Os transbordamentos de amor acontecem
sobretudo nas encruzilhadas da vida, em momentos de abertura, fragilidade e
humildade, quando o oceano do amor de Deus arrebenta os diques da nossa
autossuficiência e permite, assim, uma nova imaginação do possível (Papa
Francisco).
Santíssima Trindade 30.05.2021
Dt 4, 32-34.39-40 Rm 8, 14-17 Mt 28, 16-20
ESCUTAR
“Reconhece, pois, hoje, e grava-o em teu coração, que o Senhor é o Deus lá em cima no céu e cá embaixo na terra e que não há outro além dele (Dt 4, 39).
Vós não recebestes um espírito de escravos, para recairdes no medo, mas recebestes um espírito de filhos adotivos, no qual todos nós clamamos: Abá, ó Pai! (Rm 8, 15).
Quando viram Jesus, prostraram-se diante dele. Ainda assim alguns duvidaram (Mt 28, 17).
MEDITAR
O gesto supremo da humanidade histórica de Jesus foi o dom de si mesmo na cruz. Fruto do sim dito ao Pai pelo Verbo encarnado, esse ato de amor está na gênese da realização final do desígnio de Deus: a introdução da humanidade na comunhão da Trindade.
(Francisco Catão, 1927-2020, Brasil)
ORAR
É necessário crer na Trindade? Pode-se? Serve para algo? Não é
uma construção intelectual desnecessária? Muda algo em nossa fé se não
acreditamos no Deus trinitário? Há dois séculos, o célebre filósofo Immanuel
Kant escrevia estas palavras: “Desde o ponto de vista prático, a doutrina da
Trindade é perfeitamente inútil”. Nada mais longe da realidade. A fé na
Trindade muda não só nossa visão de Deus, como também nossa maneira de entender
a vida. Confessar a Trindade de Deus é crer que Deus é um mistério de comunhão
e de amor. Não um ser fechado e impenetrável, imóvel e indiferente. Sua
intimidade misteriosa é somente amor e comunicação. Consequência: no fundo
último da realidade, dando sentido e existência a tudo, não há senão Amor. Tudo
o que existe vem do Amor. O Pai é Amor originário, a fonte de todo amor. Ele
inicia o amor. “Só ele começa a amar sem motivos; é ele quem desde sempre
começou a amar” (Eberhard Jüngel). O Pai ama desde sempre e para sempre, sem
ser obrigado nem motivado de fora. É o “eterno Amante”. Ama e seguirá amando
sempre. Nunca nos retirará seu amor e fidelidade. Dele só brota amor. Consequência:
criados à sua imagem, somos feitos para amar. Só amando acertamos na
existência. O ser do Filho consiste em receber o amor do Pai. Ele é o “Amado
eternamente”, antes da criação do mundo. O Filho é o Amor que acolhe, a
resposta eterna ao amor do Pai. O mistério de Deus consiste, pois, em dar e em
receber também amor. Em Deus, deixar-se amar não é menos que amar. Receber amor
é também divino! Consequência: criados à imagem desse Deus, somos feitos não
somente para amar, mas para ser amados. O Espírito Santo é a comunhão do pai e
do Filho. Ele é o Amor eterno entre o Pai amante e o Filho amado, o que revela
que o amor divino não é possessão ciumenta do Pai nem monopólio egoísta do
Filho. O amor verdadeiro é sempre abertura, dom, comunicação transbordante. Por
isso, o Amor de Deus não permanece em si mesmo, mas se comunica e se estende
até suas criaturas. “O amor de Deus se derramou em nossos corações pelo
Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5, 5). Consequência: criados à imagem
desse Deus, somos feitos para nos amar, sem monopolizar e sem nos fechar em
amores fictícios e egoístas.
(José Antonio Pagola, 1937- , Espanha).
CONTEMPLAR
Uma pessoa, três sombras, 2010, Anne Schmickel, Estados Unidos.