Muitos pensam de modo
diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos
modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que
temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens
e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)
Não temos um só Pai? Não nos
criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)
V Domingo da Quaresma 02.04.2017
Ez 37, 12-14 Rm 8, 8-11 Jo 11, 1-45
ESCUTAR
Poreis
em vós o meu espírito, para que vivais, e vos colocarei em vossa terra (Ez 37,
14).
Aquele
que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos corpos
mortais por meio do seu Espírito que mora em vós (Rm 8, 11).
“Desatai-o
e deixai-o caminhar!” (Jo 11, 44).
MEDITAR
Silêncio!
És
feito de pensamento, afeto e paixão.
O
que resta é nada
além
de carne e ossos.
Por
que nos falam
de
templos de oração,
de
atos piedosos?
Somos
o caçador e a caça,
outono
e primavera,
noite
e dia,
o
Visível e o Invisível.
Somos
o tesouro do espírito.
Somos
a alma do mundo,
livres
do peso que vergasta o corpo.
Prisioneiros
não somos
do
tempo nem do espaço
nem
mesmo da terra que pisamos.
No
amor fomos gerados.
No
amor nascemos.
(Jalal
ud-Din Rumi, Sufismo)
ORAR
Nossa
sociedade faz todo possível para esconder a morte e subtraí-la dos nossos olhos
e corações. Temos a pretensão de aniquilar com a sua fealdade ao evitar o
convívio com a nossa própria morte. A morte é um terminar de morrer, pois “a
gente morre é para provar que viveu e que não teve razão” (Guimarães Rosa). A
ressurreição dos mortos é um ponto central da fé e tem um impacto nas nossas
vidas, pois incide, de uma maneira determinante, no nosso caminho, nas opções a
serem tomadas e nas orientações que damos às nossas existências. A palavra de
Jesus é incisiva aos amigos e irmãs de Lázaro: “Desatai-o e deixai-o
caminhar!”. Morrer é não desatar os nós que nos impedem de caminhar; é manter
nossos rostos escondidos atrás de um pano mortuário que nos embaça os olhos, faz-nos
tropeçar, errar o alvo e manter contaminado o coração. Devemos expurgar os
anjos da morte, amigos dos que destroem a Criação de Deus para acumular posses
e poder, sinais do Maligno. Se o Espírito não nos livrar do medo não haverá
esperança para o mundo, pois a ressurreição é também ser libertado do medo para
enfrentar as formas de morte inventadas pelos homens. A morte é imposta pela
corrupção que usurpa a vida dos mais desfavorecidos, cria leis para o usufruto
dos bens que são para todos, divide para reinar e se abarrota do espólio de
morte feito de cinismo, hipocrisia e escárnio. O papa Francisco exorta: “A corrupção
dos poderosos acaba sendo paga pelos pobres que, por causa da avidez dos
outros, ficam sem aquilo de que têm necessidade e direito. A corrupção é
justamente o pecado acessível de alguém que tem autoridade sobre os
outros...econômica, política ou eclesiástica. Todos somos tentados pela
corrupção, porque quando alguém tem autoridade e se sente poderoso, se sente
quase como um deus. Somos corrompidos ao longo do caminho da própria segurança.
Com o bem-estar, o dinheiro, depois o poder, a vaidade, o orgulho. E daí brota
tudo: também o matar”. O triunfalismo é o terreno ideal para o comportamento
corrupto que não conhece a fraternidade ou a amizade, mas só a cumplicidade. O
papa Francisco alerta: “Quando uma pessoa vive no seu ambiente fechado respira
aquele ar próprio dos seus bens, da sua satisfação, da vaidade, de se sentir
seguro e confia apenas em si mesmo, perde a orientação, perde a bússola e não
sabe onde estão os limites”. A corrupção é proselitista e se disfarça de
comportamentos socialmente aceitáveis. Somos corrompidos pela mediocridade e
pela tibieza e nos tornamos acrobatas da delicadeza e campeões das boas
maneiras Como Pilatos, o corrupto lava as mãos, faz de conta que o problema não
lhe diz respeito e assim defende a sua zona corrupta de adesão ao poder a
qualquer preço. O Papa Francisco é incisivo: “Porque uma coisa corrupta é uma
coisa suja. Se encontramos um animal morto que está se deteriorando, que é
corrupto, é ruim e também fede. A corrupção fede! A sociedade corrupta fede! Um
cristão que deixa entrar dentro de si a corrupção não é cristão, fede!”. A todos
se passa o mesmo: não queremos pensar na morte. É melhor esquecê-la, não falar
disto e seguir vivendo cada dia como se fôssemos eternos. No entanto, “a morte
de cada um já está em edital” (Guimarães Rosa). Deus não impede ninguém de
morrer, pois todo homem experimentará a morte. Jesus também teve a sua vez e a
sua hora: chora, tem medo, se entristece até a morte e seu suor é seu próprio sangue.
Nossa morte é uma página no livro da Vida e o encontro final para um cristão
não é com sua própria morte, mas com a morte de Jesus. A Palavra de Jesus não é
mais um túmulo selado, mas uma chamada: “Lázaro sai!”.
CONTEMPLAR
Distrito
Financeiro e Bolsa de Valores de Nova Iorque, 2008, Christopher
Anderson (1970-), Magnum Photos, Kelowna, Canadá.