A palavra de Deus é viva e eficaz e mais
cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).
II Domingo da
Quaresma 25.02.2018
Gn 22,
1-2.9-13.15-18 Rm 8, 31-34 Mc 9, 2-10
ESCUTAR
“Eu te
abençoarei e tornarei tão numerosa tua descendência como as estrelas do céu e
como as areias da praia do mar” (Gn 22, 17).
Se Deus é por
nós, quem será contra nós? (Rm 8, 31-34).
Jesus tomou
consigo Pedro, Tiago e João e os levou sozinhos a um lugar à parte sobre uma
alta montanha. E transfigurou-se diante deles (Mc 9, 2).
MEDITAR
A igreja não
oferece ao mundo um sistema de regras morais, mas uma sociedade santificada, um fermento que faz fermentar a criação, não
através da imposição de suas ordens morais, mas por meio de sua presença
santificadora. É uma presença testemunhante,
que não amarra fardos pesados aos homens para conquistá-los, vinculados moralmente,
para a salvação, mas os chama à liberdade de filhos de Deus, numa comunhão com
ele que conduz à renovação do mundo.
(Ioannis
Zizioulas, 1931-, Metropolita Ortodoxo de Pérgamo)
ORAR
“Eu vi uma grande luz!”, exclama uma
jovem mãe japonesa, que morava a uma centena de quilômetros de Hiroshima,
entrando correndo na casa, na manhã de 6 de agosto de 1945, e abraçando seu
filho de dez anos, Kenzaburo Oé, futuro prêmio Nobel de literatura. A bomba
atômica fez sua trágica aparição no horizonte da humanidade, como luz de morte
e de devastação. No entanto, o cristão não pode não deixar de ligar esta data
(6 de agosto) e esta experiência (“uma grande luz”) com a festa da
transfiguração do Senhor, que se celebra precisamente neste dia a partir do
século IV no Oriente e do XI no Ocidente... Nesses mesmos dias [de agosto], cai
o 9 do mês de Av, segundo o calendário judeu um dia de jejum e de luto onde o
povo de Israel faz a memória da destruição do primeiro e do segundo Templo
(respectivamente em 586 e 70 antes de nossa era) e, a partir daí, de todas as
outras tragédias que marcaram sua história, desde a expulsão de Espanha, em
1492, até a “catástrofe” máxima da Shoah do último século... Enquanto que os
cristãos, em suas igrejas inundadas de luz, celebram a glória de Deus que
resplandece sobre a face do Cristo, os judeus, em suas sinagogas mergulhadas na
penumbra de um único e modesto candeeiro, leem o livro das Lamentações. E sobre
todos pesa a sombra lúgubre e inquietante de um clarão de morte, a nuvem
luminosa de uma luz exterminadora. Paradoxo perturbador: a luz da vida da
Transfiguração, que provém de Deus e anuncia o futuro do mundo em Cristo,
contrasta com a luz da morte produzida pelo homem, que ameaça o presente do
mundo, comprometendo seu futuro. A Transfiguração lembra a beleza para a qual a
humanidade e o universo inteiro estão destinados; Hiroshima e a Shoah
testemunham o embrutecimento de que o homem é capaz. A Transfiguração evoca,
concentrando-se sobre o Cristo, a glória à qual estão destinados o corpo humano
e mesmo o cosmos; Hiroshima e a Shoah revelam a capacidade do homem de
desfigurar a carne humana, de deteriorar o corpo e o espírito, de devastar o
cosmos. Para um cristão, celebrar a Transfiguração representa assim um apelo à
responsabilidade e uma exortação à compaixão, à dilatação do coração em
consideração ao homem que sofre. Não é um acaso se, para os evangelhos, o
Cristo que conhece a transfiguração é aquele que vem anunciar pela primeira vez
o destino da paixão e morte que o espera, a desfiguração que sofrerá por parte
dos homens (ver Mt 16, 21-23): face ao mal, Jesus escolheu ser vítima de
preferência a ser ministro. A Transfiguração torna-se desse modo o “sim” de
Deus ao Filho que aceita a via da solidariedade radical com os oprimidos e as
vítimas da história... Se o 9 de Av evoca os sofrimentos dos judeus e se
Hiroshima lembra as penas de todos os homens, o Cristo é aquele que reúne em
seu corpo de homem e em sua carne de judeu as dores da humanidade inteira. A
Transfiguração torna-se esperança universal, para todos aqueles que sofrem e
mesmo para a criação inteira que geme pela espera da redenção.
(Enzo Bianchi,
1943-, comunidade de Bose, Itália)
CONTEMPLAR
Lanternas flutuantes no rio Motoyasugawa, Hiroshima,
Japão, 6 de agosto de 2017, as
lanternas marcam o aniversário do bombardeio de Hiroshima. Cada uma representa
uma vida perdida, publicada no jornal Asahi Shimbun, Getty Images, Japão.
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