A Palavra se fez carne e armou sua tenda entre nós (Jo 1, 14).
Domingo de Páscoa
At 10, 34.37-43 Cl
3, 1-4 Jo 20, 1-9
ESCUTAR
“Ele andou por toda parte, fazendo o bem e curando a
todos os que estavam dominados pelo demônio, porque Deus estava com ele” (At
10, 38).
Vós morrestes e a vossa vida está escondida, com
Cristo, em Deus (Cl 3, 3).
Entrou também o outro discípulo, que tinha chegado
primeiro ao túmulo. Ele viu e acreditou.
MEDITAR
A grande tragédia da vida não é que o homem pereça, mas que ele cesse de amar.
(Somerset Maugham)
ORAR
Neste domingo da Ressurreição, é
proclamado que só quem ama é capaz de acreditar e ter esperança. O primeiro dia
se inicia num cenário nupcial: “Procurei o amado da minha alma. Procurei-o
pelas ruas e pelas praças... procurei-o e não o encontrei” (Ct 3, 1). O papa
Bento XVI escreve: “Agora o amor torna-se cuidado do outro pelo outro. Já não
se busca a si próprio, não busca a imersão no inebriamento da felicidade;
procura, em vez disso, o bem-amado: torna-se renúncia, está disposto ao
sacrifício, antes, procura-o” (Deus
caritas est). Pedro, ao ver “as faixas de linho deitadas no chão”,
compreende que o próprio Jesus deixara o sinal de que estava vivo: dobrara o
pano que cobria a sua cabeça e não o seu rosto, como era costume fazer com os
mortos. A totalidade da humanidade de Jesus incluiu também a sua morte. Jesus
morreu, mas não é um cadáver. Madalena, Pedro e João sabem que será inútil
buscá-Lo no sepulcro. Ele não está mais ali. A nossa vida, como a Dele, quando
entregue por amor aos outros, supera e vence a morte. A ressurreição de Jesus
não deve ser compreendida como uma volta à vida biológica que enraizaria a
existência humana numa dependência do mundo físico. Devemos ir, com a fé e a
esperança no mais íntimo de nós, além da visibilidade dos corpos inertes, dos
corpos devorados pela esclerose e dos olhares perdidos em espaços vazios. Jesus
é Presença como Dom absoluto e a sua ressurreição nos garante que podemos
atingir o segredo interior, o espaço ilimitado e a presença que faz da própria
existência um dom. Somos chamados a sermos eternos e não imortais. Deus promete aos que amam a ressurreição da carne e a
vida eterna e não a imortalidade da alma. O Espírito nos transforma,
cotidianamente, em fonte e dom. Cada menor gesto de solidariedade, cada
abandono da estabilidade pessoal, cada passo em direção aos que sofrem é uma
ressurreição vingada, pois “se em minha vida negligencio completamente a
atenção ao outro, importando-me apenas com ser ‘piedoso’ e cumprir meus ‘deveres
religiosos’, então definha também a relação com Deus. Nesse caso, trata-se de
uma relação ‘correta’, mas sem amor” (Bento XVI, Deus caritas est). Somente como fonte e dom, poderemos viver no
Espírito do Ressuscitado e nos tornarmos o círio pascal que ilumina a todos com
o esplendor da vida. Poderemos ser os artesãos que carregam em seus gestos e
tramas do viver cotidiano a Luz do triunfo do Cristo sobre a morte e proclamar
que não somos herdeiros de um túmulo vazio e que “Deus não é um Deus dos
mortos, mas um Deus dos vivos” (Mt 22, 32). Neste domingo de Páscoa devemos
responder, no mais íntimo de nós, a pergunta de Jesus à Marta: “Crês
nisto?...Se creres verás a glória de Deus” (Jo 11, 40) e, então, deixarmos
nosso espírito balbuciar em gemidos de amor: “Eu sou para o meu amado e meu
amado é para mim, ele que apascenta entre os lírios” (Ct 6, 3).
CONTEMPLAR
“Que o Cristo
está morto..., que ele foi enterrado, e que ele ressuscitou ao terceiro dia (1ª
epístola aos Coríntios, 15)”, 1964, Salvador Dalí (1904-1989), aquarela, Coleção Biblia
Sacra, Chant V/99, Editora Rizzoli, Milão, Itália.