segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

O Caminho da Beleza 14 - II Domingo da Quaresma


A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).




II Domingo da Quaresma                   25.02.2018
Gn 22, 1-2.9-13.15-18                 Rm 8, 31-34                       Mc 9, 2-10


ESCUTAR

“Eu te abençoarei e tornarei tão numerosa tua descendência como as estrelas do céu e como as areias da praia do mar” (Gn 22, 17).

Se Deus é por nós, quem será contra nós? (Rm 8, 31-34).

Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e os levou sozinhos a um lugar à parte sobre uma alta montanha. E transfigurou-se diante deles (Mc 9, 2).


MEDITAR

A igreja não oferece ao mundo um sistema de regras morais, mas uma sociedade santificada, um fermento que faz fermentar a criação, não através da imposição de suas ordens morais, mas por meio de sua presença santificadora. É uma presença testemunhante, que não amarra fardos pesados aos homens para conquistá-los, vinculados moralmente, para a salvação, mas os chama à liberdade de filhos de Deus, numa comunhão com ele que conduz à renovação do mundo.

(Ioannis Zizioulas, 1931-, Metropolita Ortodoxo de Pérgamo)


ORAR

            “Eu vi uma grande luz!”, exclama uma jovem mãe japonesa, que morava a uma centena de quilômetros de Hiroshima, entrando correndo na casa, na manhã de 6 de agosto de 1945, e abraçando seu filho de dez anos, Kenzaburo Oé, futuro prêmio Nobel de literatura. A bomba atômica fez sua trágica aparição no horizonte da humanidade, como luz de morte e de devastação. No entanto, o cristão não pode não deixar de ligar esta data (6 de agosto) e esta experiência (“uma grande luz”) com a festa da transfiguração do Senhor, que se celebra precisamente neste dia a partir do século IV no Oriente e do XI no Ocidente... Nesses mesmos dias [de agosto], cai o 9 do mês de Av, segundo o calendário judeu um dia de jejum e de luto onde o povo de Israel faz a memória da destruição do primeiro e do segundo Templo (respectivamente em 586 e 70 antes de nossa era) e, a partir daí, de todas as outras tragédias que marcaram sua história, desde a expulsão de Espanha, em 1492, até a “catástrofe” máxima da Shoah do último século... Enquanto que os cristãos, em suas igrejas inundadas de luz, celebram a glória de Deus que resplandece sobre a face do Cristo, os judeus, em suas sinagogas mergulhadas na penumbra de um único e modesto candeeiro, leem o livro das Lamentações. E sobre todos pesa a sombra lúgubre e inquietante de um clarão de morte, a nuvem luminosa de uma luz exterminadora. Paradoxo perturbador: a luz da vida da Transfiguração, que provém de Deus e anuncia o futuro do mundo em Cristo, contrasta com a luz da morte produzida pelo homem, que ameaça o presente do mundo, comprometendo seu futuro. A Transfiguração lembra a beleza para a qual a humanidade e o universo inteiro estão destinados; Hiroshima e a Shoah testemunham o embrutecimento de que o homem é capaz. A Transfiguração evoca, concentrando-se sobre o Cristo, a glória à qual estão destinados o corpo humano e mesmo o cosmos; Hiroshima e a Shoah revelam a capacidade do homem de desfigurar a carne humana, de deteriorar o corpo e o espírito, de devastar o cosmos. Para um cristão, celebrar a Transfiguração representa assim um apelo à responsabilidade e uma exortação à compaixão, à dilatação do coração em consideração ao homem que sofre. Não é um acaso se, para os evangelhos, o Cristo que conhece a transfiguração é aquele que vem anunciar pela primeira vez o destino da paixão e morte que o espera, a desfiguração que sofrerá por parte dos homens (ver Mt 16, 21-23): face ao mal, Jesus escolheu ser vítima de preferência a ser ministro. A Transfiguração torna-se desse modo o “sim” de Deus ao Filho que aceita a via da solidariedade radical com os oprimidos e as vítimas da história... Se o 9 de Av evoca os sofrimentos dos judeus e se Hiroshima lembra as penas de todos os homens, o Cristo é aquele que reúne em seu corpo de homem e em sua carne de judeu as dores da humanidade inteira. A Transfiguração torna-se esperança universal, para todos aqueles que sofrem e mesmo para a criação inteira que geme pela espera da redenção.

(Enzo Bianchi, 1943-, comunidade de Bose, Itália)


CONTEMPLAR

Lanternas flutuantes no rio Motoyasugawa, Hiroshima, Japão, 6 de agosto de 2017, as lanternas marcam o aniversário do bombardeio de Hiroshima. Cada uma representa uma vida perdida, publicada no jornal Asahi Shimbun, Getty Images, Japão.




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