O Caminho da Beleza 20
Leituras para a travessia da vida
“A beleza é a grande necessidade do homem; é a raiz da qual brota o tronco de nossa paz e os frutos da nossa esperança. A beleza é também reveladora de Deus porque, como Ele, a obra bela é pura gratuidade, convite à liberdade e arranca do egoísmo” (Bento XVI, Barcelona, 2010).
“Quando recebia tuas palavras, eu as devorava; tua palavra era o meu prazer e minha íntima alegria” (Jr 15, 16).
Páscoa da Ressurreição 08.04.2012
At 10, 34.37-43 Cl 3, 1-4 Jo 20, 1-9
ESCUTAR
“Mas Deus o ressuscitou no terceiro dia, concedendo-lhe manifestar-se não a todo o povo, mas às testemunhas que Deus havia escolhido: a nós, que comemos e bebemos com Jesus, depois que ressuscitou dos mortos” (At 10, 40-41).
“Irmãos, se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres. Pois vós morrestes e a vossa vida está escondida, com Cristo, em Deus” (Cl 3, 1-3).
“Maria Madalena foi ao túmulo de Jesus, bem de madrugada, quando ainda estava escuro, e viu que a pedra tinha sido retirada do túmulo” (Jo 20, 1).
MEDITAR
“Não é preciso socorrer o próximo para o Cristo, mas pelo Cristo. Que o eu desapareça de tal modo que o Cristo, por intermédio da nossa alma e do nosso corpo, socorra o próximo” (Simone Weil, A gravidade e a graça).
“Outra coisa é sabermos manter esse amor ao Cristo por uma doação completa aos pobres e necessitados. Mesmo que seja pouco o que eles não ousam pedir, nós temos que adivinhar e é essa resposta que Deus pede de nós” (Madre Belém, Testamento Espiritual).
ORAR
A liturgia deste domingo não apresenta nenhum relato de como foi a ressurreição de Jesus e nem uma cronologia deste evento. O evangelista anuncia o Cristo Morto e Ressuscitado, apela-nos à fé neste anúncio e nos convida a proclamá-lo para todos. O dominicano Timothy Radcliffe escreve que “a história da morte e ressurreição do Cristo não é propriedade absoluta da Igreja, mas tornou-se uma história que oferecemos aos que vão vivê-la da sua maneira e talvez de um modo que não havíamos previsto”. Neste domingo de Páscoa, precisamos perguntar se, no fundo do nosso coração, aproveitamos os quarenta dias da quaresma como o tempo oportuno de assumir o conselho paulino: “Extirpai o fermento velho para serdes massa nova, uma vez que sois ázimos, já que nossa vítima pascal, Cristo, foi imolado”(1 Cor 5, 7). Tantas vezes vivemos, em nossas práticas descomprometidas, a indolência e a passividade de páscoas episódicas e não o êxodo até a terra da vida, da novidade e da luz. A pedra foi retirada do sepulcro como sinal de que a morte fora vencida e Cristo nos abriu totalmente o horizonte do impossível. Satanás foi condenado para sempre a ser o senhor dos medíocres e o príncipe dos resignados. Cervantes colocava nos lábios de Quixote: “A maior loucura é ver o mundo como ele é e não como deveria ser” e Paulo exclama que “a loucura de Deus é mais sábia que os homens” (1 Cor 1, 25). Celebrar a Páscoa não significa explorar a devoção de um sepulcro vazio, mas ler os sinais de que a fé na Ressurreição nasce de uma palavra e do anúncio de que nosso Deus “não é um Deus de mortos, mas de vivos, pois para ele todos vivem”(Lc 20, 38). Celebrar a Páscoa é colocar-se nas veredas do Ressuscitado e se deixar encontrar por Ele que, em cada novo momento, assume um rosto translúcido. Temos que vencer o medo de sair para fora do nosso sepulcro interior, pois o Cristo nos deixou o sinal de que voltaria para cear conosco: o pano que cobria a sua cabeça estava dobrado ao lado e não amassado junto às faixas que cobriram o seu corpo. Na cultura judaica, quando o senhor deixava o pano dobrado sobre a mesa era o sinal de que ainda voltaria para continuar a refeição. A nossa Páscoa deve ser celebrada no reino da gratuidade e da solidariedade, pois o Ressuscitado nos convida a ser, novamente, principiantes da vida. O Cristo é o Senhor do impossível e se revela no inacreditável: o perdão vence a traição, o abandono, a covardia, a mesquinhez e a esperteza dos cálculos. Deus removeu a pedra que mumificava as nossas esperanças e somos enviados para proclamar que a vida vence a morte em todas as partes em que ela se faz desesperadora: no narcotráfico, nos campos de extermínio, na produção das armas atômicas, mas também nas indigências de nossos hospitais públicos, das nossas escolas e na omissão das nossas igrejas ante a corrupção que condena seus filhos e filhas a uma vida indigna e sub-humana. Somos chamados a ser testemunhas do Ressuscitado e “celebrar a festa não com fermento velho, fermento da maldade e perversidade, mas com ázimos de sinceridade e verdade”(1 Cor 5, 8). Paulo nos conclama a “esperar as coisas celestes” e as realidades celestes aqui na terra são viver com generosidade, com espírito de serviço, numa presença samaritana que dignifique o Cristo que entregou a sua vida por nós. Dom Pierre Claverie, bispo de Oran, na Argélia, dominicano martirizado em 1996, escreveu: “A Igreja realiza a sua vocação e missão quando está presente nas rupturas que crucificam a humanidade na sua carne e na sua unidade, pois somente nestes lugares que se pode entrever a luz da Ressurreição”. A partir de agora, o mundo é a Galileia em que vivem nossos irmãos e irmãs e devemos anunciar-lhes que a humanidade é possível, a esperança que ainda não é pode ser e que a solidariedade e a compaixão nos salvam, pois Cristo, amaldiçoado pelos poderes civis e religiosos, foi condenado, morto, sepultado e ressuscitou dos mortos. Este é o nosso Credo e esta é a fé que nos abre os caminhos da Vida Eterna.
CONTEMPLAR
Ressurreição (parte do políptico “Paixão-Ressurreição”), Arcabas (Jean-Marie Pirot), óleo sobre tela, ouro fino 23 quilates, 2,22 m x 1,35 m, 2003, Saint-Pierre-de-Chartreuse, França.
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