O Caminho da Beleza 29
Leituras para a travessia da vida
“A
beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de
nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus
porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca
do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).
“Quando
recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha
íntima alegria” (Jr 15, 16).
“Não
deixe cair a profecia” (D.
Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).
X Domingo do Tempo Comum 10.12.2012
Gn 3, 9-15 2 Cor 4, 13-18.5, 1 Mc 3, 20-35
“Depois que o homem comeu da
fruta da árvore, o Senhor Deus chamou Adão, dizendo: ‘Onde estás?’ E ele
respondeu: ‘Ouvi tua voz no jardim, e fiquei com medo, porque estava nu; e me
escondi’” (Gn 3, 9).
“Pois o que é visível é
passageiro, mas o que é invisível é eterno. De fato, sabemos que, se a tenda em
que moramos neste mundo for destruída, Deus nos dá uma outra moradia no céu que
não é obra de mãos humanas, mas que é eterna” (2 Cor 4, 5).
“Naquele tempo: Jesus voltou para
casa com seus discípulos. E de novo se reuniu tanta gente que eles nem sequer
podiam comer. Quando souberam disso, os parentes de Jesus saíram para
agarrá-lo, porque diziam que estava fora de si (Mc 3, 20-21).
MEDITAR
“Deus é louco por nós. Se não nos
amasse, Ele não dava tudo que precisava a nós” (Madre Belém).
“É preciso nascer de novo e o que
impede a imensa maioria de encontrar o verdadeiro Deus é que ela ainda não renasceu
e, por isso, não chegou a si mesma e não saberia chegar até Deus. O momento em
que nos encontrarmos a nós mesmos e o momento em que se encontra Deus é um só e
o mesmo momento” (Maurice Zundel).
ORAR
Como Adão que
colocou toda a culpa em Eva, estamos sempre prontos para apontar os culpados,
pois na nossa covardia a culpa é, infalivelmente, dos outros. Diante de Deus
devemos nos mostrar com toda a nossa verdade/nudez, sem subterfúgios e
justificativas ridículas porque o Senhor é bondade e misericórdia e está sempre
disposto a nos cobrir com o seu perdão. Deus sempre perguntará “Onde estás?”
até que rompamos o medo de dizer a verdade. O Evangelho revela que todo aquele
que é cheio de Deus – entusiasmado – é sempre chamado de louco, desequilibrado
e embriagado. O Espírito nos arranca do próprio centro em que orbitamos para
que o nosso novo centro esteja fora de nós e nos faça acolher o elemento novo,
inesperado e que chega de “outra parte”. Somos educados a estar centrados em
nós mesmos e, por esta razão, tornamo-nos a cada dia mais parecidos conosco
mesmo, pois vivemos encerrados num mundo sem surpresas e que jamais irá além
das restritas possibilidades da nossa marca individual feita de rigidez e
esclerose. Jesus não estava fora de si,
mas fora deles. Jesus não estava fora do mundo, mas no meio da vida, como a própria Vida. O
cristão que está no meio da vida não é a cópia dos desejos alheios: ele tem
gestos e não poses e por esta razão não se transforma num personagem
pré-fabricado à la mode. O oposto do
amor não é o ódio, mas um profundo instinto de manipular, controlar e programar
os outros segundo os próprios sonhos e desejos. Não podemos amar como os
parentes de Jesus que queriam “prendê-Lo” de volta à casa, ou seja, aos seus
próprios critérios, interesses e preconceitos. Jesus não se deixou domesticar
para atuar no grande circo religioso do seu tempo, mas pregou uma “loucura
evangélica” como uma “enfermidade hereditária” da “nova família” do Cristo. A
blasfêmia contra o Espírito – o pecado sem perdão – é a recusa consciente da
luz e da “loucura evangélica” como essenciais para a santidade a que somos
chamados: “A loucura de Deus é mais sábia do que os homens” (1 Cor 1, 25). A
blasfêmia contra o Espírito Santo é a pretensão de seguir Jesus sem perder a
cabeça e até a vida se preciso for. É não ser sinal de contradição como afirmou
Simeão a respeito de Jesus. No início do cristianismo, o escolhido para uma
missão especial era sempre alguém “pleno do Espírito Santo”. A “loucura”
deveria ser o carisma essencial numa Igreja que pretende ser fiel ao paradoxo
evangélico e não um clube de boas maneiras, pois sem a loucura e o entusiasmo o
cristianismo se reduz a um moralismo piedoso sem nenhum compromisso social e político. A escritora russa Tatiana Gariceva é
enfática: “O trágico paradoxo do cristianismo está no fato de que saiu
vitorioso da época das perseguições para terminar refém dos pequenos burgueses
e se reduzir quase que exclusivamente à falsidade e à hipocrisia”. Paulo
reitera que para ressuscitar com Cristo é necessário despojar-se das
aparências, dos disfarces para que brote o homem interior que “vai-se renovando
dia a dia”. Jesus passou por louco e praticante de magia: “Os mestres da Lei
que tinham vindo de Jerusalém, diziam que ele estava possuído por Belzebu, e
que pelo príncipe dos demônios ele expulsava os demônios”. Para Jesus,
demoníacas eram a sociedade e a religião que não garantiam o espaço para as
convicções verdadeiras, para as ideias originais e para as vivências pessoais.
O reino destes “demônios” é o da multidão, da coletividade em que cada um
chafurda para se subtrair de si mesmo, para escapar das próprias decisões e se
furtar das suas responsabilidades existenciais. Jesus cria novos laços familiares.
Laços fundados sobre a evidência do amor, da liberdade do espírito, da pureza
de sentimento, da alegria em relação ao sagrado e dos elos e pactos tecidos
pelas convicções comuns e depurados das angústias e dos medos. A única coisa
que Jesus não admite é a apatia do coração que nos impede de decidir a vida e
que nos torna incapazes para escolher entre a verdade e a rigidez; entre a
liberdade criadora e a angústia instituída que, fatalmente, nos conduzirá ao
fim dos sonhos e das esperanças.
CONTEMPLAR
O Louco, Pablo
Picasso, 1904, aquarela sobre cartolina, 85 x 35 cm, Museu Picasso, Barcelona,
Espanha.
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