Muitos pensam de modo
diferente, sentem de modo diferente. Procuram Deus ou encontram Deus de muitos
modos. Nesta multidão, nesta variedade de religiões, só há uma certeza que
temos para todos: somos todos filhos de Deus. Que o diálogo sincero entre homens
e mulheres de diferentes religiões produza frutos de paz e de justiça.
(Papa Francisco, 2016)
Não temos um só Pai? Não nos
criou um mesmo Deus? Por que trabalhamos tão perfidamente uns contra os outros?
(Ml 2, 10)
Assunção de Nossa Senhora 20.08.2017
Ap. 11, 19; 12, 1.3-6.10 1 Cor 15, 20-27 Lc 1, 39-56
ESCUTAR
Então
apareceu no céu um grande sinal: uma mulher vestida de sol, tendo a lua debaixo
dos pés e, sobre a cabeça, uma coroa de doze estrelas (Ap 12, 1).
O
último inimigo a ser destruído é a morte (1 Cor 15, 26).
“Bendita
és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!” (Lc 1, 42).
MEDITAR
Faça
seu caminho. Isso poderá lançá-la ao exílio e sua sociedade nativa poderá
tornar-se estranha, e você poderá ter muito pouco a ver com as pessoas de lá e
não ter com quem comunicar-se. Mas não se esqueça de que você terá a D’us para
fazê-la encontrar outros em exílio com quem terá muito para conversar.
(Rabino
Polsky, Judaísmo)
ORAR
A luz que brota da Assunção de Maria revela que
não estamos caminhando para a morte, mas para a Ressurreição. A Igreja Oriental
nomeia esta festa como Dormição: “Pois se cremos que Jesus morreu e
ressuscitou, assim também Deus, mediante Jesus, trará juntamente em sua companhia
os que dormem” (1 Ts 4, 14). O céu não representa uma ameaça nem uma chantagem,
mas uma possibilidade inaudita e um apelo à liberdade. Hoje, graças à
cumplicidade de Maria, podemos estender um fragmento do céu em nossos
horizontes; podemos abrir no cinza da nossa existência um fragmento de azul que
a salve da banalização e da vulgaridade. Na nossa travessia, corremos o risco
de uma vida incolor, insípida e sem perfume. Não devemos temer a morte, mas uma
vida reduzida a coisas irrisórias, sufocada pelas preocupações mesquinhas e
ausente de possibilidades. Celebramos a festa do corpo destinado à imortalidade
e devemos derrubar os maniqueísmos da divisão entre corpo e alma. Devemos
recuperar o sentido do corpo nesta experiência do céu na terra que é um feitio
de oração (Noel Rosa). Orar significa desatar-se. Desatar-se das máscaras da
hipocrisia, da falsa seriedade que nos impede de rir; das mãos encolhidas ao
invés de estendidas num gesto de dom; de pés que caminham em todas as direções
menos na do amor, da amizade e da paz. Nossos corpos devem resplandecer, transformados
pela palavra do Senhor, como sinais visíveis de Deus. Davi dança, nu, diante da
Arca da Aliança. O poeta escreve: “Quiseram eliminar-me, mas saltei mais para
cima porque eu sou a vida que não pode morrer e viverei em vós e vós vivereis
em mim porque Eu Sou o Senhor da dança” (Sidney Carter). E Nietzsche
argumentava: “Só posso acreditar num Deus que saiba dançar”. Nesta festa de
hoje, a grandiosa representação cósmica desfaz-se, pouco a pouco, na paisagem
montanhosa em que se destaca uma moça que caminha apressada. A Arca da Aliança
não aparece mais colocada no marco solene do Templo e objeto de ritos solenes,
mas no caminho, em marcha, na forma de uma criatura de carne que leva um filho
no ventre. O encontro entre as futuras mães se revela no diálogo das entranhas.
O salto de alegria que o Batista dá no ventre de Isabel é um dançar com o seu
primo. Nessa dança de ventres e corpos, o humano se faz portador do divino. O
mistério se manifesta com gestos e sinais que fazem parte da humanidade. O
corpo se faz tabernáculo da divindade e visibilidade do Transcendente. Maria
elevada resta infinitamente humana, mãe para sempre, voltada para a terra,
atenta aos sofrimentos dos seus filhos e filhas de todos os tempos e lugares.
Esta celebração traz em seu bojo um contraste entre o culto religioso e a
prática da vida. O culto religioso elogia e celebra o feminino da nossa
religião personificada em Maria. As festas de Maria se sucedem durante o ano litúrgico.
No entanto, a prática das nossas igrejas exclui, marginaliza e esquece as mulheres
quando melhor lhes convêm. Deus jamais revelou que as mulheres não podem
exercer os mesmos direitos que os homens. Se nós, cristãos, não pudermos mudar
esta realidade tradicional, devemos parar com a hipocrisia de elogiar o
feminino e alimentar as religiões que desprezam as mulheres que carregam em
seus ventres as gerações de todo o sempre.
CONTEMPLAR
Laetitia Casta, 2012,
Dominique Issermann (1947-), Maison Européenne de la Photographie, Paris,
França.
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