segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O Caminho da Beleza 11 - V Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 11
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



V Domingo do Tempo Comum                     05.02.2012
Jó 7, 1-4.6-7                       1 Cor 9, 16-19.22-23                    Mc 1, 29-39


ESCUTAR

“Não é acaso uma luta a vida do homem sobre a terra? Meus dias correm mais rápido que a lançadeira do tear e se consomem sem esperança. Lembra-te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade!” (Jó 7, 1. 6-7).

“Pregar o evangelho não é para mim motivo de glória. É antes uma necessidade para mim, uma imposição. Ai de mim se eu não pregar o evangelho. Assim, livre em relação a todos, eu me tornei escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. Com os fracos, eu me fiz fraco, para ganhar os fracos. Com todos, eu me fiz tudo, para certamente salvar alguns. Por causa do evangelho eu faço tudo, para ter parte nele” (1 Cor 9, 16.19-23).

“De madrugada, quando ainda estava escuro, Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto” (Mc 1, 35).


MEDITAR

“O Senhor ama a dinâmica constante do coração humano e se esconde para ser encontrado. Seu jogo é o do amor. Deus, que não podemos jamais ver totalmente, plenamente, rapidamente se revela a nós, em parte, para ser buscado. E Ele se esconde para que nós O procuremos com mais desejo: é nesta dinâmica que consiste a nossa vida espiritual” (Cardeal Martini).

“Compaixão, amor, ternura, fidelidade, compromisso, bondade, clemência, graça e piedade: eis a noção bíblica de misericórdia” (Cardeal Lustiger).


ORAR

Jó tem a coragem de fazer uma pergunta escandalosa: “Viver é uma vida? Pode-se chamar vida se depois devemos morrer?”. O Senhor responde com um sim a este dramático protesto de Jó. Ele é convidado, como nós, a aceitar e amar um Deus incompreensível que vai além das explicações possíveis. O teólogo Maurice Zundel enfatiza: “Ao olhar de Deus, a vida do homem vale tanto quanto a Sua própria vida”. A imagem da vida que corre rápida como a lançadeira do tear traz um detalhe sutil: a palavra tikva, em hebraico, significa fio, mas também quer dizer esperança. A vida cessa quando se rompe o fio e se interrompe quando desaparece a esperança. Jó se agarra neste fio/esperança e suplica: “Lembra-te de que a minha vida é apenas um sopro”. Jesus testemunha o que deve ser a vida do discipulado: uma vida que encontra sua própria força na oração e no diálogo com Deus e que se desdobra numa vida-para-os-outros. Uma vida que se encarrega dos sofrimentos do irmão, uma compaixão diante das enfermidades físicas e espirituais. Uma vida feita para aliviar a dor dos outros. A filósofa judia Simone Weil escrevia: “A plenitude do amor ao próximo consiste, simplesmente, em ser capaz de perguntar-lhe: ‘Qual é o teu tormento?’” (Espera de Deus). O cristão deve ter um coração que vê e escuta para assumir as necessidades dos outros no mais profundo do seu ser e fazê-las suas. Madre Belém, no seu testamento espiritual, relembrava: “Outra coisa é sabermos manter esse amor ao Cristo por uma doação completa aos pobres e necessitados. Mesmo que seja pouco o que eles não ousam pedir, nós temos que adivinhar e é essa resposta que Deus pede de nós”. O evangelho mostra que Jesus também sabe dizer não. E diz não aos que exigem Dele cada vez mais e só para si próprios. Jesus se ausenta da multidão entusiasmada, mas refratária a qualquer compromisso. Jesus busca a solidão num lugar deserto abandonando os insaciáveis do espetáculo para se afastar de uma popularidade fácil, dos ritos de banalidade e das regras do conformismo. Onde Jesus está cresce a vida no interesse pelos que sofrem e na paixão pela libertação de todo o mal. Por esta razão, encontramos em sua volta a miséria da humanidade: os possuídos, os enfermos, os paralíticos, os leprosos, os cegos e os surdos a quem falta a luz da vida. Jesus desvela que o amor cristão nasce da descoberta de que Deus ama tão apaixonadamente nossa vida que foi capaz de sofrer nossa morte e nos abrir as portas de uma vida eterna em que partilharemos sempre o seu amor. Meditemos as palavras derradeiras de Madre Belém: “Nós nascemos para nos perder em Deus e não para nos achar. A maior certeza que nós temos ao morrer é a certeza do amor de Deus por nós. Deus nos ama tanto que se a gente soubesse quem era Deus a gente não fazia outra coisa senão amá-Lo. ‘Apaixonite’ aguda, agudíssima, nos perder no amor de Deus”.


CONTEMPLAR

Cristo no deserto, Ivan Nikolayevich Kramskoy, 1872, óleo sobre tela 180 x 210 cm, Galeria Tretyakov, Moscou, Rússia.




terça-feira, 24 de janeiro de 2012

O Caminho da Beleza 10 - IV Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 10
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



IV Domingo do Tempo Comum                   29.01.2012
Dt 18, 15-20                       1 Cor 7, 342-35                 Mc 1, 21-28


ESCUTAR

“O Senhor teu Deus fará surgir para ti, da tua nação e do meio de teus irmãos, um profeta como eu: a ele deverás escutar” (Dt 18, 15).

“Digo isto para o vosso próprio bem e não para vos armar um laço. O que eu desejo é levar-vos ao que é melhor, permanecendo junto ao Senhor, sem outras preocupações” (1 Cor 7, 35).

“Todos ficavam admirados com o seu ensinamento, pois ensinava como quem tem autoridade, não como os mestres da Lei” (Mc 1, 22).


MEDITAR

“Por que Jesus Cristo pode estar no interior de cada um de nós? Porque ele é vazio, vazio, vazio, radicalmente, deste eu possessivo do qual estamos todos doentes” (Maurice Zundel).

“O que dará o homem que tenha o valor da sua vida? Nada, se não for sua própria vida. A única coisa que poderíamos dar que tenha o valor de nossa vida é a nossa vida. E ter fé é acreditar que isto não é um suicídio” (Cardeal Lustiger).


ORAR

O profeta é escolhido por Deus para ser um homem da palavra. Ele não é alguém que escolhe uma carreira ou profissão. Ele é responsável por uma mensagem que não é sua, mas também não é um simples repetidor. O profeta é um provocador de crises e nos obriga a tomar posição: “Eu mesmo pedirei contas a quem não escutar as minhas palavras que ele pronunciar em meu nome”. É um homem condenado à fidelidade à Palavra de Deus. O profeta, em todos os tempos, é dotado de olhos abertos ao invés do oportunismo; de liberdade ao invés do servilismo e conformismo; de coragem ao invés do medo; de inteligência ao invés da superficialidade; de paixão ao invés da indiferença e de humildade ao invés da presunção e do protagonismo. O profeta só sabe a autenticidade da sua vocação quando incomoda, cria opositores e recebe injúrias mais do que privilégios. O médico Albert Schweitzer afirmava: “Se não dizeis coisas que desagradam alguém não podereis afirmar que dissestes a verdade”. Jesus testemunha de que não é a palavra que deriva da autoridade, mas a autoridade que deriva da palavra. Uma palavra que não incomoda e nem provoca reações é uma palavra emburrecida e, portanto, a verdadeira derrota da palavra. A palavra de Deus não pode ser pretexto para se falar de outra coisa. As igrejas abafam a Palavra quando valorizam os casuísmos, quando se imiscuem nas disputas de poder que nada têm a ver com a mensagem original do Evangelho. Não se pode falar de outra coisa quando se fala de Deus. Jesus testemunha que os inimigos do homem são inimigos de Deus e que tudo o que ameaça a dignidade humana constitui uma blasfêmia contra a glória de Deus. O homem, para Jesus, é assunto de Deus. Jesus ensina com autoridade, quer que sejamos homens livres e, por esta razão, homens de Deus, por isso expulsa os demônios interiores que nos escravizam ainda que seja no dia sagrado do sábado. Os demônios são o caos existente na fragmentação espiritual das pessoas e da sua autodestruição contínua: “Que queres de nós, Jesus Nazareno? Viestes para nos destruir?” Jesus tem a liberdade de infringir a regra sagrada quando se trata de libertar as pessoas que sofrem. A comunidade eclesial deve cantar como a Esposa do Cântico dos cânticos: “Ouvi, pois chega meu amado saltando sobre os montes, pulando pelas colinas!” (Ct 2, 8) e rezar com toda a Igreja: “Vem, Senhor Jesus” (Ap 22, 20). Vem nos arrebatar para além de nós mesmos, na casa paterna onde, no banquete nupcial do Cordeiro, comeremos e beberemos Contigo.


CONTEMPLAR

Jesus e o demônio, Bhanu Dudhat, 2008, acrílico sobre tela, 30” x 24”, Gujarat, Índia.


segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O Caminho da Beleza 09 - III Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 09
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



III Domingo do Tempo Comum            22.o1.2012
Jn 3,1-5.10             1 Cor 7, 29-31                    Mc 1, 14-20



ESCUTAR

“Vendo Deus as suas obras de conversão e que os ninivitas se afastavam do mau caminho, compadeceu-se e suspendeu o mal que tinha ameaçado fazer-lhes, e não o fez” (Jn 3, 10).

“Eu digo, irmãos: o tempo está abreviado” (1 Cor 7, 29-31).

“O tempo já se cumpriu, e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e acreditem na Boa Notícia” (Mc 1, 14-20).


MEDITAR

“Somos chamados a encontrar Deus no mundo, nas coisas, nos outros, na história. Contudo isto não será possível se não partimos da situação imediata que é a nossa” (Cardeal Martini).

“A Igreja não vive de si mesma, mas do Evangelho, dele extraindo continuamente a orientação para o seu caminho. Cada cristão deve anotar e aplicar a si mesmo este princípio: só aquele que se dedica antes de mais nada à escuta da Palavra pode vir a anunciá-la. Com efeito, ninguém deve ensinar a sua própria sabedoria, mas a sabedoria de Deus que, muitas vezes se apresenta ao olhos do mundo inteiro como loucura” (Bento XVI).


ORAR

As três afirmações das leituras deste domingo são uma sucessão inquietante de advertências: “Ainda quarenta dias”; “O tempo está abreviado”; “O tempo já se cumpriu”. Como cristãos devemos acreditar que o desenlace não é um hecatombe, mas uma transformação. Jesus num breve pronunciamento reitera que se cumpriu o prazo, o Reino de Deus está próximo e que é necessário converter-se e crer na Boa Nova. As duas primeiras afirmações constituem uma revelação a partir de Deus e a última implica uma decisão por parte do homem. Uma decisão expressa por duas exigências: conversão e fé. Os habitantes de Nínive nem esperaram o vencimento fatídico dos quarenta dias, pois tanto a fé como a conversão não obedecem a um horário pré-estabelecido, pois são uma resposta imediata. A palavra de Deus não se desmente a si mesma. A antiga Nínive foi destruída pela conversão e fé dos seus habitantes e uma nova Nínive se deslumbrava. Sucedeu o imprevisível: a força da palavra de Deus proclamada por um só homem, Jonas, que além de duvidar do milagre não fez o menor esforço para crer que para Deus nada era impossível. Os habitantes de Nínive vestiram-se de sacos e Deus depôs a vestimenta da cólera para revestir-se do manto da misericórdia. O profeta Jonas, medíocre e mesquinho, como tantos de nós, cumpriu mecanicamente a sua tarefa sem se deixar enternecer e dilatar o seu coração. Jonas apenas sentenciou como tantos padres e médicos: “Aqui só um milagre!”. E dizem isto porque não acreditam que tudo é possível. Melhor seria que tivéssemos suficiente fé nem tanto para fazer o milagre, mas para ao menos crer nele como possível. Jonas, que foi enviado para abrir os olhos dos ninivitas, permaneceu com a trava nos seus. O tempo breve é um convite para voltarmos os corações para o eterno com um profundo desprendimento interior: os que têm, os que choram e os que estão alegres vivam como se não tivessem, não chorassem e nem fossem alegres. Estamos no limiar do mundo novo anunciado pelo profeta: “Eis que vou criar um novo céu e uma nova terra” (Is 65, 17) e por isso somos convidados a levantar os olhos para além do nosso limite cotidiano e olhar para o horizonte de Deus neste mundo novo em via de nascer. Devemos ter um único horizonte, o do Reino: “Portanto, quer comais ou bebais ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1 Cor 10, 31).


CONTEMPLAR

Chamando discípulos, He Qi, 1999, Roseville, Minnesota, Estados-Unidos.


segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O Caminho da Beleza 08 - II Domingo do Tempo Comum

O Caminho da Beleza 08
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



II Domingo do Tempo Comum                     15.01.2012
1 Sm 3, 3b-10.19               1 Cor 6, 13-15.17-20                    Jo 1, 35-42



ESCUTAR

“Fala, que teu servo escuta!” (1 Sm 3, 10).

“Ignorais que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que mora em vós e que vos é dado por Deus?” (1 Cor, 19).

“Então André conduziu Simão a Jesus” (Jo 1, 42).


MEDITAR

“O Cristo nos faz uma única exigência: jamais limitar nada” (Maurice Zundel).

“Não é possível atingir as verdades do espírito, aquelas que dizem respeito ao bem e ao mal, às grandes metas e perspectivas de vida, à relação com Deus, sem que daí advenham reflexos profundos para a condução da própria vida” (Bento XVI).


ORAR

A primeira leitura nos faz saber que O Senhor não tem uma voz reconhecível tanto que Samuel a confunde com a do sacerdote Eli. O Senhor não fala a língua dos textos sagrados e nem se obriga a seguir as rubricas de um missal. O teólogo protestante Dietrich Bonhoeffer diz que Ele fala sempre o dialeto do povo. Deus permanece sempre o inesperado. A sua voz é, habitualmente, discreta e contida: “O menino Samuel oficiava com Eli diante do Senhor. A palavra do Senhor naquele tempo era rara e as visões não eram abundantes” (1 Sm 3, 1). O Evangelho revela que Jesus prefere estar fora do cenário religioso e passar por uma vereda qualquer: “João estava com dois de seus discípulos. Vendo Jesus passar, diz: - Aí está o cordeiro de Deus”. Devemos sair do útero protetor da passividade, do costume, dos condicionamentos sociais e religiosos para afrontar o risco de uma fé consciente e de um consentimento livre à iniciativa divina. Devemos ser capazes de uma experiência vital, sem medo algum de nos entregarmos, pois não nos entregamos a uma ideia ou a um código moral, mas a Alguém: “nesse dia, permaneceram com Ele”. Jesus, a cada pergunta nossa, não responderá jamais com programas, planos pastorais, esquemas detalhados e nem normas pré-estabelecidas. Jesus nos responde sempre com dois verbos: “Vinde ver!”: um convite e uma promessa. Jesus não aprisiona as pessoas, mas as desaloja e as coloca a caminho, pois “ficar com Ele” significa fazer-se itinerante por Ele, com Ele e Nele. A nossa fé cristã não se transmite como um depósito de conceitos, mas por meio de uma palavra viva que acende no outro um desejo ou uma nostalgia. As palavras do anúncio não são as aprendidas nos textos, mas as que brotam de uma experiência perturbadora: “Encontramos o Messias (que quer dizer: Cristo)”. O encontro com o Cristo não é o de uma doutrina, nem de uma lista de coisas que temos de acreditar, mas uma descoberta que transforma as nossas vidas, liberta as nossas mentes, ilumina nossos espíritos, conduz as nossas ações e nos devolve a coragem de ser e existir apesar de tudo e de todos. Não nos iludamos, somente quem O acompanha, verá. O poema de A. Camus nos aponta para o verdadeiro encontro com o Cristo: “Não caminhe diante de mim, que não poderei te seguir. Não caminhe detrás de mim, que não poderei te conduzir. Caminhe exatamente junto a mim para, simplesmente, ser meu amigo”. O Evangelho acentua que, paradoxalmente, Simão não é chamado por Jesus, mas conduzido a ele pelo seu irmão André. É o amor fraterno que nos conduz ao Cristo, pois “aquele que não ama não conhece a Deus” (1 Jo 4, 8). E Simão é também chamado para ser-para-os-outros. Paulo reafirma que aquele que escutou a chamada do Senhor “não se pertence mais”, pois se torna com Ele um só Espírito. Desde então, só nos cabe viver por amor, com amor e no amor a qualquer preço.


CONTEMPLAR

Cabeça de Cristo, Rembrandt Harmenszoon van Rijn, c. 1655, óleo sobre painel de carvalho, 25 x 21.7 cm, Gemäldegalarie, Staatliche Museen zu Berlin, Berlim, Alemanha.






segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

O Caminho da Beleza 07 - Epifania do Senhor

O Caminho da Beleza 07
Leituras para a travessia da vida


A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).

Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).



Epifania do Senhor                   o8.o1.2012
Is 60, 1-6                 Ef 3, 2-3a.5-6                    Mt 2, 1-12


ESCUTAR

“Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor” (Is 60, 10).

“Os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho” (Ef 3, 6).

“Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (Mt 2, 2).


MEDITAR

“O que se espera do missionário (...) não é que pregue sobre a Igreja e a torne atraente por uma exaltação humana do seu poder, de seu prestígio, de sua prudência, de sua ciência, de todas as suas riquezas, enfim. A Igreja deve desaparecer diante de Jesus para quem aponta, como João Batista” (Frei Bernardo Catão, op).

“Conhecer-se nos faz dobrar os joelhos, postura indispensável ao amor, pois o conhecimento de Deus engendra o amor e o conhecimento de si engendra a humildade” (Madre Tereza de Calcutá).


ORAR

Neste domingo celebramos a manifestação de Deus e a busca do homem. O Senhor toma a iniciativa e os homens e mulheres se colocam em movimento. Os passos de Deus antecipam os nossos e só podemos encontrá-Lo porque Ele nos busca e só chegamos a Ele porque Ele nos alcança. O homem não conquista Deus, mas se deixa conquistar: “Tu me seduziste, Senhor, e eu me deixei seduzir” (Jr 30, 7). A manifestação do Senhor assume contornos planetários e nunca haverá dela uma apropriação privilegiada por parte de ninguém. Deus se deixa conhecer pelos desconhecidos: chegam filhos de longe (Is 60, 4); chegam os pagãos (Ef 3, 6); chegam os inesperados (Mt 2, 1) e chegam adoradores imprevistos (Mt 2, 11). A geografia de Deus nunca poderá ser ensinada, pois é impossível ensinar uma geografia sem fronteiras em que se é impotente para se estabelecer quem é vizinho e quem está distante. Qualquer tentativa de delimitá-la, como fazem nossas igrejas, empobrece o essencial, esvazia a inquietação da espera e a surpresa do encontro. Nesta epifania, “a estrela... ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino”. É neste momento que se produz a separação entre o sinal e a realidade. Se o sinal era espetacular, a realidade, ao contrário, é modesta, ordinária e até decepcionante: uma casa qualquer, uma cena comum com personagens insignificantes. O Evangelho diz apenas: “Entraram na casa e viram o menino com Maria sua mãe”. Devemos saber que a estrela já cumpriu o seu papel e nada mais tem a fazer. A partir deste momento é a fé que permite ver além das aparências e, consequentemente, adorar porque somente a fé consente contemplar a glória, a grandeza infinita contida, exclusivamente, na pequenez. Deus se encarnou, a estrela esplendorosa cumpriu seu papel e, a partir de agora, não existem mais sinais espetaculares, somente os imperceptíveis e escondidos. Neles encontraremos o Emmanuel – Deus Conosco – nos doentes que oferecem secretamente suas vidas; nos pobres e excluídos; em todas as vítimas da maldade e da injustiça dos homens; e em todos que trabalham, infatigavelmente, para fazer triunfar a paz no mundo. Não procuremos mais a manifestação de Deus no extraordinário e no insólito, porque Deus se manifesta no cotidiano ordinário da nossa vida numa linguagem que podemos compreender: a do amor, a do luto, a da esperança, a do encontro e a das perdas. A partir de agora, o Cristo revelará os mistérios mais perturbadores do seu Reino pelos acontecimentos minúsculos da vida cotidiana. É preciso aprender a decifrar o amor perturbador de Deus na face dos nossos irmãos. É preciso educar o olhar para que possamos ver os que são, sem o saber, epifanias vivas da gratuidade, da ternura, da paciência e do amor de Deus. A epifania nos faz ver o que já está em nossa vida: o Senhor. Basta que tenhamos a fé de que nossas travessias, junto com os que nos amam e nós amamos, tornaram-se epifanias do Deus Vivo. Os magos voltaram por outro caminho, o nosso caminho, e agora seguem não mais segundo a estrela, mas com a lucidez da presença do Messias, pois “quem diz que permanece com ele deve agir como ele agiu”(1 Jo 2, 6).


CONTEMPLAR

Filii tui de longe venient..., Salvador Dalí, 1964, guache, 19” x 13 ¾”, Coleção “Biblia Sacra”, Canto IV/66, Sociedade Rizzoli, Milão, Itália, 1967.