terça-feira, 30 de junho de 2015

O Caminho da Beleza 32 - XIV Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 32
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XIV Domingo do Tempo Comum                05.07.2015
Ez 2, 2-5                  2 Cor 12, 7-10                    Mc 6, 1-6


ESCUTAR

“Quer te escutem, quer não –  pois são um bando de rebeldes –, ficarão sabendo que houve entre eles um profeta” (Ez 2, 5).

Foi espetado na minha carne um espinho, que é como um anjo de satanás a esbofetear-me, a fim de que eu não me exalte demais (2 Cor 12, 7).

“Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares” (Mc 6, 4).


MEDITAR

Desenvolveu-se uma globalização da indiferença. Quase sem nos dar conta, tornamo-nos incapazes de nos compadecer ao ouvir os clamores alheios, já não choramos à vista do drama dos outros, nem nos interessamos por cuidar deles, como se tudo fosse uma responsabilidade de outrem, que não nos incumbe (Francisco, Bispo de Roma e Servo de Deus).

É preciso começar deixando de concentrar a atenção sobre nós mesmos, para nos perguntarmos o que Ele quer de nós. É preciso começar aprendendo a amar, isto é, a desviar o olhar de nós mesmos para olhar para Ele. Se, nessa perspectiva, cessarmos de nos perguntar o que podemos obter, nos deixando simplesmente guiar por Ele, nos perdemos em Cristo, nos deixando levar, esquecendo de nós mesmos; então ficará claro como nossa vida coloca-se novamente nos trilhos, porque superamos a restrição egoística, a qual até então nos levava a nos concentrar sobre nossa pessoa. Quando, por assim dizer, saímos do aperto, só então começamos a perceber a grandiosidade da existência (Bento XVI).


ORAR

Neste domingo somos chamados a fazer o elogio da debilidade que é testemunhado por Ezequiel que deve afrontar um povo rebelde; Paulo que se debate com um espinho na carne e Jesus que é rejeitado em sua própria casa. O profeta tenta abrir brechas entre faces duras, corações obstinados e rebeldes e dispõem apenas de uma palavra débil, desarmada e pobre. Hoje, os rostos que mais assustam são os dos entediados e dos desinteressados que fingem ouvir a Palavra. E devemos anunciá-la, pois seus resultados não dependem da competência do profeta. A Palavra deve semear inquietudes e não aplausos. Paulo é o anti-herói acometido de uma crise misteriosa. Sua debilidade se converte no lugar onde se celebra a força do Cristo. Paulo aceita a própria miséria e a transforma em ação ao exclamar entre insultos e angústias: “Pois, quando sou fraco, então sou forte!”. Jesus enfrenta intolerância, a mesquinhez e os preconceitos dos seus mais próximos. E na lógica do clã, a Palavra se torna subversiva por ameaçar a estabilidade e a ordem existente. Jesus não tinha poder cultural como os escribas, não era um intelectual com estudos e nem possuía o poder sagrado dos sacerdotes do templo. Como não havia estudado em nenhuma escola rabínica, não se preocupava com discussões doutrinais e nem se interessava pelos ritos do templo. Mas, os seus concidadãos não o aceitam e Jesus é rejeitado em sua própria terra pelos que pensavam conhecê-lo melhor. Aprendamos que ser cristão é simplesmente viver aprendendo com Jesus para descobrir a maneira mais humana, mais autêntica e mais prazerosa de enfrentar a vida cotidiana. Francisco nos exorta: “Deus reserva sempre o que há de melhor para nós. Mas nos pede que nos deixemos surpreender pelo seu amor e de acolher as suas surpresas”.


CONTEMPLAR


Lamentação sobre o Cristo (detalhe), 1436-1441, Fra Angelico (c. 1390/5-1455), têmpera e ouro sobre painel, 109 x 166 cm, Museu de São Marco, Florença, Itália.




O Caminho da Beleza 31 - Festa de São Pedro e São Paulo

O Caminho da Beleza 31
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



Festa de São Pedro e São Paulo                   28.06.2015
At 12, 1-11                2 Tm 4, 6-8.17-18             Mt 16, 13-19

ESCUTAR

Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja rezava continuamente a Deus por ele (At 12, 5).

Caríssimo, quanto a mim, eu já estou para ser derramado em sacrifício; aproxima-se o momento de minha partida (2 Tm 4, 6).

“Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi um ser humano que te revelou isso, mas o meu Pai que está no céu” (Mt 16, 17).


MEDITAR

Se você ama será crucificado; se não ama, você já está morto (Timothy Radcliffe).

Não.... permanecer e transcorrer/Não é perdurar, não é existir/ E nem honrar a vida!/Há tantas maneiras de não ser/Tanta consciência sem saber, /adormecida.../Merecer a vida, não é calar e consentir/Tantas injustiças repetidas.../É uma virtude, é uma dignidade/É a atitude de identidade mais definida!/Isto de durar e transcorrer não nos dá o direito/De presumir, porque não é o mesmo que viver/Honrar a vida (Eladia Blázquez e Mercedes Sosa).


ORAR

            Comemoramos neste domingo a festa do Papa e devemos nos concentrar em torno de Pedro que foi escolhido por Jesus para responder pelos Doze e administrar as responsabilidades da evangelização. A Igreja valoriza a diversidade das culturas para que nenhuma obsessão de unanimidade a transforme numa promotora de exclusão. Ao ordenar aos seus discípulos – “não leveis ouro, nem prata, nem dinheiro à cintura, nem sacola para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias e nem bastão” (Mt 10, 9-10) –  não o faz para penalizá-los, mas para que peçam ajuda aos outros e dependam da sua generosa hospitalidade. A Igreja de Jesus deve ser peregrina, hospitaleira e em permanente êxodo, sobretudo deve ser a Igreja do Perdão. Como afirmou Francisco: “A mãe Igreja não fecha as portas para ninguém, para ninguém! Nem mesmo para o mais pecador, para ninguém! E faz isso pela força, pela graça do Espírito Santo. A mãe Igreja abre, escancara suas portas para todos, porque é mãe” (24.05.2015). O Cristo perdoou o pecado da negação de Pedro e o pecado da perseguição de Paulo. São Antonio de Pádua pregava: “Jesus pediu a Pedro que apascentasse as suas ovelhas, não que as tosquiasse”.       Jesus também não pede aos seus discípulos uma obediência cega, mas os convida sempre a refletir e a julgar: “Que vos parece?” (Mt 21, 28); “Por que não julgais por vós mesmos o que é justo?” (Lc 12, 57); “Qual é a vossa opinião?” (Mt 13, 51); “Compreendestes tudo isso?” (Mt 13, 51). Jesus conhece a limitação do seu discipulado, mas o ama acima de tudo. Sabe que é próprio da fragilidade humana vacilar e pecar por meio da covardia, omissão, conivência e traição, diante do exigido pela Boa Nova: o de não se deixar dominar pela ganância do dinheiro e do prestígio; pela ânsia do poder e do status social e clerical, mas o de se tornar livre para Deus que é glorificado pelos que amam.


CONTEMPLAR

São Pedro e o Anjo (c. 1650), Giovanni F. Barbieri (Il Guercino) (1591-1666), desenho, giz vermelho sobre papel, Galeria de Arte do Sul da Austrália.






segunda-feira, 15 de junho de 2015

O Caminho da Beleza 30 - XII Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 30
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XII Domingo do Tempo Comum                 21.06.2015
Jó 38, 1.8-11                      2 Cor 5, 14-17                    Mc 4, 35-41


ESCUTAR

“O Senhor respondeu a Jó, do meio da tempestade” (Jó 38, 1).

“O mundo velho desapareceu. Tudo agora é novo” (2 Cor 5, 17).

“Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4, 40).


MEDITAR

O homem espiritual, por sua presença, por suas proposições, por suas atenções, difunde uma alegria serena nos que dele se aproximam. O espiritual em uma pessoa é notado por uma qualidade de alegria; é fácil que os outros não o percebam, que afastem essa aparente fragilidade ou não lhe deem importância. O homem espiritual pode suscitar incompreensão, ou até mesmo hostilidade – ele está engajado em sua própria estrada (Françoise Dolto).

A angústia é a possibilidade da liberdade. É o medo dessa possibilidade. A angústia é o puro sentimento da possibilidade. Se houver coragem de ir mais além, se constatará que a então realidade será muito mais leve do era a possibilidade. E o grande salto será o mais difícil, será cair nas mãos de Deus, será a coragem (Soren Kierkegaard).


ORAR

Parece inacreditável: a única vez, no Evangelho, em que Jesus aparece dormindo, foi numa circunstância em que nunca se poderia fazê-lo de forma tranquila “sobre um travesseiro”. Seria mais tranquilizadora uma narrativa em que Jesus convidaria os discípulos a repousar enquanto vela por eles. Jó martela os céus com suas perguntas na intenção de obrigar Deus a sair do seu silêncio cruel. E quando Deus rompe o silêncio insuportável, responde colocando uma série de perguntas que calam a boca de Jó. A lição é dura: Deus não é um provedor de respostas. Ele exige de nós um abandono na fé e na confiança. É Deus quem coloca as perguntas. Nosso Deus é um Deus que nos escuta sempre, mas nem sempre nos responde. A perene tentação é a de enquadrar Deus em esquemas de pronto socorro para que possamos a Ele recorrer quando necessitamos. Este Deus a quem agredimos com perguntas intermináveis e, muitas vezes, acusatórias nos indaga: “Quem sou eu para ti?”. A travessia mais perigosa para nós é aquela ameaçada pela calma, pelas condições favoráveis, pelos sinais tranquilizadores. O milagre é que a nossa força está precisamente na debilidade humana e que as nossas possibilidades acontecem no terreno da fé e do risco e em nenhum outro. O cristão é aquele que, na fé, troca o certo pelo duvidoso. Somos chamados a viver, em Cristo, como criaturas novas e libertadas do medo e da angústia. Manifestamos a nossa coragem na debilidade, na aventura de dar passos novos e ousados. Seremos criaturas novas no dia em que a fé – e não o medo – nos mantiver despertos e lúcidos de que quando soubermos todas as respostas, a vida nos colocará novas perguntas.


CONTEMPLAR


Medo, Daniel C. Chiriac (1972-), acrílico sobre tela, www.danielchiriac.com, Romenia.



segunda-feira, 8 de junho de 2015

O Caminho da Beleza 29 - XI Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 29
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



XI Domingo do Tempo Comum                   14.06.2015
Ez 17, 22-24                       2 Cor 5, 6-10                      Mc 4, 26-34


ESCUTAR

“Eu sou o Senhor que abaixo a árvore alta e elevo a árvore baixa; faço secar a árvore verde e brotar a árvore seca. Eu, o Senhor, digo e faço” (Ez 17, 24).

“Caminhamos na fé e não na visão clara” (2 Cor 5, 7).

“A semente vai germinando e crescendo, mas não se sabe como isso acontece” (Mc 4, 27).


MEDITAR

Não desfaleças, deixa-te absorver pelo amor. Não podes saber para onde te levo... Não esperes, sobretudo, velhice tranquila, pacífica, considerada. Teu caminho é luta sem tréguas, até o fim, até o impossível (J. L. Lebret).

Eu que sou Divino estou verdadeiramente em ti. Jamais poderei ser separado de ti: por mais que sejamos afastados, jamais poderemos ser separados. Eu estou em ti e tu estás em Mim. Não poderíamos estar mais próximos. Nós dois estamos fundidos em um só, derramados em um único molde. Assim, infatigáveis, permaneceremos para todo o sempre (Metchild de Magdeburg).


ORAR

Somos chamados a recuperar os valores autênticos da pequenez, da obscuridade, da debilidade, da pobreza e da fragilidade. O Senhor elege as realidades mais humildes para realizar seus desígnios de grandeza imensuráveis segundo critérios e medidas humanas. A parábola de hoje nos fala de um processo germinal interno de cada pessoa e sociedade. Jesus semeia o Reino pregando o evangelho. Ele não se preocupa em conduzir a colheita e nem se ela acontecerá imediatamente. O desenvolvimento misterioso do Reino é assunto de Deus, pois é a sua obra e o seu segredo. Somos convidados a superar a impaciência, o imediatismo e os frenesis das soluções miraculosas. O Reino irrompe no meio de nós sem o sensacionalismo dos espetáculos, mas numa permanente ação silenciosa. A palavra chave é “ele não sabe como isso acontece”, ou seja, não entendemos nada e sabemos menos ainda. É o grande sorriso de Deus sobre nós, e como diz o Papa Francisco: “É preciso deixar que Deus nos surpreenda”. Assim é o amor de Deus: na fragilidade se revela forte e faz do impossível o possível. As transformações profundas que revelam a presença de Deus vêm dos pequenos, dos últimos e dos insignificantes. Deus se faz presente não porque a sociedade se torna mais religiosa, mas porque se faz mais humana, mais justa e solidária. Deus não reina porque as igrejas estão cheias, nem porque os movimentos religiosos se espalham nas praças, nas praias, nas marchas e passeatas. Deus reina porque e quando os homens e mulheres são mais honrados e mais respeitados na sua dignidade e em seus direitos diversos e plurais. Meditemos as palavras do papa Francisco: “A misericórdia de Deus é a sua responsabilidade por nós. Ele sente-Se responsável, deseja nosso bem e quer nos ver felizes, cheios de alegria e serenos. Tal como Ele é misericordioso, assim somos chamados também nós a ser misericordiosos uns para com os outros” (Misericordiae Vultus).


CONTEMPLAR

Árvore da Vida III, 2012, Catherine Nolin, acrílico sobre tela, Andover, Massachussets, Estados Unidos.





terça-feira, 2 de junho de 2015

O Caminho da Beleza 28 - X Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 28
Leituras para a travessia da vida


“O conceito de sabedoria é aquele que reúne harmonicamente diversos aspectos: conhecimento, amor, contemplação do belo e, também, ao mesmo tempo, uma ‘comunhão com a verdade’ e uma ‘verdade que cria comunhão’, ‘uma beleza que atrai e apaixona’” (Francisco).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).



X Domingo do Tempo Comum                     07.06.2015
Gn 3, 9-15               2 Cor 4, 13-5, 1                  Mc 3, 20-35


ESCUTAR

“A mulher que tu me deste por companheira, foi ela que me deu o fruto da árvore, e eu comi” (Gn 3, 12).

“Por isso, não desanimamos. Mesmo se o nosso homem exterior se vai arruinando, o nosso homem interior, pelo contrário, vai-se renovando dia a dia” (2 Cor 4, 16).

“Os parentes de Jesus saíram para agarrá-lo, porque diziam que estava fora de si” (Mc 3, 21).


MEDITAR

Homens políticos, homens de Igreja ou cidadãos comuns, estamos sempre repetindo as mesmas falas, sempre moendo a mesma farinha. Trata-se de falta de fé no desconhecido, no incognoscível. Não caminhamos em direção ao novo. Repetimos a mesma ladainha (...). Mas seria isso fé na vida, no sentido de que, de qualquer forma, ela é sempre risco e exige audácia? Não seria antes uma certeza, uma segurança que adormece a vida em insignificância e irresponsabilidade? (Françoise Dolto).

Ser cristão não é simplesmente se esforçar para imprimir à sua vida um sentido humanista, social ou mesmo religioso. Somente é cristão o homem que tenta viver a partir do Cristo a dimensão humana, social e religiosa da sua existência (Hans Kung).


ORAR

Nossos mecanismos de fuga são revelados. Adão responde: “A mulher que me deste” e Eva afirma “A serpente me enganou”. Desta forma, inicia-se o ciclo das culpabilidades que percorrem nossa travessia: transferências, projeções e uma enxurrada acusatória e impiedosa. Tudo é culpa de alguém e somos todos vítimas indefesas. A vida é madrasta e por isso cabe a nós a vitimização das nossas “pessoinhas”, para que nos escondamos por detrás das culpas dos outros. “Onde estás?” É a indagação simples que devemos aprender para que possamos nos apresentar na verdade/nudez do nosso ser, sem subterfúgios e ridículas justificativas. No evangelho, Jesus é apresentado como desequilibrado, fora de si. E “fora de si” significa dizer que Jesus está fora “deles”, dos seus modelos, previsões, seguranças e costumes. É necessário construir uma ética do amor distante da atitude tomada pelos parentes de Jesus: a defesa de seus próprios interesses, esquemas e rotinas. Muitas vezes não nos dispomos a “estar fora” das modas, das ideologias, da competição e das vaidades. Desejamos “estar dentro” do poder, dos negócios, da carreira, dos privilégios, da popularidade e do espetáculo que está na moda. E, no entanto, a loucura evangélica deveria ser a enfermidade hereditária, contagiosa da “nova família” do Cristo: “Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. Loucura das loucuras! A blasfêmia contra o Espírito Santo é a pretensão de seguir a Cristo “sem perder a cabeça” (Cura d’Ars). É recusar a loucura do amor, o componente essencial da santidade a que somos chamados.  Amar demais é impossível. Cada um recebe o que precisa e o resto se espalha pelo mundo. O pecado sem perdão é a presunção de querer mudar o mundo sem ser sinal de contradição e colocando o Espírito sob liberdade vigiada. Não foram os grandes pecadores que assassinaram Jesus, mas pessoas medíocres, míopes guardiões dos dogmatismos e intolerâncias. Vivemos imersos em mundos e igrejas onde existe a rasura da iniquidade, da negação da verdade e do amor. Mais do que nunca, devemos proclamar que fora da loucura não há salvação!


CONTEMPLAR

Dom Hélder Câmara, foto, s.d., autoria desconhecida.