Já não quero dicionários
consultados em vão. Quero só a palavra que nunca estará neles nem se pode
inventar. Que resumiria o mundo e o substituiria. Mais sol do que o sol dentro
do qual vivêssemos todos em comunhão, mudos, saboreando-a.
(Carlos Drummond de
Andrade)
Ascensão do Senhor 02.06.2019
At 1, 1-11 Ef
1, 17-23 Lc 24, 46-53
ESCUTAR
“Recebereis o poder do Espírito
Santo, que descerá sobre vós para serdes minhas testemunhas” (At 1, 8).
Irmãos, o Deus de nosso Senhor
Jesus Cristo, o Pai a quem pertence a glória, vos dê um espírito de sabedoria
que vo-lo revele e faça verdadeiramente conhecer (Ef 1, 17).
“Eu enviarei sobre vós aquele
que meu Pai prometeu (24, 49).
MEDITAR
A espiritualidade não pode ser
aprendida por uma fuga do mundo, fugindo-se das coisas ou se tornando solitário
e afastando-se do mundo. Pelo contrário, nós devemos aprender uma solidão
interior onde e com quem estivermos. Nós devemos aprender a penetrar nas coisas
e achar Deus lá.
(Mestre Eckhart, 1260-1328,
Alemanha)
ORAR
Com a ascensão
de Jesus começa o tempo da Igreja, um tempo de testemunho público e corajoso
que, progressivamente, alcançará todos os homens. A ascensão é a linha
divisória entre a história de Jesus e a da comunidade pós-pascal. A comunidade
eclesial pode iniciar o seu próprio caminho histórico sem nostalgias e sem
fugas apocalípticas graças à força do Espírito prometido pelo Senhor. O
banquete eucarístico, convivência íntima, é o lugar por excelência em que os
amigos podem estar em comunhão com o Cristo. A Igreja surge como uma comunidade
de oração para depois ser apostólica, quando a sua prática passa a ser animada
pelo Espírito. A comunidade eclesial tem necessidade do sopro vital que lhe
será dado pelo Espírito do Senhor, pois sem Ele não existe vida, nem força de
expansão e nem capacidade de testemunho para a Igreja. Jesus se “separa” dos
amigos com o sinal da benção e esta é a última imagem que fica: a do Cristo
glorioso que abençoa. Os apóstolos saúdam a partida do Senhor não com prantos,
mas com alegria ainda que devam afrontar um mundo hostil para levar a paz, o
amor e o perdão. Não celebramos uma despedida, mas uma nova maneira de estar
presente no mundo, pois a presença definitiva do Ressuscitado entre nós e na
história da humanidade está assegurada pelo seu Espírito que conduz a
comunidade eclesial até o fim dos tempos, por meio da concretização do amor
fraterno, símbolo emblemático dos cristãos e dos homens e mulheres de boa
vontade. Somos herdeiros de sua missão e neste seguimento devemos reinventá-la
a cada novo momento histórico, como pedia o Papa João XXIII, lendo e
compreendendo os “sinais dos tempos”. A celebração da eucaristia anuncia e
realiza a proibição de toda estatização da Igreja e de todo o clericalismo na
política. A Igreja peregrina não funda a cidade terrena, mas a habita apontando
para o futuro. Devemos nos guiar pela prática de Jesus: a sua maneira de
acolher os pecadores, de elevar os humildes, desnudar os orgulhosos e
arrogantes. Devemos lembrar que a conversão proposta por Ele é a mudança
radical nas nossas relações com Deus, com o próximo e, sobretudo, com o
dinheiro. A novidade dos seus ensinamentos e do seu testemunho lhe valeu, como
valerá para nós, a hostilidade dos governantes e do poder religioso e esta
hostilidade foi a causa da sua condenação e assassinato. O evangelista enfatiza
que são “fatos que nos aconteceram” (Lc 1, 1) e não qualquer mistificação
maravilhosa inventada e difundida ao bel prazer de qualquer um. Meditemos as
palavras de Bento XVI: “Nós devemos estar seguros de que, por mais pesadas e
turbulentas as provas que nos esperam, não seremos jamais abandonados a nós
mesmos. As mãos do Senhor não nos largarão, pois estas são mãos que nos criaram
e que, todo o dia, nos acompanham no itinerário de nossas vidas”.
(Matersol, 1999-, Brasil)
CONTEMPLAR
Memorial para Kyle Dempster e Scott Adamson, 2018, Geleira Choktoi, Paquistão, Andrew Burr, Utah,
Estados Unidos.