O Caminho da Beleza 46
Leituras para a travessia da vida
“A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).
“Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).
XXVII Domingo do Tempo Comum 02.10.2011
Is 5, 1-7 Fl 4, 6-9 Mt 21, 33-43
ESCUTAR
“Vou cantar para o meu amado o cântico da vinha de um amigo meu: um amigo meu possuía uma vinha em fértil encosta. Cercou-a, limpou-a de pedras, plantou videiras escolhidas, edificou uma torre no meio e construiu um lagar; esperava que ela produzisse uvas boas, mas produziu uvas selvagens” (Is 5,1-2).
“Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em orações e súplicas. E a paz de Deus, que ultrapassa todo o entendimento, guardará os vossos corações e pensamentos em Cristo Jesus” (Fl 4, 6-7).
“Por isso eu vos digo, o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos” (Mt 21, 43).
MEDITAR
“Não poderíamos sobreviver por muito tempo sem dinheiro, sem vestuário, sem alimento e sem uma casa. Mas, se formos glutões, se recusarmos partilhar o que temos com o faminto e o pobre, transformaremos estes bens numa falsa divindade. Quantas vozes se levantam em nossa sociedade materialista dizendo-nos que a felicidade consiste em acumular a maior quantidade possível de bens e de objetos de luxo. Mas isso significa transformar os bens em falsas divindades. Ao invés de nos trazer a vida, eles nos levam à morte” (Bento XVI, Jornada Mundial da Juventude, Sidney, julho de 2008).
ORAR
A lição do Evangelho é de uma visibilidade plena para os homens e mulheres das igrejas. O abuso mais grave denunciado é a atitude de nos impormos como proprietários absolutos dos dons do Senhor. Usufruímos a vinha, a defendemos com unhas e dentes e reivindicamos direitos e privilégios. No entanto, esquecemos do essencial: que não estamos aqui para explicar, regulamentar, garantir a ordem, valorizar o nosso próprio papel, celebrar triunfos e recordar colheitas gloriosas do passado, mas para produzir frutos.
É verdade que existem as estruturas necessárias – a torre e o lagar – mas elas estão em função dos frutos e não podem tomar o seu lugar. A vinha não nos pertence e nem os frutos são para o nosso benefício. Temos que produzir frutos do Reino: justiça, liberdade, misericórdia, fraternidade, perdão e paz. A vinha está arrendada em vista destes frutos celestes.
Se o amor de Deus pode sofrer as maiores desilusões, as suas fadigas e preocupações nunca serão desperdiçadas. O amor é sempre fecundo. Jesus não pede nada de excepcional, apenas nos sugere, por meio do Espírito, que devemos produzir o possível para merecer o impossível do Pai.
Paulo nos apresenta os frutos: “Ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor”. Estes frutos podem despontar em outras vinhas que também são vinhas do Senhor ainda que não tenham uma placa oficial sobre a porta de entrada. A Declaração do Concílio Vaticano II sobre a relação da Igreja com as religiões não-cristãs é enfática: “A Igreja Católica não rejeita o que é verdadeiro e santo em todas as religiões. Considera suas práticas, maneiras de viver, preceitos e doutrinas como reflexo, não raramente autêntico, da verdade que ilumina todos os seres humanos, ainda que se distanciem do que ela crê e ensina” (Nostra aetate, 2).
A maior tragédia que pode atingir o cristianismo é a de que possa matar a voz dos profetas; que o clero se sinta dono exclusivo da vinha do Senhor e que expulsemos Jesus da sua própria igreja ao abafar o seu Espírito. No entanto, a história do cristianismo tem mostrado que se a Igreja de Jesus não corresponder às esperanças que nela as colocou o seu Senhor, Deus abrirá novos caminhos de salvação por meio de outros povos que produzam frutos na sua vinha.
O Reino de Deus é de Deus e de mais ninguém. Não pertence à hierarquia eclesiástica e nem ao mundo controvertido dos teólogos e especialistas em ciências da religião. O Reino de Deus está no povo que produz frutos de justiça, compaixão e defesa dos mais necessitados: “É por meio da prática daquilo que é bom nas suas próprias tradições religiosas, e seguindo os ditames da sua consciência, que os membros das outras religiões respondem afirmativamente ao convite de Deus e recebem a salvação em Jesus Cristo, mesmo se não o reconhecem como o seu Salvador” (Diálogo e Anúncio, 29, 1991).
Apesar de tudo, sempre fica um resíduo fiel e santo: “Assim também agora, em nossos dias, subsiste um resto, por livre escolha da graça” (Rm 11,5). Meditemos as palavras do poeta Drummond sobre o resto que permanece: “Mas de tudo, terrível, fica um pouco. E sob as labaredas e sob o sarcasmo, e sob a gosma e sob o vômito, e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes, e sob os gonzos da família e da classe, fica sempre um pouco de tudo. Às vezes um botão. Às vezes um rato” (Resíduo).
CONTEMPLAR
A Parábola da Vinha, Anônimo, ilustração da Speculum Humanae Salvationis (manuscrito Den Haag, MMW, 10 B 34), 1450 c., Museum Meermanno Westreenianum, Colonia, Alemanha.
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