segunda-feira, 4 de junho de 2012

O Caminho da Beleza 29 - X Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 29
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).

“Não deixe cair a profecia” (D. Hélder Câmara, 1999, dias antes de sua passagem).


X Domingo do Tempo Comum                     10.12.2012
Gn 3, 9-15               2 Cor 4, 13-18.5, 1                        Mc 3, 20-35


ESCUTAR

“Depois que o homem comeu da fruta da árvore, o Senhor Deus chamou Adão, dizendo: ‘Onde estás?’ E ele respondeu: ‘Ouvi tua voz no jardim, e fiquei com medo, porque estava nu; e me escondi’” (Gn 3, 9).

“Pois o que é visível é passageiro, mas o que é invisível é eterno. De fato, sabemos que, se a tenda em que moramos neste mundo for destruída, Deus nos dá uma outra moradia no céu que não é obra de mãos humanas, mas que é eterna” (2 Cor 4, 5).

“Naquele tempo: Jesus voltou para casa com seus discípulos. E de novo se reuniu tanta gente que eles nem sequer podiam comer. Quando souberam disso, os parentes de Jesus saíram para agarrá-lo, porque diziam que estava fora de si (Mc 3, 20-21).


MEDITAR

“Deus é louco por nós. Se não nos amasse, Ele não dava tudo que precisava a nós” (Madre Belém).

“É preciso nascer de novo e o que impede a imensa maioria de encontrar o verdadeiro Deus é que ela ainda não renasceu e, por isso, não chegou a si mesma e não saberia chegar até Deus. O momento em que nos encontrarmos a nós mesmos e o momento em que se encontra Deus é um só e o mesmo momento” (Maurice Zundel).


ORAR

Como Adão que colocou toda a culpa em Eva, estamos sempre prontos para apontar os culpados, pois na nossa covardia a culpa é, infalivelmente, dos outros. Diante de Deus devemos nos mostrar com toda a nossa verdade/nudez, sem subterfúgios e justificativas ridículas porque o Senhor é bondade e misericórdia e está sempre disposto a nos cobrir com o seu perdão. Deus sempre perguntará “Onde estás?” até que rompamos o medo de dizer a verdade. O Evangelho revela que todo aquele que é cheio de Deus – entusiasmado – é sempre chamado de louco, desequilibrado e embriagado. O Espírito nos arranca do próprio centro em que orbitamos para que o nosso novo centro esteja fora de nós e nos faça acolher o elemento novo, inesperado e que chega de “outra parte”. Somos educados a estar centrados em nós mesmos e, por esta razão, tornamo-nos a cada dia mais parecidos conosco mesmo, pois vivemos encerrados num mundo sem surpresas e que jamais irá além das restritas possibilidades da nossa marca individual feita de rigidez e esclerose. Jesus não estava fora de si, mas fora deles. Jesus não estava fora do mundo, mas no meio da vida, como a própria Vida. O cristão que está no meio da vida não é a cópia dos desejos alheios: ele tem gestos e não poses e por esta razão não se transforma num personagem pré-fabricado à la mode. O oposto do amor não é o ódio, mas um profundo instinto de manipular, controlar e programar os outros segundo os próprios sonhos e desejos. Não podemos amar como os parentes de Jesus que queriam “prendê-Lo” de volta à casa, ou seja, aos seus próprios critérios, interesses e preconceitos. Jesus não se deixou domesticar para atuar no grande circo religioso do seu tempo, mas pregou uma “loucura evangélica” como uma “enfermidade hereditária” da “nova família” do Cristo. A blasfêmia contra o Espírito – o pecado sem perdão – é a recusa consciente da luz e da “loucura evangélica” como essenciais para a santidade a que somos chamados: “A loucura de Deus é mais sábia do que os homens” (1 Cor 1, 25). A blasfêmia contra o Espírito Santo é a pretensão de seguir Jesus sem perder a cabeça e até a vida se preciso for. É não ser sinal de contradição como afirmou Simeão a respeito de Jesus. No início do cristianismo, o escolhido para uma missão especial era sempre alguém “pleno do Espírito Santo”. A “loucura” deveria ser o carisma essencial numa Igreja que pretende ser fiel ao paradoxo evangélico e não um clube de boas maneiras, pois sem a loucura e o entusiasmo o cristianismo se reduz a um moralismo piedoso sem nenhum compromisso social e político.  A escritora russa Tatiana Gariceva é enfática: “O trágico paradoxo do cristianismo está no fato de que saiu vitorioso da época das perseguições para terminar refém dos pequenos burgueses e se reduzir quase que exclusivamente à falsidade e à hipocrisia”. Paulo reitera que para ressuscitar com Cristo é necessário despojar-se das aparências, dos disfarces para que brote o homem interior que “vai-se renovando dia a dia”. Jesus passou por louco e praticante de magia: “Os mestres da Lei que tinham vindo de Jerusalém, diziam que ele estava possuído por Belzebu, e que pelo príncipe dos demônios ele expulsava os demônios”. Para Jesus, demoníacas eram a sociedade e a religião que não garantiam o espaço para as convicções verdadeiras, para as ideias originais e para as vivências pessoais. O reino destes “demônios” é o da multidão, da coletividade em que cada um chafurda para se subtrair de si mesmo, para escapar das próprias decisões e se furtar das suas responsabilidades existenciais. Jesus cria novos laços familiares. Laços fundados sobre a evidência do amor, da liberdade do espírito, da pureza de sentimento, da alegria em relação ao sagrado e dos elos e pactos tecidos pelas convicções comuns e depurados das angústias e dos medos. A única coisa que Jesus não admite é a apatia do coração que nos impede de decidir a vida e que nos torna incapazes para escolher entre a verdade e a rigidez; entre a liberdade criadora e a angústia instituída que, fatalmente, nos conduzirá ao fim dos sonhos e das esperanças.


CONTEMPLAR

O Louco, Pablo Picasso, 1904, aquarela sobre cartolina, 85 x 35 cm, Museu Picasso, Barcelona, Espanha.


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