, causando incômodos à opinião
de uma maioria acostumada a ser atendida apenas em seus interesses. Jesus nos
ensina a acolher os dons que recebemos do Pai, a discernir, no Espírito, os
dons alheios e, juntos, colocá-los, de geração em geração, a serviço da
humanidade. Jesus nos ensina a afastar qualquer triunfalismo e a seguirmos
leais diante dos desafios políticos do mundo. Nunca é demais lembramos a frase
do dramaturgo alemão Bertold Brecht após a derrota do nazismo: “Não se alegre com a derrota dele, jovem.
Embora o mundo erguendo-se tenha derrubado o canalha, a cadela que o gerou está
novamente no cio”. Que possamos, como cristãos, diante da
responsabilidade que nos cabe na transformação do mundo, pedirmos: “Pai amoroso, perdoa-nos quando dermos
importância demais àquilo que a Ti pouco importa!”.
CONTEMPLAR
Martírio
de São João Evangelista na Porta Latina, Charles Le Brun, 1641-42,
óleo sobre tela, 282 x 224 cm, Saint-Nicolas du Chardonnet, Paris, França.
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