A Palavra se fez carne e armou sua tenda entre nós (Jo 1, 14).
XXIX Domingo do Tempo Comum
Is 53, 10-11 Hb 4, 14-16 Mc 10, 35-45
ESCUTAR
“Meu Servo, o justo, fará justos inúmeros homens, carregando sobre si suas culpas” (Is 53, 11).
“Aproximemo-nos então, com toda a confiança, do trono da graça, para conseguirmos misericórdia e alcançarmos a graça de um auxílio no momento oportuno” (Hb 4, 16).
“Quem quiser ser grande, seja vosso servo; e quem quiser ser o primeiro, seja o escravo de todos” (Mc 10, 43-44).
MEDITAR
A gratuidade consiste acima de tudo em não levar em consideração nenhuma satisfação humana. A gratuidade lança a semente, sem esperar a aparição de qualquer fruto que seja; ela trabalha num Reino onde a única certeza é a da presença misteriosa do Cristo. Eis o que é a verdadeira gratuidade, ó Senhor: dar-me sem cálculo, ao serviço do coração do homem.
(Carlo Maria Martini)
ORAR
Os textos deste domingo nos colocam diante do valor fundamental da nossa sociedade atual: o status e o poder. O evangelista, ao narrar o pedido dos filhos de Zebedeu, denuncia o fisiologismo, a busca da satisfação de interesses, de vantagens pessoais ou partidárias, em detrimento do bem comum: queimando todas as etapas do seguimento de Jesus, sobretudo a cruz, os dois pediam para estar, lado a lado, na glória do Senhor. A ambição do poder rompe todo e qualquer princípio, transforma-se numa violenta injustiça porque corrompe as pessoas, gera a discriminação, legitima a traição, incentiva a divisão, estimula o cinismo e aguça os preconceitos que amarram a vida, diminuindo a nossa própria humanidade. O pedido é sumariamente recusado e Jesus os faz descobrir a condição para o acesso à glória: o servir a todos. Jesus não estabelece uma regra para vencer na vida, mas traça o caminho do seguimento. Servir não é desaparecer, nada fazer, dar algumas poucas horas voluntárias ou recusar responsabilidades. Servir é tornar público o nosso testemunho de amor ainda que sejamos vítimas do ardil das pessoas que só pensam em si mesmas, como Tiago e João. O caminho da cruz não é feito de um dolorismo, como muitas vezes somos levados a pensar. O caminho da cruz não é um sofrer, mas é, antes de tudo, um servir. A pedagogia de Jesus, como uma sinfonia, vai num crescendo: primeiro, devemos tomar a nossa cruz e arriscar a nossa vida pelo Evangelho; depois viver entre irmãos num testemunho de amor fraterno e, finalmente, assumirmos a identidade com o Cristo-Servo até o dom da sua vida por todos. Jesus tinha uma autêntica repugnância a todas as manifestações de ambição e de arrivismo entre os seus discípulos. As intrigas entre as igrejas e o carreirismo muitas vezes se servem do Cristo como tapume do egoísmo e são abomináveis aos olhos do Senhor. O papa Francisco exorta: “Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro e que acaba presa num emaranhado de obsessões e procedimentos. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: ‘Dai-lhes vós mesmos de comer’ (Mc 6, 37)” (EG 49). Jesus entendia que o ser humano não é chamado apenas para sobreviver, mas para expandir tanto a plenitude da sua própria humanidade quanto a do mistério de Deus. Ele nos conclama a possuirmos tão plenamente a nossa vida que possamos doá-la sem medo. Jesus marca a sua vida por uma liberdade tão assustadora para os que não são livres que eles se levantam com ira para destruir o doador da vida. Numa vida assim beber o cálice é sorver, até a última gota, o amor que conseguimos como entrega e oblação; e ser batizado é mergulharmos no risco que acarreta de sermos cristãos no mundo de hoje, pois Jesus não está do lado do triunfo e do sucesso, mas da fraqueza e da morte. Que possamos, como cristãos, diante da responsabilidade que nos cabe na transformação do mundo, pedirmos: “Pai amoroso, perdoa-nos quando dermos importância demais àquilo que a Ti pouco importa!”.
(Manos da Terna Solidão/Pe. Paulo Botas, mts e Pe. Eduardo Spiller, mts)
CONTEMPLAR
Cristo destacado da cruz (Courajod Christ), século XII, madeira com traços policromados, 155 x 168 x 30 cm, Museu do Louvre, Paris, França.
Nenhum comentário:
Postar um comentário