quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

O Caminho da Beleza 11 - Apresentação do Senhor

Como se visse o Invisível, mantinha-se firme (Hb 11, 27).

Apresentação do Senhor                    

Ml 3, 1-4                  Hb 2, 14-18             Lc 2, 22-32


ESCUTAR

Ele é como o fogo da forja e como a barrela dos lavadeiros; e estará a postos, como para fazer derreter e purificar a prata: assim ele purificará os filhos de Levi e os refinará como ouro e como prata, e eles poderão assim fazer oferendas justas ao Senhor (Ml 3, 1-3).

Pois, tendo ele próprio sofrido ao ser tentado, é capaz de socorrer os que agora sofrem a tentação (Hb 2, 18).

Foram também oferecer o sacrifício – um par de rolas ou dois pombinhos – , como está ordenado na lei do Senhor (Lc 2 24).

 

MEDITAR

Não há uma moral cristã. Há uma mística cristã. A imensa maioria dos cristãos não se apercebe disso [...] No Cristo, não há lei. No Cristo começa um regime novo, o regime da graça, que é o regime da liberdade, que é o regime do amor.

(Maurice Zundel)

Com Jesus, a justificação do desejo se transforma em amor. A ternura infinita do coração de Deus – falo evidentemente com palavras humanas – explodiu em nós. Seu filho, Jesus, assim nos mostrou e inicia quem o queira no desejo libertado pelo amor.

(Françoise Dolto)

 

ORAR

    Maria e José cumprem a Lei de Moisés: a que pariu deve ser purificada aos quarenta dias do nascimento do varão e o primogênito deve ser consagrado a Deus. Como não tinham dinheiro para comprar um cordeiro, foi colocado no altar a oferenda mínima prescrita aos mais pobres, dois pombos. A luz que Simeão vê não desce do alto e nem do monte Sinai, mas jorra intensamente do próprio Menino. É o prenúncio da Luz da Páscoa que não apaga da memória as trevas da Paixão, mas que as ilumina ao revelar que a loucura de Deus é mais sábia que os homens e a fraqueza de Deus é mais forte que os homens” (1 Cor 1, 25). Na Cruz, Deus se desvela, infinitamente, mais forte que todos os seus inimigos. Bernardo de Claraval pregava: “O que é mais violento que o Amor e, no entanto, o que existe de menos violento? Qual é esta força tão violenta para alcançar a vitória e tão vencida para suportar a violência?” (Sermão 64 sobre o Cântico dos Cânticos). A comunidade eclesial deve estar segura de que tudo acontece por Ele, com Ele e Nele, pois “como Ele próprio sofreu a prova, pode ajudar os que são provados”. Esta é a festa da Luz que brota dos menores e simples, dos que vivem à margem da vida e que nós desviamos o olhar para não encontrá-los. Nosso coração continua nas sombras porque está fechado em si mesmo e sem saber que a luz do Cristo é de outra ordem. Ela vem da abertura absoluta do coração e de sua disponibilidade absoluta para servir. O Papa Francisco dizia: “A paz não se vende e nem se compra. Ela é um dom de Deus. Um cristão, mesmo nas provas mais dolorosas, jamais perde a paz e a presença de Jesus”. Nas comunidades eclesiais, quando não vivemos para os outros, somos atormentados pelas falsas imagens que fazemos de Jesus Cristo para nos poupar dos encontros vitais com os diferentes de nós. Fechados sobre nós mesmos, encastelados nas instituições forjadas por nós e para nós esvaziamos a força vital do Espírito e perdemos o dom de Deus. A eucaristia é o sacramento do dom para os outros e com os outros, pois não somos cristãos para nos salvarmos sozinhos, como os antigos missionários pregavam “salva a tua alma”. Se assim fosse, a Eucaristia seria uma atroz imitação e uma pérfida dissimulação. Hoje é a festa da Luz que brota no mais íntimo dos menores e dos bem-aventurados do Reino, pois Jesus disse: “Todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequeninos, que são meus irmãos, foi a Mim que o fizestes” (Mt 25, 40). Meditemos as palavras do Papa Francisco: “O Senhor que viveu humildemente nos ensina que nem tudo é mágica em nossa vida e que o triunfalismo não é cristão. A justa atitude do cristão é perseverar no caminho do Senhor, até o fim, todos os dias. Eu não digo recomeçar de novo todos os dias: não, perseguir o caminho, um caminho com dificuldades, mas com tantas alegrias. O caminho do Senhor”.

(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)

 

CONTEMPLAR

 @padrejulio.lancellotti, 27 de dezembro de 2024.




 

quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

O Caminho da Beleza 10 - III Domingo do Tempo Comum

Como se visse o Invisível, mantinha-se firme (Hb 11, 27).

III Domingo do Tempo Comum                  

Ne 8, 2-6.8-10                   1 Cor 12, 12-30                  Lc 1, 1-4;4, 14-21

 

ESCUTAR

“Este é um dia consagrado ao Senhor, vosso Deus. Não fiqueis tristes nem choreis...porque a alegria do Senhor será a vossa força” (Ne 8, 8.10).

Todos nós, judeus ou gregos, escravos ou livres, fomos batizados num único Espírito para formarmos um único corpo, e todos nós bebemos de um único Espírito (1 Cor 12, 13).

Todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele (Lc 4, 20).

 

MEDITAR

Minha vida é só um instante, uma hora passageira. Minha vida é somente um dia que me escapa e foge. Tu sabes, ó meu Deus! Para te amar sobre a terra não tenho nada a não ser hoje!

(Santa Teresa do Menino Jesus)

Não tenham medo da ternura.

(Papa Francisco)

 

ORAR

Os textos desta liturgia nos falam do dia consagrado, um hoje permanente em que devemos celebrar o proclamado: “a alegria do Senhor será a vossa força”. O Senhor nos pede uma coerência irredutível entre palavra e ação. O evangelista apresenta Jesus no centro da sinagoga recebendo o livro do profeta Isaías. Jesus não o abriu a esmo, como se tirasse a sorte para que Deus lhe falasse magicamente. Ao contrário, abriu o livro e “achou a passagem” que o colocava na estatura de profeta e de sacerdote: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a boa nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar um ano de graça do Senhor”. O hoje de Deus é proclamado, pleno de graça e julgamento, para os homens do seu tempo e o Ressuscitado, continua proclamando-o, como amor salvador, em todas as épocas e situações. Jesus coloca em seu lugar, como centro de irradiação, os mais necessitados de compaixão e misericórdia que são, segundo o Evangelho, o próprio Deus conosco: “Senhor, quando foi que o vimos com fome, ou com sede, como estrangeiro, nu, doente ou na cadeia?” (Mc 25, 37). Jesus, na sinagoga, era um rosto comum como tantos outros e hoje ele ainda é comum porque é o rosto conhecido de tantos pobres, cativos, cegos e oprimidos. Por mais avanço nos meios de difusão e comunicação ao nosso alcance, não conseguimos superar a cisão entre fé e vida porque nos recusamos a ver o Deus que se revela com um rosto humano. Mesmo com os “olhos fixos nele”, não o enxergamos porque tentamos vê-lo com as lentes do proselitismo e do poder e não com os olhos humanos da compaixão. Apesar de todos os slogans utilizados nas nossas propagandas religiosas, Deus continua a viver no exílio em sua própria casa. O Papa Francisco nos exorta: “Sou eu o guardião do meu irmão? Sim, tu és o guardião do teu irmão! Ser uma pessoa humana significa sermos guardiões uns dos outros! E, ao contrário, quando se rompe a harmonia, segue uma metamorfose: o irmão a guardar e a amar se torna o adversário a combater e a suprimir. Em cada violência e em cada guerra, fazemos renascer Caim”.

(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)

 

CONTEMPLAR

Cristo Crucificado, 1632, Diego Rodrigues da Silva y Velásquez (1599-1660), óleo sobre tela, 250 cm x 170 cm, Museu do Prado, Madri, Espanha.






quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

O Caminho da Beleza 09 - II Domingo do Tempo Comum

Como se visse o Invisível, mantinha-se firme (Hb 11, 27).


II Domingo do Tempo Comum                    

Is 62, 1-5                 1 Cor 12, 4-11                     Jo 2, 1-12

 

 

ESCUTAR

 

Assim como o jovem desposa a donzela, assim teus filhos te desposam; e como a noiva é a alegria do noivo, assim também tu és a alegria de teu Deus (Is 62, 5).

 

Há diversidades de dons, mas um mesmo é o Espírito. Há diversidade de ministérios, mas um mesmo é o Senhor. Há diferentes atividades, mas um mesmo Deus que realiza todas as coisas em todos. A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum (1 Cor 12, 4-7).

 

Como o vinho veio a faltar, a mãe de Jesus lhe disse: “Eles não têm mais vinho” (Jo 2, 3).

 

 

MEDITAR

 

Aquele que vê sofrer o seu irmão na necessidade e lhe fecha seu coração exclui Deus do seu próprio coração. O amor de Deus e o do próximo são como duas portas que só podem ser abertas e fechadas ao mesmo tempo.

 

(Søren Kierkegaard)

 

 

ORAR

 

A inauguração da vida pública de Jesus é colocada, pelo evangelista, num contexto de festa de bodas. Aos nossos olhos, não parece ser o melhor lugar para os seus discípulos iniciarem o seu noviciado. Tudo começa numa festa para que nossa alegria não se empobreça. É um grande equívoco unir a Sua presença aos momentos de dor e de dificuldades em nossa existência. Jesus revela que nossas festas são tímidas e frágeis; que a algazarra esconde um vazio e uma angústia; que o vinho é insuficiente e de baixa qualidade. Com Jesus, a festa encontra a sua plenitude e não está limitada ao tempo. Com Ele, o vinho é novamente colocado sobre a mesa e nunca mais faltará. Todos se beneficiarão dos seus dons, inclusive os que não esperam nada Dele. Maria intervém não porque falta o pão, mas falta o vinho que é o símbolo da alegria. As seis talhas de pedra significam o número inacabado da imperfeição em oposição ao número sete que expressa a totalidade e a plenitude. As talhas estão vazias e o ritual complexo das purificações esconde sua ineficácia, pois a relação entre Deus e o homem só pode se restabelecer por meio do amor. Na festa, todos os rituais de purificação foram cumpridos conforme a Lei e, no entanto, só produziram ansiedade, medo e tristeza. Faltara o vinho do amor e Jesus vai oferecer a todos, em abundância, a degustação do seu vinho de ternura e alegria, pois “No amor não há lugar para o temor; ao contrário, o amor desaloja o temor. Pois o temor se refere ao castigo, e quem teme não alcançou um amor perfeito” (1 Jo 4, 18). O cardeal Ravasi é enfático: “O amor que existe sobre a face da terra e que reaparece cada vez que duas criaturas se encontram e se amam é o sinal do amor que Deus tem pela humanidade inteira”. Em Caná da Galileia, Jesus começou os seus sinais para manifestar a sua glória e João não nos fala de “milagres”, mas de sinais. Na festa das bodas, o sinal é dado pela preocupação de Alguém para que a festa seja completa. O Senhor sempre faz sinais, esboça sussurros de ternura e alegria para nos fazer, com o pudor do amor, suspeitar que Ele nos ama e quer intervir na trama ordinária da nossa vida para nos convidar à festa. O mundo contemporâneo permanece indiferente à mensagem das igrejas cristãs porque as pessoas necessitam que elas apontem sinais que toquem as suas existências e corações. Sinais de compaixão, sinais de acolhida sem discriminação de pessoas, sinais que possam fazer descobrir nos cristãos a capacidade de se encontrar com Jesus que alivia os sofrimentos e nos sustenta a esperança nas dificuldades cotidianas da vida. Não podemos evangelizar a torto e a direito, como uma catequese de talhas de pedra, numa verborragia que só faz crescer o temor e a ansiedade e que é estéril e inexistente de sinais de vida, de alegria e comunhão compassiva. Escutemos Simone Weil: “Acima da infinidade do espaço e do tempo, o amor infinitamente mais infinito de Deus vem apoderar-se de nós. Ele vem na sua hora. Nós temos o poder de consentir na acolhida ou na recusa. Se ficamos surdos, ele vem e volta novamente como um mendigo, mas também como um mendigo um dia ele não retorna mais”.

 

(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)

 

 

CONTEMPLAR

Competição de casais de dançarinos no salão de dança, Shutterstock, stock foto ID: 621830753, shutterstock.com, acessado em 15.01.2025.




quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

O Caminho da Beleza 08 - Batismo do Senhor

Como se visse o Invisível, mantinha-se firme (Hb 11, 27).


Batismo do Senhor                    

Is 42, 1-4.6-7                     At 10, 34-38                       Lc 3, 15-16.21-22

 

ESCUTAR

“Eis o meu servo – eu o recebo; eis o meu eleito – nele se compraz minha alma” (Is 42, 1).

“Deus não faz distinção entre as pessoas. Pelo contrário, ele aceita quem o teme e pratica a justiça, qualquer que seja a nação a que pertença” (At 10, 34).

Enquanto rezava, o céu se abriu e o Espírito Santo desceu sobre Jesus em forma visível, como pomba (Lc 3, 21-22).

 

MEDITAR

Um homem que caminha, um pássaro que voa, uma folha que tomba: tudo anuncia o começo de uma dança. No coração do átomo e no ballet dos astros, o ritmo e a harmonia são semeados por nossos Criador e Pai. Escutar a música, olhar a dança são verdadeiras orações.

(D. Helder Câmara)

 

ORAR

Jesus não se enquadra nos esquemas e nos escaninhos que os homens predispuseram para Ele. Jesus desmente a própria imagem apresentada pelo Batista: um Messias cheio de ira e que colocaria ordem “na casa”. O estilo de Jesus não casa com os gostos e as previsões dos que O esperavam. O seu modo diferente de ser é o de Servo (Is 42, 1ss): que não faz publicidade, não enche as praças com uma voz potente e sonora cheia de retóricas e ameaças. Ele é solidário com os perdedores, com os fracos; com os capazes de dar confiança e sustentar a esperança. Ele se coloca ao lado dos pobres e daqueles que não contam para a sociedade da opulência e do consumo. O batismo prefigura a morte e a ressurreição de Jesus. A imersão no rio simboliza a ação de morrer e o seu emergir a vida nova que surge e é selada pelo abrir do céu e a voz do seu Pai que declara o seu bem querer. O céu aberto para sempre traz o novo dia e nos faz saber que o muro entre Deus e os homens foi destruído: Deus não é mais o Inacessível. Jesus tem preferência por todos e “andava por toda a parte fazendo o bem e curando a todos os que estavam dominados pelo demônio, porque Deus estava com ele”. Jesus manifesta o seu poder ao se ocupar dos fracos e se revelar como manso e humilde de coração. O nosso batismo deve ultrapassar os registros dos arquivos paroquiais numa prática cristã que honre os compromissos que outros assumiram por nós. Não basta delegar à certidão paroquial a prova de que somos batizados. É necessário que o batismo seja assumido por nós para que não se sepulte como um ato convencional e social. Caso contrário, seremos demissionários do nome de cristãos que nos deram. Antes, quando crianças, não podíamos ler o Evangelho. Agora, podemos e devemos, pois temos o direito de saber o que somos e qual a prática de vida que nos qualifica como cristãos. Batismo e manifestação de Jesus de Nazaré coincidem. O que agrada o Senhor não são os ritos carentes de amor, mas uma vida “em espírito e em verdade” no Espírito de Jesus. O cardeal Ratzinger escrevia: “O batismo é o arco-íris de Deus sobre nossa vida, a promessa do seu grande Sim, a porta da esperança e o caminhar numa união viva e pessoal com Jesus Cristo pelos seus caminhos. Olhando para Ele sabemos que Deus é maior que o nosso coração” (Homilia do Batismo, 07.01.1990). Paulo nos exorta: “Não matem o Espírito de Deus” (1 Ts 5, 19) e uma igreja com o Espírito apagado ou esvaziada do Espírito de Jesus não pode viver e nem comunicar sua verdadeira novidade e, muito menos, saborear e proclamar a Boa Nova.

(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)

 

CONTEMPLAR

O Batismo do Cristo, s.d., Daniel Bonnell, óleo sobre tela, 92” x 46”, Igreja Missionária Baptista do Monte Calvário, Carolina do Sul, Estados Unidos.





quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

O Caminho da Beleza 07 - Epifania do Senhor

Como se visse o Invisível, mantinha-se firme (Hb 11, 27).


Epifania do Senhor                   

Is 60, 1-6                 Ef 3, 2-3a.5-6                    Mt 2, 1-12

 

ESCUTAR

 “Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor” (Is 60, 1).

“Os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo por meio do evangelho” (Ef 3, 6).

“O rei Herodes ficou perturbado, assim como toda a cidade de Jerusalém” (Mt 2, 3).

 

MEDITAR

A Igreja Católica exorta seus filhos ao diálogo e à colaboração com os seguidores das outras religiões, para que deem o testemunho da fé e da vida cristã, reconhecendo, servindo e promovendo os bens espirituais e morais assim como os valores socioculturais presentes nelas.

(Nostra Aetate, 2)

Temos de renunciar ao cristianismo, se nos obrigarem a renunciar a essas dialéticas esquartejadoras dos sentimentos cristãos, reduzindo-as à escala das sentimentalidades cômodas. Temos que romper a puerilidade de um cristianismo que produz homens delicados e frágeis que nunca avançam para uma fé comprometida, pois "vivem tremendo e murados em suas defesas"

(Emmanuel Mounier)

 

ORAR

Hoje é a festa da luz porque a manifestação do Senhor, a sua epifania, é inseparável da luz. Quando o Senhor se manifesta, existem os que ao responder se colocam em caminho e buscam. Há outros, porém, que se escondem e dissimulam as suas vidas e os seus encontros. Os magos foram tomados de uma imensa alegria enquanto Herodes ficou perturbado assim como a Jerusalém do poder e do saber. Os sumos sacerdotes e os escribas foram convocados para uma reunião de emergência e nela manifestam o seu incômodo e desconfiança. É significativo que a aparição da “bondade de Deus, nosso Salvador, e seu amor pelos homens” (Tt 3, 4) suscite perturbação nos que detêm o poder civil e religioso. A presença de Deus que se manifesta na fraqueza surge como um perigo e uma ameaça para a ordem estabelecida e para as posições consolidadas. O Cristo constitui uma ameaça para o nosso reino privado ao colocar em xeque nossos equilíbrios cansados e nossas falsas seguranças. O Papa Francisco afirma: “Preferem uma vida enjaulada em seus preceitos, em seus compromissos, em seus planos revolucionários ou em sua espiritualidade desencarnada” (Homilia 20.12.2013). O cristão lúcido sabe que é melhor a perturbação do que a indiferença; é melhor o compromisso do que a neutralidade; é melhor a recusa do que a ambiguidade. O cristão sabe que é necessário um coração para assombrar-se e alargar-se. O profeta desvela a expansão da luz e a sua alegria contagiosa. O evangelista, por sua vez, dá a conhecer o medo dos sábios cuja busca finda em suas bibliotecas palacianas, no meio dos pergaminhos cobertos de pó nos quais procuram sentenças definitivas. O caminho, com as suas imprevisibilidades e surpresas, não é o seu assunto. O coração dos magos é o coração dos que buscam, apaixonadamente, abrigar o mistério. O coração dos detentores do poder é árido, mesquinho e intolerante. Os magos nos revelam que entre o relâmpago do surgimento da estrela e o seu acompanhamento até o último trecho do caminho seremos assomados por dúvidas, cansaços, perdas e desilusões, mas, sobretudo, por esperanças. A estrela surge como uma chispa de fogo, acende o desejo e só volta a brilhar intensa e permanentemente no final quando o encontro se realiza. A busca não é nunca uma marcha triunfal: implica numerosas partidas e recomeços e não devemos dela esperar manifestações espetaculares. O que conta é a perseverança: a capacidade de não desertar, de não ceder ao desalento, de não se desviar para cômodos refúgios e nem se contentar com conquistas provisórias; a obstinação para caminhar quando tudo parece inútil, absurdo e impossível. E o que mais conta ainda é o discernimento de que para adorar a Deus é preciso nos deter diante do mistério do mundo e saber olhá-lo com amor. Quem olha a vida amorosamente começará a vislumbrar as vibrações de Deus antes mesmo de ser envolvido por elas. 

(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)

 

CONTEMPLAR 

Viagem perigosa, 2018, Jacob Ehrbahn (1970-), Dinamarca, Siena International Awards Photo.