segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

O Caminho da Beleza 11 - V Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


V Domingo do Tempo Comum                     04.02.2018
Jó 7, 1-4.6-7                       1 Cor 9, 16-19.22-23                   Mc 1, 29-39


ESCUTAR

“Não é acaso uma luta a vida do homem sobre a terra” (Jó 7, 1).

Em que consiste então o meu salário? Em pregar o evangelho, oferecendo-o de graça, sem usar os direitos que o evangelho me dá (1 Cor 9, 18).

Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto (Mc 1, 38).


MEDITAR

Nesse processo de conhecer o que denominamos divino, o Deus que é amor aos poucos se transforma no amor que é Deus...Caminhamos para dentro desse Deus e nos deixamos absorver por esse amor expansivo, abundante e gratuito. Quanto mais nos adentramos nesse amor e partilhamos dele, mais nossa vida se abre para novas possibilidades, para a sacralidade transpessoal e para a transcendência ilimitada.

(John Shelby Spong, 1931-, Igreja Episcopal, Estados Unidos)


ORAR

            Por “vida ativa”, entendo a atividade com vista à conversão e a salvação do próximo; por “vida contemplativa”, a relação escondida com Deus pela oração. Há momentos em que as duas podem coexistir bem. Eu digo “há momentos”, porque a mania imatura de querer instruir e converter impregna o cristianismo da mesma forma que a doença impregna o corpo! E creio que é preciso percorrer um bom caminho com Jesus, antes de poder ser admitido ao círculo restrito de seus apóstolos (cf. At 1, 21-22). O próprio Filho de Deus – e isso é um mistério – não permaneceu escondido durante trinta anos antes de começar sua vida pública e ativa? E se qualquer um é verdadeiramente chamado e enviado pelo Salvador para o serviço e o despertar do próximo, a vida ativa deve sempre, como antes, manter-se submissa à vida contemplativa, e esta última deve ser sua mais importante preocupação. Quero dizer que esses discípulos não deveriam ficar todo o tempo a agir, a sair e a falar, mas que é também necessário a tais apóstolos aproximarem-se mais vezes de Jesus para se entreter com ele e para repousar um pouco num lugar deserto (cf. Mc 6, 30-31). Isso permite ao serviço da Palavra de manter-se sempre ligado à perseverança da oração (cf. At 6, 4), subordinando-se a ela. De uma maneira geral, aliás, eles não deveriam jamais se doar sem reservas à relação e ao trabalho com seus próximos, sob o risco de negligenciar o “vigia a tua pessoa” (1 Tm 4, 16) ou melhor, sob o risco de colocar essa vigilância após o ensinamento, porque poderia acontecer que depois de ter pregado aos outros, eles fossem desqualificados (1 Cor 9, 27).

(Gerhard Tersteegen, 1697-1769, Tratados Espirituais, Igreja Luterana, Ruhr, Alemanha)


CONTEMPLAR


S. Título, 1984, México, Estado de Guerrero, Cidade de San Agustin de Oapan, Abbas Alttar (1944-), Magnum Photos, Irã.



segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

O Caminho da Beleza 10 - IV Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


IV Domingo do Tempo Comum                   28.01.2018
Dt 18, 15-20                       1 Cor 7, 32-35                    Mc 1, 21-28


ESCUTAR

“O Senhor teu Deus fará surgir para ti, da tua nação e do meio de teus irmãos, um profeta como eu: a ele deverás escutar” (Dt 18, 15).

Irmãos, eu gostaria que estivésseis livres de preocupações (1 Cor 7, 32).

“Que queres de nós, Jesus nazareno? Vieste para nos destruir? (Mc 1, 24).


MEDITAR

O falso profeta esconde seu objetivo obscuro sob o manto da piedade, aproveitando-se da credulidade dos cristãos. Confia que não será desmascarado nessa veste inocente. Sabe também que os cristãos estão proibidos de julgar, e lhes refrescará a memória oportunamente a respeito disso! Talvez ele mesmo não tenha consciência de tudo isso; talvez Satanás, sua força motriz, lhe roube o conhecimento de si mesmo.

 (Dietrich Bonhoeffer, 1906-1945).


ORAR

            Cada um de nós, conforme a educação religiosa que recebeu, faz uma ideia para si de Jesus. Permanecemos, às vezes, com o “pequeno Jesus da manjedoura”, ou com o “bom Jesus, doce como um cordeiro, deixado pregado na cruz por nossos pecados”. O evangelho de hoje é particularmente interessante uma vez que ele nos traz as impressões totalmente diversas que Jesus causava em seus contemporâneos, no início de sua vida pública. “Jesus ensinava”. O que ele ensinava? Marcos não nos diz aqui, mas ele o diz no princípio de seu evangelho: ele proclamava a boa nova do Reino de Deus que se oferece a todos os homens: “Arrependei-vos e crede na boa nova de Deus que vem a vós!”... Jesus ensinava, mas não ensinava “como os escribas” (os catequistas daquele tempo) que só faziam repetir o que haviam aprendido. Jesus ao contrário ensinava com autoridade; via-se nele um profeta que falava da parte de Deus, um mestre que ensinava com destreza e liberdade, mesmo que não tivesse seguido nenhum dos estudos religiosos habituais; isso espantava: “De onde que lhe vem tudo isso?”... Jesus aparecia como um homem livre e como um homem de Deus. E nós, temos interesse em descobrir a verdadeira personalidade de Jesus, igual à que se depreende dos evangelhos? Enfim, Jesus manifestava sua autoridade arrancando os maus espíritos e curando os doentes, mesmo no dia do shabbat, dia consagrado a Deus, durante o qual não se devia se entregar a nenhum trabalho qualquer que fosse. Com o risco de ser muito malvisto pelas autoridades religiosas, Jesus tomou a liberdade de infringir essa norma sagrada quando se tratava de aliviar e curar as pessoas que sofrem. É uma maneira de nos dizer: os mandamentos religiosos são bons, mas não é preciso tomá-los como absolutos, é preciso colocá-los em prática inteligentemente, com toda retidão de consciência; e se acontece deles se acharem em oposição ao amor que devemos aos outros, um serviço urgente a fazer, o salvamento de um infeliz, então não hesiteis em colocar o amor adiante da observância do mandamento. Os bons cristãos praticantes têm às vezes a tendência de se conduzir com relação à sua Igreja como pequenas crianças bem espertas e obedientes, enquanto que o Cristo nos chama a nos tornar cristãos adultos, pensantes, que clareiam sua consciência à luz das diretivas da Igreja e que, em seguida, tomam suas decisões como homens livres e responsáveis. “É capital, escreveu recentemente um bispo, encorajar cada cristão a viver segundo sua consciência e não primeiramente segundo os julgamentos formulados por uma autoridade eclesiástica. Cada um será julgado a partir de suas escolhas de consciência” (Mons. Thomas).

(Bernard Prévost, 1913-, França)


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Um homem sem-teto adormecido no metrô de Paris, 1991, Stanley Greene (1949-2017), NOOR Imagens, Estados Unidos.



segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

O Caminho da Beleza 09 - III Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


III Domingo do Tempo Comum                   21.01.2018
Jn 3, 1-5.10             1 Cor 7, 29-31                    Mc 1, 14-20


ESCUTAR

“Levanta-te e põe-te a caminho da grande cidade de Nínive, e anuncia-lhe a mensagem que eu te vou confiar” (Jn 3, 2).

Eu digo, irmãos, o tempo está abreviado (1 Cor 7, 29).

E eles, deixando imediatamente as redes, seguiram a Jesus (Mc 1, 18).


MEDITAR

Quem põe a mão no arado e olha para trás não é apto para o reinado de Deus.

(Evangelho de Lucas 9, 62)


ORAR

            Se o texto não o diz, nós tomaríamos por inverossímil isto que talvez seja um dos maiores milagres de Jesus: um simples apelo de sua parte e os homens largam tudo o que faziam, até a sua vida, para tudo recomeçar. Jesus oferecia ao mesmo tempo um sentimento de liberdade, de independência e de grande largueza. O sinal da verdadeira vocação era o da descoberta repentina de que nada mais pode nos fechar nas muralhas deste mundo... Um homem não vive daquilo que faz para viver. Sua realidade emana da verdade que está nele e à qual ele é chamado. É bem esse o sentido primeiro e essencial do chamado de Simão e André. Há objetivos e realidades humanas pelas quais vale a pena largar tudo. Existem vocações e atitudes mais profundas do que as disposições por uma profissão, por um emprego. Uma coisa é fazer ou produzir algo do qual se possa viver, outra é saber aquilo que faz de nós seres humanos e pelo qual vale a pena viver. A única coisa religiosamente importante é a maneira pela qual se descobre a sua própria definição, aquela do seu ser profundo... Em nossa existência, o importante não é aquilo que nos formou desde a infância, mas é ousar pensar por si mesmo e saber se voltar aos outros, abrindo-se às exigências do presente. Nesse domínio, os Apóstolos descobrirão um mundo de coisas, indo de encontro à sua tradição. Ao seu lado, Jesus os fará renegar certos mandamentos e, por isso, saberão se desfazer de certos sentimentos de culpa que lhes serão incutidos. Eles deverão descobrir o vazio e o absurdo de certas normas sagradas e reprimir o medo que eles não poderão agora deixar de experimentar. Mas, cada vez que, apoiados sobre Jesus, tiverem a coragem de descobrirem-se a si mesmos, eles ganharão em humanidade e confiança. É isso que deve ser o significado do apelo a deixar “seu pai Zebedeu com os empregados” na barca: o passado não tem mais o poder de bloquear o futuro; os homens têm a chance de poder riscar de vez aquilo que lhes haviam ensinado até então; eles podem enfim se dirigir para um futuro livre e aberto. É suficiente notar a fraqueza da rede invisível na qual nos enredamos cotidianamente e ouvir o chamado à liberdade para compreender, imediatamente, a força que pode nos dar a escolha pelo Cristo. Dispomos a todo momento da faculdade inaudita de seguir adiante, sem mais preliminares, sem adestramento, sem angústia e sem obrigação, sem nos cercar de proteções, abertos, sensíveis e livres, uns em direção aos outros. Assim vivia o Cristo, quando ele dizia que Deus e seu reino estavam próximos. Falando da chegada próxima do “Filho do homem”, ele nos convida a viver desta mesma maneira.

(Eugen Drewermann, 1940-, teólogo e psicanalista alemão)


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Uma mulher refugiada Rohingya, exausta, toca a costa depois de atravessar a fronteira Bangladesh-Myanmar de barco através do Golfo de Bengala, em Shah Porir Dwip (Bangladesh), 11 de setembro de 2017, Danish Siddiqui (1983-), Agência Reuters, Mumbai, Índia.


segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

O Caminho da Beleza 08 - II Domingo do Tempo Comum

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


II Domingo do Tempo Comum                     14.01.2018
1 Sm 3, 3-10.19                 1 Cor 6, 13-15.17-20                    Jo 1, 35-42


ESCUTAR

“Senhor, fala, que teu servo escuta!” (1 Sm 3, 9).

Porventura ignorais que vossos corpos são membros de Cristo? Quem adere ao Senhor torna-se com ele um só espírito (1 Cor 6, 15.17).

João estava de novo com dois de seus discípulos e, vendo Jesus passar, disse: “Eis o Cordeiro de Deus!” (Jo 1, 35-36).


MEDITAR

Deus jamais se comunica plenamente nem suavemente a não ser a um coração despojado de tudo.

(São João da Cruz, século XVI)


ORAR

            A beleza do tempo comum está no fato de que nos convida a viver a nossa vida ordinária como um itinerário de santidade, isto é, de fé e de amizade com Jesus, continuamente descoberto e redescoberto como Mestre e Senhor, Caminho, Verdade e Vida do homem. É o que, na liturgia de hoje, nos sugere o Evangelho de João, apresentando-nos o primeiro encontro entre Jesus e alguns dos que se tornarão seus apóstolos. Eles eram discípulos de João Batista, e foi precisamente ele quem os orientou para Jesus, quando, depois do Batismo no Jordão o indicou como “Cordeiro de Deus” (Jo 1, 36). Então dois dos seus discípulos seguiram o Messias, o qual lhes perguntou: “Que procurais?”. Os dois perguntaram-lhe: “Mestre, onde moras?”. E Jesus respondeu: “Vinde e vereis”, isto é, convidou-os a segui-lo e a estar um pouco com Ele. Nas poucas horas transcorridas com Jesus, eles ficaram tão admirados, que imediatamente, André, falou com o irmão Simão dizendo-lhe: “Encontramos o Messias”. Eis duas palavras singularmente significativas; “procurar”, “encontrar”. Podemos tirar da página evangélica de hoje estes dois verbos e obter uma indicação fundamental para o ano novo, que desejamos seja um tempo para renovar o nosso caminho espiritual com Jesus, na alegria de o procurar e de o encontrar incessantemente. De fato, a alegria mais verdadeira está na relação com Ele encontrado, seguido, conhecido, amado, graças a uma contínua tensão da mente e do coração. Ser discípulo de Cristo: isto é suficiente para o cristão. A amizade com o Mestre garante à alma paz profunda e serenidade também nos momentos obscuros e nas provas mais difíceis. Quando a fé se confronta com noites escuras, nas quais já não se “sente” nem se “vê” a Presença de Deus, a amizade com Jesus garante que na realidade nada nos pode separar do seu Amor (cf. Rm 8, 39). Procurar e encontrar Cristo, fonte inexaurível de verdade e de vida: a Palavra de Deus convida-nos a retomar, neste início de ano novo, o caminho da fé que nunca se conclui. “Mestre, onde moras?”, dizemos também nós a Jesus e ele responde-nos: “Vinde e vereis”.

(Bento XVI)


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S. Título, 2014, Juazeiro, Bahia, Guy Veloso (1969-), da série “Penitentes...”, Belém do Pará, Brasil.



segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

O Caminho da Beleza 07 - Epifania do Senhor

A palavra de Deus é viva e eficaz e mais cortante que espada de dois gumes (Hb 4, 12).


Epifania do Senhor                    07.01.2018
Is 60, 1-6                 Ef 3, 2-3.5-6                       Mt 2, 1-12


ESCUTAR

Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor (Is 60, 1).

Os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo por meio do evangelho (Ef 3, 6).

“Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo” (Mt 2, 2).


MEDITAR

Caminante, son tus huellas,
el camino y nada más;
Caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace el camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante no hay camino
sino estelas en la mar.

(Antonio Machado)


ORAR

            A história do Natal foi, apesar do canto de louvor celeste, uma manifestação discreta de Deus, limitada a uns poucos. Valia não apenas para Israel, mas sim para todo o mundo; e isto é precisamente o que se celebra na festa de hoje: a epifania de Deus está concebida para o mundo em sua totalidade, também para os povos pagãos que, embora não tenham recebido nenhum anúncio profético prévio como os judeus, são agora os primeiros a vir a render-lhe homenagem. O evangelho descreve a chegada dos astrólogos pagãos que tinham visto sair a estrela da salvação e a haviam seguido. Deus lhes dirigiu uma palavra mediante uma estrela incomum em meio às suas constelações habituais; e esta palavra os assustou e lhes aguçou os ouvidos, enquanto que Israel, acostumado à palavra de Deus, fechou seus ouvidos às palavras da revelação: não quer que nada altere o curso habitual de suas dinastias (o mesmo se sucede na Igreja, quando se sente molestada pela mensagem inesperada de um santo). A pergunta ingênua dos estrangeiros, “Onde está o Rei que nasceu?”, provoca mágoa e, inclusive, susto. A consequência será, no caso de Herodes, um plano criminal secreto e astuciosamente urdido; mas os Magos, guiados pela estrela, conseguem sua meta: rendem homenagem ao Menino e, conduzidos pela providência divina, evitam a Herodes, voltando a sua terra por outro caminho. O acontecimento é claramente simbólico: anuncia e prepara a eleição dos pagãos; mais de uma vez, Jesus encontrará neles uma fé maior do que em Israel. À miúde, são os conversos (raramente desejados) os que abrem caminhos novos e fecundos para a Igreja (cf. At 9, 26-30).

(Hans Urs Von Balthasar, 1905-1988)


CONTEMPLAR


S. Título, s.d., da série “O Congado”, Jorge Quintão, Minas Gerais, Brasil.